Alemanha combate calor e poluição com bebedouros públicos
Helen Whittle
14 de agosto de 2022
País usa por hora 2 milhões de garrafas plásticas, ou 17,4 bilhões por ano – um absurdo ambiental. Também diante dos verões cada vez mais quentes, Berlim quer tornar obrigatório o acesso grátis à água potável.
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O subdistrito berlinense Gesundbrunnen – cujo nome, aliás, significa "Poço da Saúde" – fica no norte do bairro de Mitte. Sua marca registrada é um imponente mall, ao lado de uma estação para onde confluem diversas linhas de metrô e trens metropolitanos. Num bebedouro público do lado de fora do centro comercial, transeuntes param para encher garrafas de plástico, refrescar o rosto e molhar lenços no escaldante calor da tarde.
Em 10 de agosto, o gabinete federal alemão expediu um projeto de lei pela instalação de mais bebedouros nas cidades e municipalidades. Se a legislação for aprovada no Bundestag (câmara baixa do parlamento), as autoridades locais ficarão obrigadas a prover acesso grátis à água potável nos espaços públicos.
A medida é proposta no âmbito do princípio da Daseinsvorsorge, a responsabilidade declarada dos governos da Alemanha de fornecerem os bens e serviços indispensáveis à existência (Dasein) humana, na forma de infraestrutura pública.
"Se as municipalidades agirem agora, estaremos fazendo uma importante contribuição à saúde e, acima de tudo, à proteção dos cidadãos contra o calor", explicou a ministra do Meio Ambiente, Steffi Lemke. "Os verões recentes, secos e quentes, nos mostraram que ondas de calor persistentes não são mais uma raridade na Alemanha."
1.300 bebedouros na Alemanha: ideal seriam 83 mil
O esboço estipula a instalação de bebedouros públicos onde seja tecnicamente vável e apropriado. Julian Fischer, do grupo ambientalista não governamental A Tip: Tap, saúda a iniciativa com entusiasmo: "Temos água encanada de excelente qualidade na Alemanha, e é uma pena que se compre tanta água engarrafada e se jogue fora os frascos, criando um monte de lixo."
A origem do nome da organização, o qual define seu escopo central, fica claro em sua página no Facebook: "Do you want to know our tip? Drink tap [water]" (Quer saber a nossa dica? Beba água da torneira).
A origem do nome da organização, o qual define seu escopo central, fica claro em sua página no Facebook: "Do you want to know our tip? Drink tap [water]" (Quer saber a nossa dica? Beba água da torneira).
A ONG ambientalista Deutsche Umwelthilfe estima que na Alemanha a cada hora são usados cerca de 2 milhões de garrafas de plástico: mais de 47 milhões por dia ou 17,4 bilhões por ano. As campanhas da A Tip: Tap visam reduzir esse desperdício: com sua the Refill Initiative, por exemplo, o público em geral tem acesso a água da torneira grátis nas lojas, cafés e farmácias participantes.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, há atualmente 1.300 bebedouros na Alemanha, e o plano do governo é instalar cerca de mil outros, com localização ainda não especificada. Segundo Fischer, contudo, a cifra está bem longe do ideal de pelo menos um bebedouro para cada mil habitantes, ou cerca de 83 mil em todo o país.
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Berlim na dianteira
"Seria ótimo todo mundo ter melhor acesso a água encanada limpa, mas especialmente quem tem menos dinheiro, por exemplo, famílias que vão a um playground e têm que encher suas garrafas d'água. Deveria ser parte da infraestrutura cívica sempre ter bebedouros por perto", propõe Fischer. "Berlim, na verdade, é um bom exemplo na Alemanha, pois temos um número relativamente alto de bebedouros pela cidade."
Em 2018, sob a coalizão governamental formada pelos partidos Verde, Social-Democrata (SPD) e o socialista A Esquerda, a cidade se afiliou ao movimento internacional Blue Community. Originalmente fundado no Canadá e agora de âmbito global, ele combate a privatização da água, promovendo o acesso hídrico como um direito humano fundamental.
Berlim conta atualmente 201 bebedouros, estando prevista para os próximos dias a inauguração de outros dois: um no Mauerpark, um parque público extremamente frequentado, e o outro no lago público Schlachtensee, no sudoeste da capital.
"Em Berlim, nós estamos na dianteira", exalta Stephan Natz, porta-voz da the Berliner Wasserbetriebe, a maior operadora de água do país, abastecendo uma população de 3,8 milhões. Ela é responsável por instalar e manter os bebedouros, em funcionamento de abril a outubro. A qualidade da água é testada em laboratório uma vez por mês.
"Acesso a água potável o mais fácil possível para todos"
Além de saciar a sede de seres humanos, cães, pássaros e abelhas, a Wasserbetriebe está procurando meios de desviar as águas não usadas dos bebedouros, que flui pelos ralos e bueiros, para irrigar parques e outras áreas verdes.
"Deveria haver mais conscientização sobre o valor da água, temos muito pouca água em Berlim, e cada vez menos", comenta Jochen Rabe, diretor geral da associação sem fins lucrativos Kompetenzzentrum Wasser Berlin, que promove ciência, pesquisa e desenvolvimento no campo da gestão hídrica urbana.
Embora a finalidade central dos bebedouros seja evitar o uso de frascos plásticos, eles são também uma questão de saúde pública na Alemanha, com seus centros urbanos cada vez mais quentes e uma população cada vez mais idosa. Rabe frisa que não há suficientes bebedouros.
"No planejamento urbano, fala-se de 'cidade dos 15 minutos': quando há uma onda de calor realmente forte, deveria haver um bebedouro, ou pelo menos acesso grátis à água, a dez minutos de distância, no máximo. Quem é mais idoso e vulnerável pode desidratar-se bem rapidamente."
Outro problema é a falta de acessibilidade para usuários de cadeiras de rodas: dos 201 bebedouros de Berlim, apenas as mais novas, as "Fontes Bituma", de concreto, são acessíveis a esse público. Há 26 delas em funcionamento, e outras 50 estão encomendadas.
Como afirmou a ministra Steffi Lemke ao anunciar a aprovação do novo projeto de lei pelo gabinete, "o acesso à água potável deve ser o mais fácil possível para todo mundo na Alemanha".
O poder de destruição da natureza
Água, vento, fogo ou gelo: grandes desastres naturais causam mortes por todo mundo, afetando a vida de milhões de pessoas. Confira algumas das catástrofes naturais registradas no último século.
Foto: Getty Images/AFP/J. Barret
Enchente na China em 1931 pode ter matado até 4 milhões de pessoas
Em 1931, a cheia dos rios Amarelo, Pérolas, Yangtzé e Huai devastou parte da China. A enchente, que durou de julho a novembro, inundou mais de 88 mil km² e deixou outros 21 mil km² parcialmente inundados. Não há registro exato do número de mortos, mas estima-se que de 1 milhão a 4 milhões de pessoas morreram em decorrência da tragédia e de seus efeitos secundários, como a fome.
Foto: picture-alliance/AP Images
Por falta de aviso à população, ciclone mata pelo menos 300 mil em Bangladesh
Em novembro de 1970, o Paquistão Oriental (atual Bangladesh) esteve no caminho do ciclone Bhola. Meteorologistas disseram ter previsto a tempestade, mas que não havia meios de comunicar o risco à população. Como resultado, ao menos 300 mil pessoas morreram – algumas estimativas chegam a meio milhão de mortes. Em 1991, Bangladesh foi atingido por outro ciclone, que deixou cerca de 138 mil mortos.
Foto: Getty Images
Terremoto acaba com cidade na China
A cidade industrial de Tangshan, na China, foi arrasada por um terremoto de magnitude 7,6 em 28 de julho de 1976. Em minutos, a cidade praticamente deixou de existir, com o colapso da maioria dos prédios. O abalo sísmico matou 242 mil pessoas, segundo o governo chinês – o recorde entre os terremotos ocorridos no século 20.
Foto: Imago/Xinhua
Erupção riscou cidade colombiana do mapa
O vulcão Nevado del Ruiz, na Cordilheira dos Andes, riscou do mapa a cidade de Armero, em 13 de novembro de 1985, na Colômbia. Uma erupção provocou um degelo, formando uma avalanche de lama e cinza vulcânica que atingiu um raio de 100 km, matando mais de 23 mil pessoas, entre elas, Omayra Sánchez, de 12 anos, que agonizou por 60 horas em frente às lentes do mundo todo sem possibilidade de resgate.
Foto: AP
Diretor de cinema e equipe soterrados por avalanche
Uma avalanche acima do povoado de Nizhny Karmadon, na Rússia, deixou 127 mortos em 20 de setembro de 2002 – entre eles o ator e diretor russo Serguei Bodrov Jr. e a equipe de 24 pessoas que filmavam no local no momento do desastre. Acredita-se que a tragédia tenha sido causada por um pedaço de uma geleira que se soltou das montanhas do Cáucaso e rolou em direção ao vilarejo.
Foto: AP
Mais de 230 mil mortes um dia depois do Natal
Em 26 de dezembro de 2004, um maremoto no Oceano Índico com intensidade 9.1 na escala Richter causou ondas de até 30 metros de altura, que devastaram regiões de 13 países, deixando quase dois milhões de desabrigados e ao menos 230 mil mortos. Somente na província indonésia de Acé morreram 170 mil pessoas.
Foto: Pornchai Kittiwongsakul/AFP/Getty Images
Furacão rompe barragens e deixa cidade debaixo da água nos EUA
Um dos furacões mais conhecidos da história dos Estados Unidos teve efeitos devastadores em Nova Orleans, na Luisiana. Ocorrido em 2005, o Katrina matou cerca de 1.800 pessoas, fez com que 250 mil perdessem suas casas e provocou danos estimados em cerca de 108 bilhões de dólares. Barragens se romperam, deixando 80% da cidade debaixo da água e arrancando até mesmo caixões das sepulturas.
Foto: AP
Ciclone devasta Myanmar e deixa pelo menos 140 mil mortos
O ciclone Nargis afetou, entre outros países, Índia, Sri Lanka, Laos, Bangladesh e, principalmente, Myanmar com sua fúria de categoria 4, em 2 de maio de 2008. Estatísticas apontam que 140 mil pessoas morreram, mas o número real pode ser próximo de um milhão de vítimas.
Foto: IFRC/dpa/picture alliance
Um terço da população afetada por terremoto no Haiti
Não bastasse ser o país mais pobre da América, em 12 de janeiro de 2010 um terremoto de magnitude 7 na escala Richter destruiu a capital do Haiti, Porto Príncipe, deixando cerca de 220 mil mortos e 1 milhão de desabrigados. Entre as vítimas estava a fundadora da Pastoral da Criança, Zilda Arns. Estima-se que 3 milhões de pessoas, quase um terço da população, tenham sido afetadas.
Foto: C. Somodevilla/Getty Images
Enxurrada e deslizamentos matam mais de 900 no Rio de Janeiro
O Brasil não costuma ser assolado por desastres naturais como terremotos e tsunamis. Porém, entre 11 e 12 de janeiro de 2011, uma sequência de chuvas fortes atingiu a região serrana do Rio de Janeiro, causando uma grande enxurrada e vários deslizamentos de terra, com soterramento de casas. O desastre provocou mais de 900 mortes em sete cidades e afetou mais de 300 mil pessoas.
Foto: AP
Tsunami provoca derretimento de reatores e acidente nuclear no Japão
Em 11 de março de 2011, um terremoto de magnitude 9 seguido de um tsunami causou danos devastadores no Japão. A catástrofe matou pelo menos 16 mil pessoas. Na usina nuclear de Fukushima, os núcleos de três dos seis reatores derreteram, causando o pior acidente atômico desde Chernobyl, em 1986. O tsunami fez com que quase 300 espécies marinhas viajassem através do Pacífico até o litoral dos EUA.
Foto: AP
Dezenas de mortos cercados pelo fogo em estrada de Portugal
Uma onda de calor causou vários incêndios em Portugal em junho de 2017. Ao menos 61 pessoas morreram e dezenas ficaram feridas em um deles, que atingiu a vila de Pedrógão Grande. Corpos de 30 pessoas foram encontrados dentro de veículos, em uma estrada que foi cercada pelo fogo. Mais de 800 bombeiros trabalharam para extinguir as chamas, com a ajuda de cinco aviões.
Foto: Reuters/R. Marchante
Onda de calor deixa 70 mil mortos na Europa
Embora os brasileiros estejam acostumas e preparados para temperaturas que frequentemente chegam a 40°C, a Europa não costumava, até alguns anos, enfrentar esse tipo de problema. Mas uma onda de calor atingiu o continente no verão de 2003, provocando a morte de cerca de 70 mil pessoas – na Alemanha foram 7 mil mortes. Na foto acima, o rio Reno em Düsseldorf.