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Alemanha deporta cúmplice do 11 de Setembro

Naomi Conrad md | Nina Werkhäuser
15 de outubro de 2018

Atentados foram realizados por um grupo de homens que se conheceram em Hamburgo. Mounir El Motassadeq, o único condenado pelos ataques, é agora deportado para o Marrocos. Ele sempre alegou inocência.

Mounir El Motassadeq em 2003, durante processo em Hamburgo
Mounir El Motassadeq em 2003, durante processo em HamburgoFoto: picture-alliance/dpa/C. Stache

Foi em Hamburgo que um grupo de homens em torno do terrorista egípcio Mohammed Atta colocou em prática o plano terrorista da Al Qaeda que resultou nos atentados de 11 de setembro de 2001.

Um desses homens era Mounir El Motassadeq. Ele foi preso dois meses depois que os aviões atingiram as torres gêmeas do World Trade Center, sendo o primeiro a ser indiciado em conexão com os ataques. Nesta segunda-feira (15/10), Motassadeq foi retirado da cela onde estava preso para ser deportado para o Marrocos, a partir do aeroporto de Hamburgo.

Foram necessários mais de cinco anos de julgamentos e apelos para a Alemanha condená-lo a 15 anos por cumplicidade no assassinato de 246 pessoas a bordo dos aviões do 11 de Setembro.

Ele fez transferências bancárias para membros da célula terrorista de Hamburgo e ajudou a encobrir o paradeiro deles. E também assinou o testamento de Atta.

Motassadeq nunca negou ter sido amigo dos sequestradores. Mas ele diz que nunca soube dos planos do 11 de Setembro – e que nunca esteve envolvido neles. Ele afirma que seu apoio a Atta e à célula terrorista não passou de favores que fazia a amigos.

Um de seus ex-advogados disse à DW que o caso continua a perturbá-lo, não só pelo fato de mais de três mil pessoas terem morrido, mas também porque ele continua convencido de que Motassadeq é inocente.

Vida universitária

Era o início dos anos 90 quando Motassadeq, nascido em 1974, se mudou do Marrocos para a Alemanha e acabou estudando engenharia elétrica na Universidade de Hamburgo. Lá, ele fez amizade com um grupo de estudantes muçulmanos que se uniram em torno de Atta.

Pessoas que conheciam Motassadeq disseram à DW que ele era "um bom rapaz", "simpático", "educado" e "reservado". Ainda cumprindo sua sentença na prisão de alta segurança de Fuhlsbüttel, em Hamburgo, ele não respondeu aos pedidos de DW para uma entrevista.

O autor irlandês Anthony Summers entrevistou Motassadeq para o livro que escreveu juntamente com Robbyn Swan The Eleventh Day. The Full Story of 9/11 and Osama Bin Laden (O Décimo Primeiro Dia. A História Completa do 11 de Setembro e Osama Bin Laden, em tradução livre) que foi finalista do Prêmio Pulitzer de 2012.

Summers deu à DW acesso a uma entrevista inédita concedida por Motassadeq na prisão em 2009. Na transcrição, Motassadeq brinca com Summers e seu tradutor, dizendo que foi o "destino" que fez com que ele tivesse vindo à Alemanha para estudar, rindo de sua primeira impressão de que o país fosse fria – já que ele havia chegado no inverno.

Várias fontes sugerem que Motassadeq era "devoto" e até "profundamente religioso" quando se mudou para a Alemanha. Mas ele disse a Summers que não se considera "particularmente rígido". No entanto, sem a sua fé, ele diz, "alguém como eu teria se matado".

Restos do World Trade Center após o desabamento das torres gêmeas em 11 de setembro de 2001Foto: Imago/United Archives International

Ele não nega que tenha passado algum tempo em um campo de treinamento militar no Afeganistão em maio de 2000. "Eu sou muçulmano e também acredito que um homem tem que prestar serviço militar. Como o serviço militar que todo mundo tem que cumprir aqui", disse ele, se referindo ao serviço militar alemão, que ainda era obrigatório na época.

Motassadeq explicou que pessoas irem para um campo de treinamento jihadista não é contra a lei e que ele não é o único que foi.

"Choque"

Mas ele se diz convencido de que não teve nada a ver com o 11 de Setembro. "Eu nem sabia que eles tinham ido para os EUA", disse, referindo-se a Atta e aos outros sequestradores de Hamburgo. "Primeiro eu não pude acreditar. Foi um choque, como isso pôde acontecer? Simplesmente não era possível", afirmou sobre o que sentiu no momento em que soube dos ataques.

Ele disse que foi um choque ainda maior ver seus amigos na televisão. Embora tenha enfatizado que não pode haver justificativa para matar pessoas inocentes, ele afirmou não ter certeza se seus amigos eram realmente responsáveis ​​pelo que fizeram.

"Eu não consigo entender isso. Não sei se eles realmente, conscientemente, fizeram isso por convicção, ou se alguém estava por trás deles. Esta é uma pergunta que precisa ser respondida."

Ele disse que sua experiência o fez duvidar de tudo, mesmo se Atta e os outros o fizeram. "Porque eu sei o que aconteceu comigo. Os juízes e promotores mudaram tudo, eu sei, eu vi, eu experimentei, eu ainda estou experimentando isso. Eu sei como eles podem transformar a verdade em inverdade e usar truques para trazer um homem inocente à prisão."

Quase dez anos depois daquela entrevista na prisão, parece que ele não se arrepende. Um pedido de liberdade antecipada, apresentado por seus advogados em 2014, foi negado. O tribunal justificou dizendo que ele ainda é "perigoso demais" e que ele não se distanciou publicamente dos ataques.

"Ele não mudou, ainda é o mesmo", disse à DW o criminalista Daniel Zerbin. Ele tem contatos com agências de segurança locais e realizou um dos mais detalhados estudos acadêmicos sobre a célula terrorista de Hamburgo.

Mas agora, com a sentença quase concluída, as autoridades alemãs decidiram libertar Motassadeq – algumas semanas antes – e deportá-lo para o Marrocos. Eles proibiram-no de retornar à Alemanha até abril de 2064, quando ele terá 90 anos de idade.

"Esta medida nos permitirá prendê-lo imediatamente, caso ele pise novamente em solo alemão", afirmou Frauke Köhler, porta-voz do Ministério Público Federal alemão, em entrevista à DW.

Meio de propaganda para a Al Qaeda?

Ninguém espera que o Motassadeq tente voltar à Alemanha. Acredita-se que sua esposa e seus três filhos estejam no Marrocos com o restante da família dele.

Especialistas estão divididos quanto ao perigo que ele pode representar quando for libertado. Alguns sustentam que a geração atual de jihadistas irá receber a libertação com um pouco mais que um encolher de ombros, já que ele era uma figura menor na célula de Hamburgo.

Mas alguns temem que Motassadeq possa se mostrar uma ferramenta de propaganda útil para a Al Qaeda e outros grupos radicais.

Phil Gurski, ex-analista estratégico da comunidade de inteligência canadense, afirma que Motassadeq poderia servir como "uma figura de propaganda de alto nível".

"A Al Qaeda pode apontar para ele como alguém que lutou a boa luta e, no final, por causa de sua boa fé e sua forte crença no que a Al Qaeda estava tentando realizar, ele não se curvou, ele não se rendeu às autoridades, ele não traiu as outras pessoas em seu grupo", observa o especialista.

Gurski está convencido de que as autoridades marroquinas seguirão Motassadeq de perto e provavelmente repassarão informações sobre ele aos americanos. "Eu ficaria muito surpreso se os EUA não tivessem interesse nele", afirma.

O criminalista Daniel Zerbin não descarta que o governo Trump até mesmo tente sequestrá-lo para os EUA. "Tudo é possível". No Marrocos, um dos irmãos de Motassadeq é mais otimista sobre o destino dele. "Deus o protegeu por 15 anos na prisão e continuará a protegê-lo, porque ele é inocente."

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