Alemanha entrega à Namíbia ossadas da era colonial
29 de agosto de 2018
Cerimônia em Berlim marca devolução de restos de vítimas de genocídio ocorrido na época em que país era dominado pelo Império Alemão. Ossos foram levados à Alemanha no início do século 20 para pesquisas de cunho racial.
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A Alemanha devolveu nesta quarta-feira (29/08) à Namíbia ossadas de vítimas do genocídio dos povos herero e nama que estavam guardadas há décadas, entre outros lugares, nos arquivos da Clínica Universitária Charité, em Berlim.
A devolução dos ossos humanos foi realizada após um culto pela memória das vítimas na igreja Friedrichstadtkirche, em Berlim. Os restos humanos – em maior parte, crânios – haviam sido transportados para a Alemanha no início do século 20, quando o território da atual Namíbia esteve sob domínio colonial alemão.
Foram entregues 19 crânios, assim como outros ossos e restos de pele a uma delegação do governo da Namíbia. As ossadas devem ser recebidas na sexta-feira em uma cerimônia do governo na capital do país africano, Windhuk.
"Estes crânios nos contam uma história de um passado colonial brutal e sem Deus e de sua subsequente supressão do povo da Namíbia. Eles dizem: 'Nunca mais!'”, afirmou o chefe da delegação do Conselho da Igreja da Namíbia, Ernst Gamxamub, em seu sermão.
Em 2011 e 2014, a Alemanha já devolvera ossadas humanas à Namíbia. Esta, entretanto, foi a primeira vez que a entrega foi acompanhada de uma cerimônia oficial, com participação dos governos alemão e namíbio.
O Império Alemão ocupou o território da atual Namíbia de 1884 a 1915. No então protetorado Sudoeste Africano Alemão, as tropas dos colonizadores alemães esmagaram brutalmente insurreições dos grupos étnicos dos herero e nama, matando cerca de 65 mil hereros e ao menos 10 mil namas, naquilo que os historiadores consideram o primeiro genocídio do século 20.
Os restos mortais das vítimas foram levados para a Alemanha para "pesquisa racial". Eles estiveram guardados no acervo de clínicas, museus e em propriedades privadas.
Desde 2015, o governo alemão classifica oficialmente os crimes na atual Namíbia como genocídio. Negociações sobre possíveis reparações foram iniciadas também em 2015, mas estão travadas.
Representantes de hereros e namas que não reconhecem essas conversas entraram, em janeiro deste ano, com recurso em um tribunal de Nova York para reivindicar indenizações por danos.
Berlim se recusa a pagar reparações financeiras, destacando ter destinado várias centenas de milhões de euros para o desenvolvimento da Namíbia, desde a sua independência da África do Sul, em 1990.
Atualmente, os hereros representam 7% da população da Namíbia, número distante dos 40% do início do século 20.
País da África foi colônia alemã de 1884 a 1915 e território sul-africano até 1990. Como é a Namíbia após 25 anos de independência? Trabalhadores e estudantes respondem com fotografias.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Marama Kavita
Câmeras descartáveis para todos
Num projeto experimental, em 2007 a pesquisadora de teatro Evelyn Annuss e a artista Barbara Loreck, ambas alemãs, distribuíram câmeras fotográficas descartáveis a centenas de namibianos, com o convite: "Fotografem-se! Como é seu país depois da época colonial alemã, da ocupação e da libertação?" Esta foto é de Paulus Jacobs, da cidade portuária de Lüderitz.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Paulus Jacobs
Mudança de planos
"Nossa intenção, na verdade, era que eles encenassem para a câmera o que consideram 'germanness', ou 'alemãozice'", conta Evelyn Annuss. "Mas o resultado foi totalmente diferente: as pessoas não se interessaram tanto pela história colonial, e sim por encenar o próprio dia a dia diante da câmera." Clemensia Haragaes fotografou o bairro de Katutura, na capital Windhoek.
Como num jogo de telefone sem fio, as câmeras circularam pela Namíbia. O resultado foram mais de 5 mil imagens. Os namibianos mostraram não dar muito valor aos direitos autorais. "Tentamos descobrir quem havia feito quais fotos, mas muitas vezes não foi possível, porque as pessoas não tiveram interesse em se identificar." Para Evelyn Annuss, um projeto artístico no melhor sentido do termo.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Memory Biwa
De Windhoek à Suíça
As fotografias foram expostas pela primeira vez na National Art Gallery de Windhoek, em 2009. Por ocasião dos 25 anos da independência da Namíbia, em 21 de março de 2015, o centro de documentação Basler Afrika Bibliographien e a embaixada namibiana na Suíça voltam a exibi-las na Basileia e em Genebra. Entre elas, esta imagem feita por Memory Biwa.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Memory Biwa
Vida simples em local nobre
Emolduradas e expostas na galeria nacional de arte, as imagens cotidianas ganharam expressão fortemente artística. "Foi extremamente importante para as pessoas conquistar esse local, pois a maioria dos fotógrafos vem de antigas 'townships' ou bairros pobres." Esta foto foi tirada por Marama Kavita.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Marama Kavita
Teatro do cotidiano
Muitos trabalhos evocam instantâneos teatrais ou cenas de filme. "As pessoas se fantasiaram e se encenaram de uma certa maneira", conta a pesquisadora Annuss. Suas fotos diferem muito dos supostamente autênticos motivos de cartão postal ou dos registros de miséria apelativamente compostos, que marcam a imagem da Namíbia na Alemanha. Aqui, Anke Langmaak apresenta o Carnaval em Windhoek.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Anke Langmaak
Multiplicidade namibiana
Um grupo de mulheres da etnia herero se posiciona diante de iglus. Uma jovem fantasiada de turista posa diante da imagem de um veado que ruge. Crianças de olhos azuis festejam o carnaval em Windhoek: cenas cotidianas de pontos de vista sempre novos. Marama Kavita retrata aqui o Dia dos Herreros em Okahandja.
Foto: baslerafrika.ch/Evelyn Annuss/Marama Kavita
"Olha só como tu me vês!"
As autoras do projeto não escondem sua surpresa, pois os fotógrafos contrariaram todas as suas expectativas e projeções sobre a vida na Namíbia, como que dizendo: "Vou te mostrar como tu me vês!" Esta visão é de Cesilie Benjamin. A exposição "Stagings made in Namibia" pode ser também visitada através de um catálogo publicado pela editora B_Books.