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Centenário

8 de janeiro de 2008

Por ocasião dos cem anos do nascimento de Simone de Beauvoir, a mídia alemã lembra a filósofa francesa como precursora do movimento feminista e ícone do existencialismo ("hoje empoeirado") do último século.

'Minha obra é minha vida', afirmava Simone de BeauvoirFoto: dpa

Ainda num tempo em que vida e obra mantinham uma certa coerência e o mercado não pairava como instância máxima sobre a literatura, Simone Lucie Ernestine Marie Betrand de Beauvoir se afirmou como uma das principais intelectuais francesas no último século.

Nascida no bairro parisiense Montparnasse, no dia 9 de janeiro de 1908, filha de um advogado e de uma bibliotecária, terminou seus estudos de Filosofia, Literatura e Matemática na capital francesa no ano de 1929. A seguir, trabalhou como professora em Marselha, Rouen e Paris, tendo se tornado uma das primeiras mulheres a lecionar Filosofia da França.

Hoje, cem anos depois de seu nascimento e transcorridas mais de duas décadas após sua morte, em 1986, a herança deixada por Simone de Beauvoir é considerada mais atual que o legado de Jean-Paul Sartre, com quem a filósofa dividiu, de certa forma, vida e obra.

Vocabulário empoeirado

Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, no aeroporto de ParisFoto: dpa - Bildfunk

Uma das preocupações de seus biógrafos é ressaltar a pertinência da obra de Beauvoir, mesmo num momento em que o "vocabulário existencialista se tornou charmosamente empoeirado", descreve o diário alemão Die Welt.

A atualidade do pensamento de Beauvoir é detectada em sua perspicácia para desmascarar relações de poder (não apenas entre os gêneros) e estratégias de marginalização. Muito provavelmente nem A Dominação Masculina, de Pierre Bordieu, nem a discussão sobre gêneros da norte-americana Judith Butler existiriam sem o caminho trilhado anteriormente por Simone de Beauvoir.

Segundo ou outro?

Seu O Segundo Sexo (cuja tradução do original Le Deuxième Sexe para o alemão eliminou a hierarquia implícita no título, transformando o livro em O Outro Sexo), lançado em 1949, foi a pedra fundamental para os movimentos feministas que só viriam a eclodir décadas mais tarde. Ou seja, as reflexões da filósofa acerca do papel da mulher na sociedade viriam antes do advento da pílula anticoncepcional, da legalização do aborto e dos áureos tempos das revoltas de 1968.

Apesar ou exatamente por causa de suas posições iconoclastas para a época, foram vendidos mais de 20 mil exemplares do livro na primeira semana após sua publicação, envolvida em escândalos vários, entre estes a inclusão do volume na lista de livros proibidos pelo Vaticano.

Afirmações ambivalentes

Simone de Beauvoir em março de 1983, três anos antes de sua morteFoto: AP

"Até hoje a recepção da obra de Beauvoir permanece um paradoxo. O que se deve, em parte, à ambivalência de suas afirmações. Se por um lado ela aponta a estrutura de uma sociedade patriarcal, que marginaliza e discrimina as mulheres, por outro lado ela desmascara a participação das mulheres em sua condição de inferioridade", comenta o diário berlinense Der Tagesspiegel.

Em uma de suas frases célebres, a filósofa afirma que "não nascemos mulheres, mas nos tornamos mulheres", salientando o peso da socialização e da herança cultural na definição do papel secundário designado às mulheres na sociedade, bem como a passividade das mesmas em aceitar o que lhes é imposto.

Contraponto ao neoconservadorismo

No entanto, nas comemorações dos cem anos de seu nascimento, são relembrados, além de O Segundo Sexo, também seu romances de teor autobiográfico, seus ensaios, memórias, relatos de viagem, diários e cartas.

Na Alemanha, foi lançada a biografia Sein wie keine andere. Simone de Beauvoir – Schriftstellerin und Philosophin (Ser como nenhuma outra. Simone de Beauvoir ­– Escritora e Filósofa), de Ingeoborg Gleichauf, além de Simone de Beauvoir und das andere Geschlecht (Simone de Beauvoir e o outro sexo), de Hans-Martin Schöhnherr-Mann. No livro, o autor procura rediscutir as teses da filósofa francesa, ao contrapor suas teorias às de autores contemporâneos conservadores, que saem em defesa de valores tradicionais.

Acima de tudo, Simone de Beauvoir contribuiu para que "literatura, filosofia e política, até então registros distintos, passassem, indubitavelmente impulsionados pela fenomenologia, a formar um aliança, ", resume o diário suíço Neue Zürcher Zeitung. Aliança que até pode parecer embolorada, mas que, por sorte, morta certamente não está. (sv)

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