Alemanha quer dificultar vinda de parentes de refugiados
Helen Whittle
20 de maio de 2025
Novo governo alemão pretende impedir que refugiados com status de proteção subsidiária tragam familiares para o país. Medida polêmica que atinge regras de reunião familiar deve afetar especialmente famílias sírias.
Pavilhão em abrigo de imigrantes: cerca de 351.400 pessoas com status de proteção subsidiária vivem na Alemanha, a maioria da SíriaFoto: Peter Juelich/epd/picture alliance
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"Antes de vir para a Alemanha, eu não sabia que seria tão difícil. Eu simplesmente não sabia. Sabe como é, somos homens e não estamos acostumados a criar filhos", disse Mohammed. Ele fugiu da guerra civil na Síria em 2014 com sua esposa, duas filhas e dois filhos para o Curdistão iraquiano.
A vida era tão difícil para a família no lugar que sua esposa, duas filhas e um filho voltaram para a Síria. Mohammed – que não quis revelar seu sobrenome verdadeiro – tomou a decisão de fazer a perigosa jornada até a Alemanha, passando pela Líbia e atravessando o Mediterrâneo até a Itália, junto com seu filho de 9 anos, que sofre de atrofia cerebral, na esperança de receber tratamento médico e um dia se reunir com o restante da família na Alemanha.
Mas, dois anos e meio depois de chegar ao país, Mohammed ainda vive sozinho com seu filho portador de deficiência e não tem ideia de quando, ou se, sua esposa e duas filhas poderão se juntar a ele. Seu segundo filho morreu após retornar à Síria, uma perda que se tornou ainda mais dolorosa devido à separação.
Depois de ele ter ficado hospedado em acomodações compartilhadas nos centros de refugiados, um amigo acabou oferecendo a Mohammed um lugar no que ele descreve como uma casa em ruínas. Ele diz que eles lutam para sobreviver com o dinheiro que recebe do governo.
Mohammed recebeu o status de "proteção subsidiária" das autoridades alemãs. A classificação é para aqueles que não atendem aos critérios específicos para obter o status de "refugiado" de acordo com a Convenção de Genebra, mas que enfrentam risco de danos graves em seu país de origem, incluindo pena de morte, tortura, tratamento desumano ou degradante ou violência indiscriminada no contexto de um conflito armado.
Atualmente, há cerca de 351.400 indivíduos com status de proteção subsidiária vivendo na Alemanha, a maioria da Síria. Eles recebem uma autorização de residência, que inicialmente era de um ano, mas em 2024 esse período inicial foi estendido para três anos. Têm permissão para viver e trabalhar na Alemanha e receber benefícios sociais.
Mas, segundo a legislação da UE, enquanto os solicitantes de refúgio e os refugiados reconhecidos têm o direito à reunificação com cônjuges e filhos menores de 18 anos, isso não vale para aqueles com status de proteção subsidiária. Compete a cada país do bloco decidir sobre esses casos. Desde agosto de 2018, a regra aplicada na Alemanha prevê a emissão de um máximo de mil vistos por mês para parentes de beneficiários de proteção subsidiária.
Agora, o novo governo de coalizão dos conservadores da União Democrata Cristã (CDU) e o Partido Social-Democrata (SPD) planejam suspender a reunificação familiar para aqueles com status de proteção subsidiária pelos próximos dois anos, pelo menos.
O ministro alemão do Interior, Alexander Dobrindt, disse ao Parlamento alemão na sexta-feira que os cidadãos "esperam uma mudança de política" em relação à imigração e que isso inclui o fim da reunificação familiar em determinados casos. "A capacidade de integração do país simplesmente atingiu um ponto de ruptura", afirmou Dobrindt, acrescentando que as cidades e municípios de todo o país atingiram o limite.
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Proteção subsidiária no centro do debate
A questão da reunificação familiar para pessoas com status de proteção subsidiária tem sido objeto de grande debate político na Alemanha. Em 2015, o governo liderado pela então chanceler federal Angela Merkel concedeu aos cônjuges, filhos ou pais de beneficiários de proteção subsidiária o direito à reunificação. Mas esse direito foi suspenso em 2016 após apenas um ano.
Desde 2018, as famílias de pessoas que receberam proteção subsidiária podem se reunir. No entanto, o governo alemão limita o número de vistos emitidos a um máximo de mil por mês. Isso causou muita incerteza para gente como Mohammed e sua família na Síria, que precisam enfrentar longas listas de espera, procedimentos burocráticos demorados e um número limitado de vistos.
Ano passado, a Alemanha emitiu cerca de 120 mil vistos para fins de reunificação familiar, de acordo com dados do Ministério das Relações Exteriores. Cerca de 10%, ou aproximadamente 12 mil vistos, foram emitidos para parentes de pessoas com proteção subsidiária na Alemanha.
Alexander Dobrindt disse no Bundestag que os cidadãos alemães querem mudanças na política de imigraçãoFoto: IMAGO/Political-Moments
Famílias separadas pela burocracia
Críticos, como a ONG de direitos humanos Pro Asyl, afirmam que a separação das famílias pode causar uma enorme tensão psicológica nos afetados, o que pode ter consequências para a integração e também para a imigração irregular. Sem nenhuma rota legal para se reunir com filhos, pais ou cônjuges, algumas pessoas correm o risco de usar rotas irregulares, muitas vezes inseguras, para chegar a seus entes queridos na Alemanha.
Juristas afirmam que, mesmo que a Diretiva de Reunificação Familiar da UE não se aplique a pessoas com proteção subsidiária, por ter sido adotada antes da definição do status de proteção subsidiária, os legisladores ainda estão vinculados ao artigo 6° da Lei Fundamental da Alemanha (a Constituição alemã) – segundo o qual "o casamento e a família estão sob a proteção especial da ordem estatal" – e ao direito à vida familiar consagrado na Convenção Europeia de Direitos Humanos.
Entretanto, uma restrição importante foi introduzida pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha e aceita pela Corte Europeia de Direitos Humanos. "Se houver uma alternativa de vida familiar em outro país, especialmente no país de origem, então não há direito automático de reunificação familiar na Alemanha", ressalta Thomas Gross, especialista em direito alemão e europeu da Universidade de Osnabrück.
O Tribunal Constitucional da Alemanha terá que decidir, em última instância, se o fim da reunificação familiar para pessoas com proteção subsidiária é legalmente permitido, o que provavelmente levará anos, de acordo com Gross. Enquanto isso, famílias como a de Mohammed permanecem separadas indefinidamente por processos legais e burocráticos lentos.
"Não é uma questão de ir à embaixada e, no dia seguinte, pegar um voo para a Alemanha. É um procedimento complicado e muitas vezes demorado", diz Gross.
Um estudo recente constatou que as embaixadas alemãs levavam de seis meses a mais de dois anos para conceder vistos aos membros da família. "Às vezes, isso envolve testes de DNA, às vezes a embaixada fica longe, em outro país, o que torna praticamente impossível para muitas pessoas", lamenta Gross.
Mohammed diz que não conseguiu aprender alemão ou trabalhar porque, sem o apoio da esposa ou de outros parentes próximos, ele é efetivamente um cuidador em tempo integral do filho, que precisa de visitas regulares ao hospital. Seu visto de proteção subsidiária é válido por um ano, e a renovação está longe de ser certa depois que um tribunal estadual federal decidiu que um cidadão sírio não se qualifica para o status de proteção subsidiária por ser a Síria considerada um país seguro.
"Deveria haver ajuda do Estado para que minha família venha para cá, pois essa é uma situação humanitária excepcional", afirma Mohammed. "Quero dizer, como posso suportar isso por mais tempo?"
O mês de maio em imagens
Reveja alguns dos principais acontecimentos do mês
Foto: Francesco Sforza/REUTERS
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Foto: Jim Watson/AFP/Getty Images
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Após avisar que tomaria "ações concretas" contra a escalada das operações israelenses em Gaza, o Reino Unido interrompeu as negociações sobre um acordo de livre comércio com Israel, convocou a embaixadora do país para prestar esclarecimentos e impôs novas sanções contra colonos da Cisjordânia. Já a UE disse estar aberta a revisar um acordo de associação com Israel. (20/05)
Foto: REUTERS
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Leão 14 celebra missa inaugural de seu pontificado
O papa Leão 14 celebrou sua missa de entronização, que inaugura seu pontificado e marca oficialmente o início de seu período à frente do Vaticano e da Igreja Católica. Na homilia, o papa pediu união e amor à humanidade, e condenou o sistema econômico que explora os recursos da Terra e marginaliza os pobres (18/05)
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Áustria vence Eurovision 2025
O festival Eurovision 2025 chegou ao fim com a vitória de Johannes Pietsch, conhecido como JJ, da Áustria, que apresentou a canção "Wasted Love". O cantor de ópera foi o vencedor com um total de 436 pontos, 154 dos quais obtidos através do voto popular. (17/05)
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Surto de gripe aviária no Brasil
A confirmação do primeiro surto de gripe aviária em uma granja comercial no Brasil levou alguns países como China e Argentina a interromperem a compra de carne de frango brasileira, pressionando o mercado bilionário de exportação do produto. Governo afirma que as medidas de contenção e erradicação para debelar a doença e manter a capacidade produtiva do setor já foram tomadas. (16/05)
Foto: JUSTIN SULLIVAN/Getty Images/AFP
Israel intensifica ataques enquanto mantem bloqueio a Gaza
Defesa Civil palestina relatou mais de 100 mortes em apenas um dia em ataques israelenses à Faixa de Gaza, onde a crise humanitária e a escassez de recursos atingem níveis cada vez mais alarmantes. ONU alerta que estoques de alimentos, água potável, combustíveis e medicamentos atingiram níveis extremamente baixos. (15/05)
Foto: Hatem Khaled/REUTERS
Alemanha prende três por planejarem atos de sabotagem
O Ministério Público da Alemanha anunciou a prisão de três cidadãos ucranianos, dois deles na Alemanha e um na Suíça, por suspeita de atuarem como agentes da Rússia para realizar atos de sabotagem com explosivos no transporte de cargas alemão. (14/05)
Foto: Uli Deck/dpa/picture alliance
Morre "Pepe" Mujica, o presidente mais humilde do mundo
O ex-presidente do Uruguai José "Pepe" Mujica morreu aos 89 anos. Ele estava em estágio terminal de um câncer de esôfago e recebia cuidados paliativos. Sua morte foi informada pelo atual líder do país sul-americano, Yamandu Orsi. Líderes do mundo inteiro se despediram do ex-guerrilheiro uruguaio. (13/05)
Foto: Gerardo Vieyra/NurPhoto/IMAGO
Hamas anuncia libertação de refém israelense-americano
O braço armado do Hamas informou que libertou o soldado israelense-americano Edan Alexander, de 21 anos, que havia sido mantido como refém em Gaza desde 7 de outubro de 2023. A libertação ocorreu "após contatos com a administração dos EUA, no âmbito dos esforços dos mediadores para chegar a um cessar-fogo", disse a organização terrorista palestina em comunicado (12/05).
Foto: Ohad Zwigenberg/AP/dpa/picture alliance
Primeira bênção dominical do papa Leão 14
Em sua primeira bênção dominical na Praça de São Pedro, o papa Leão 14 pediu uma paz genuína e justa na Ucrânia e um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza. "Depois desse cenário dramático de uma terceira guerra mundial em pedaços, como tantas vezes afirmou o papa Francisco, eu me dirijo também aos grandes do mundo, repetindo o apelo sempre atual: nunca mais a guerra", afirmou o pontífice. (11/05)
Foto: Vatican Media/ZUMA Press/IMAGO
Macron, Merz, Starmer e Tusk visitam Kiev
Os líderes do Reino Unido, Keir Starmer, da França, Emmanuel Macron, da Alemanha, Friedrich Merz, e da Polônia, Donald Tusk, se encontraram com o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, em Kiev, uma demonstração conjunta de apoio à Ucrânia. A visita ocorre um dia após o presidente russo, Vladimir Putin, receber aliados no evento que marcou os 80 anos do fim da Segunda Guerra em Moscou. (10/05)
Foto: LUDOVIC MARIN/POOL/AFP/Getty Images
Leão 14 celebra sua 1ª missa como novo papa
O papa Leão 14 celebrou sua primeira missa após ter sido escolhido como o novo líder da Igreja Católica. O missionário agostiniano retornou à Capela Sistina, onde ocorreu o conclave, para celebrar a missa na presença dos cardeais. Na homilia, disse que foi eleito para que a Igreja possa ser um "farol" para iluminar as regiões do mundo onde haja falta de fé. (09/05)
Foto: VATICAN MEDIA/Handout/AFP
Cardeal americano Robert Prevost é eleito novo papa
O conclave elegeu o cardeal americano Robert Prevost, de 69 anos, como o 267º papa da Igreja Católica. Missionário agostiniano, ele é o primeiro pontífice nascido nos EUA da história. Em seu primeiro discurso aos fiéis, homenageou o papa Francisco, pediu construção de pontos e paz a todos os povos. (08/05)
Foto: Guglielmo Mangiapane/REUTERS
Começa o conclave que irá eleger o novo papa
Cardeais de todo o mundo estão reunidos no Vaticano para eleger o próximo líder da Igreja Católica.133 cardeais de 71 países estão aptos a votar no maior e mais geograficamente diverso conclave em 2 mil anos de história. Ao fim do primeiro dia, fumaça preta na chaminé da Capela Sistina indicou que não houve consenso em torno de um novo nome. (07/05)
Foto: Gregorio Borgia/AP/picture alliance
Merz toma posse após tropeço histórico no Bundestag
O Bundestag (Parlamento) elegeu oficialmente, em segunda votação, o conservador Friedrich Merz, da União Democrata Cristã (CDU), como o novo chanceler federal do país Ele é o terceiro membro da CDU a chefiar o governo alemão desde a reunificação do país, em 1990. O conservador conseguiu o feito inédito de não conseguir se eleger na primeira rodada de votação (06/05).
Foto: Lisi Niesner/REUTERS
Israel se prepara para ampliar ofensiva militar em Gaza
O gabinete de segurança de Israel aprovou um plano para expandir as operações militares em Gaza, incluindo a "conquista" do território palestino e a pressão para que residentes se desloquem para o sul. No domingo, militares israelenses já haviam iniciado uma convocação em massa de reservistas para ampliar a ofensiva contra o Hamas na Faixa de Gaza. (05/05)
Foto: Omar Ashtawy/ZUMAPRESS.com/picture alliance
Míssil disparado do Iêmen cai perto do aeroporto de Tel Aviv
O Aeroporto Internacional de Ben Gurion, na região de Tel Aviv, foi alvo de um ataque de míssil. Os rebeldes Houthis, do Iêmen, grupo aliado do Hamas, reivindicaram a autoria do ataque, que causou interrupção no tráfego aéreo. O exército israelense reconheceu que não conseguiu interceptar o míssil. (04/05)
Foto: Ohad Zwingenberg/AP/dpa/picture alliance
Austrália: esquerda reelege premiê em meio a onda anti-Trump
O primeiro-ministro da Austrália, o trabalhista Anthony Albanese, proclamou a vitória de seu partido nas eleições gerais. Ele se tornou, assim, o primeiro chefe de governo a conquistar um segundo mandato consecutivo de três anos em 21 anos. "Os australianos escolheram enfrentar os desafios globais do jeito australiano, cuidando uns dos outros e construindo o futuro", disse Albanese. (03/05)
Foto: Rick Rycroft/AP Photo/picture alliance
Inteligência alemã classifica AfD como extremista de direita
A inteligência interna da Alemanha classificou sigla de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) como uma "organização comprovadamente extremista de direita" que ameaça a democracia e viola a dignidade humana ao tentar excluir grupos populacionais, como os imigrantes. A medida permite às agências de segurança monitorarem de forma mais incisiva o partido. (02/05)
Foto: dts Nachrichtenagentur/IMAGO
Trabalhadores ao redor do mundo protestam no 1º de Maio
Redução de jornada, garantia de direitos e melhoria do ambiente de trabalho foram algumas das reivindicações de manifestações em todo o mundo no Dia do Trabalhador, como nesta em Daca, capital de Bangladesh. A data remonta ao início de uma greve em Detroit ocorrida em 1886, que resultou na prisão e morte de trabalhadores. (01/05)