Alemanha quer proibir cirurgias plásticas em crianças e adolescentes
17 de janeiro de 2014Jakob tem 15 anos e quer se submeter a uma cirugia plástica no nariz. Acompanhado da mãe, do irmão e de uma assistente social, ele busca ajuda numa clínica particular de Bonn, no leste da Alemanha.
"Eu acho que meu nariz é muito grande. Estive num hospital no ano passado, mas os médicos não quiseram me operar porque eu era novo demais", explica. "Eu ainda não sou maior de idade, mas sofro com esse meu nariz. Por isso, tenho certeza que aqui eles vão me ajudar."
O desejo de Jakob se encaixa num debate em curso na Alemanha. O nariz dele funciona perfeitamente, ou seja, uma intervenção cirúrgica não é necessária. Mas ele sofre psicologicamente, não se sente bem e se incomoda muito com a sua aparência.
Em casos assim, o cirurgião plástico deve analisar com cuidado se faz ou não o tão desejado procedimento. "Os limites são tênues, mas cabe ao médico, juntamente com o paciente e sua família, avaliar o quanto o jovem sofre", explica o cirurgião plástico Dr. Siepe.
Segundo ele, deve haver um claro desvio dos padrões normais. O médico afirma que não operaria um jovem que se diz insatisfeito, embora tenha um nariz perfeitamente normal – ele sequer consideraria casos de pacientes que querem a correção apenas por detalhes estéticos. "Não conheço nenhum cirurgião plástico que faria uma intervenção dessas num menor de idade", reforça.
Segundo ele, casos de jovens que pedem uma cirugia plástica de presente de aniversário ou de Natal são raros na Alemanha.
Governo quer intervir
Mas especialistas em saúde dos partidos políticos que formam o governo alemão – União Democrata Cristã (CDU), União Social Cristã (CSU) e Partido Social-Democrata (SPD) – veem a situação de outra forma. Eles querem proibir as cirurgias plásticas desnecessárias sob o ponto de vista médico ou psicológico.
Hoje basta o consentimento dos pais ou responsáveis para qualquer tipo de intervenção, até mesmo operações complexas, como aumento dos seios ou lipoaspiração.
A nova lei deve, porém, permitir a intervenção cirúrgica quando há, de fato, necessidade por razões médicas. Isso inclui também os jovens que sofrem forte abalo psicológico por serem alvo de brincadeiras no colégio em razão de suas características físicas, como um nariz ou orelhas grandes.
Para o médico Kerstin von Ark, da Sociedade Alemã de Cirurgiões Plásticos, Reconstrutores e Estéticos (DGPRÄC, na sigla em alemão), os políticos exageram a real dimensão do problema ao afirmar que 10% das cirurgias plásticas na Alemanha são realizadas em menores de idade. Segundo Von Ark, esse número seria de apenas 1%. Na maioria dos casos, as cirurgias são realizadas em pacientes que reclamam do tamanho das orelhas.
"Não tinha coragem de usar tranças"
Até os 5 anos de idade, Stefanie tinha as chamadas orelhas de abano. No caso dela, os próprios pais sugeriram uma cirurgia corretiva. "O otorrinolaringologista recomendou que a cirurgia fosse feita antes que ela começasse a estudar porque é na escola primária que começam as zombarias", explica a mãe da menina.
Para o Dr. Siepe, esse é um procedimento de rotina. Casos como o de Stefanie também aparecem em seu consultório. "Em princípio, essa nem é o que se poderia chamar de cirurgia puramente estética, já que os pacientes sofrem muito por causa desse aspecto físico. Eles são alvo de chacota, perdem a confiança na escola e acabam sendo excluídos socialmente", explica, acrescentando que, nesses casos, a cirurgia é aconselhada também sob o ponto de vista médico.
Stefanie está contente por ter sido poupada das zombarias. "Eu mesma queria a operação. Não queria ter a aparência que tinha nas fotografias antigas quando fosse mais velha. Achava as minhas orelhas constrangedoras e não tinha coragem de usar tranças", conta.
A cirurgia de Stefanie transcorreu sem problemas. Ela sentiu dores depois do procedimento, mas voltou ao jardim de infância em seguida. "Eu tomava cuidado para que ninguém visse as cicatrizes." Tudo voltou ao normal na vida da menina: "Agora me sinto bem para usar tranças. É melhor assim, não me arrependo de nada".
Dificuldade a mais para os pacientes
As cirurgias nas orelhas são cerca de 80% dos procedimentos feitos em menores de idade. Mais raras são as operações de ginecomastia, que é uma hipertrofia das glândulas mamárias no homem, causada por medicamentos ou por distúrbios hormonais. Também há alguns poucos casos de intervenções em glândulas sudoríparas, em razão da produção excessiva de suor. Outras cirurgias, como a lipoaspiração, raramente são feitas em menores de idade, explica Von Ark.
Se uma nova regulamentação for aprovada, esses pacientes precisarão de uma avaliação psicológica para que possam ser submetidos a uma cirurgia, acredita Von Ark. "Para os cirurgiões, a nova lei terá pouca relevância", explica a porta-voz da DGPRÄC. "Mas o paciente terá mais um obstáculo para superar."
Dr. Siepe é da mesma opinião. "Nós não seremos afetados. Os casos em que operamos são justificáveis pelo aspecto médico e não haverá qualquer razão para mudar nosso modo de agir", argumenta.
Forte influência da mídia
Já o filósofo Dirk Lanzerath, do Centro Alemão de Referência para a Ética nas Ciências Biológicas, entende que a intervenção política no assunto é necessária. Na sua opinião, as cirurgias plásticas e estéticas precisam há muito tempo de uma regulamentação.
Essas práticas surgiram após a Primeira Guerra Mundial para tratar dos ferimentos das vítimas e, desde então, ganharam novos usos. "Especialmente quanto aos procedimentos puramente estéticos acho importante que as condições gerais sejam esclarecidas. Naturalmente, espero que os médicos contribuam com responsabilidade e participem das decisões", observa Lanzerath.
Ele ressalta que não apenas os médicos e políticos devem agir. "A pressão sobre os mais jovens vem muitas vezes da sociedade, que tolera ou mesmo promove as loucuras em nome da beleza." Cabe aos médicos, políticos e à própria sociedade agir para que os jovens possam ter uma postura crítica em relação aos ideais de beleza promovidos pela mídia e pela publicidade.
Von Ark também vê o problema da mesma forma. Os jovens são excessivamente influenciados pela mídia, afirma. "A televisão tem grande impacto. As cirurgias estéticas são apresentadas como livres de quaisquer complicações. Mas, na realidade, não é sempre assim."
No entanto, o jovem Jakob aceita correr os riscos. Ele não teme uma cirurgia no nariz e deseja fazê-la o mais rapidamente possível, até por temer mais dificuldades com a nova lei. Ele está seguro de que, com a lei ou sem ela, a operação vai ser aprovada por causa do sofrimento que ele diz enfrentar. Mas ainda terá que passar por mais uma avaliação médica para saber se sua cirurgia plástica é considerada necessária ou não.
(Os nomes dos menores de idade foram modificados pela redação)