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Alemanha repensa sua lei de prostituição

Rahel Klein ca
11 de abril de 2019

O país tem uma das legislações de prostituição mais liberais da Europa. E estima-se que pelo menos 200 mil mulheres trabalhem com serviços sexuais. Modelo nórdico, que criminaliza o cliente, está em debate.

Symbolbild Prostitution | Prostituierte in London
Alemanha é um dos países europeus com legislação de prostituição mais liberalFoto: picture-alliance/empics/Y. Mok

Ao longo de seis anos, Sandra Norak* trabalhou como prostituta na Alemanha. Quando ainda era menor de idade e frequentava o último ano do Ensino Médio, ela conheceu pela internet um homem muito mais velho que lhe prometeu todo o amor.

Isso aconteceu em 2008. Norak teve problemas em casa, abandonou a escola e finalmente foi morar com esse homem. Ele a aliciou para a prostituição. Ela foi vítima do "método Loverboy" – esse é o nome dado a esse esquema generalizado.

O homem levou Norak para um bordel de taxa fixa "tudo incluso" ("flat-rate"). Ela, hoje com 29 anos, conta que teve que atender, em quatro semanas, entre 400 e 500 clientes.

"Em algum momento, você deixa de se perceber como um ser humano sensível; isso é comparável à destruição de sua própria identidade", diz ela, no Terceiro Congresso Mundial contra a Exploração Sexual de Mulheres e Meninas, que aconteceu de 2 a 5 de abril, em Mainz.

Cerca de 350 mulheres e homens, ativistas de organizações internacionais, compareceram ao congresso. Todos eles têm um único objetivo: a proibição da compra de serviços de sexo na Alemanha e, no longo prazo, a completa proibição da prostituição.

Desde que deixou de ser prostituta, Norak também se envolveu nessa questão. "A prostituição deve ser reconhecida como o que é: uma violência e uma violação da dignidade humana", afirma. Seu desejo é compartilhado pelos participantes do congresso.

O argumento deles: a prostituição sempre surge por necessidade e termina na coerção e exploração sexual das mulheres. "Os homens não compram sexo, compram poder", comenta a renomada feminista alemã Alice Schwarzer, fundadora da revista Emma, que também compareceu ao congresso: "Vivemos num país onde a prostituição é socialmente aceitável."

Durante o congresso, os participantes falaram sobre os efeitos psicológicos e físicos da prostituição. Norak relatou suas vivências. No final do encontro, foi emitida uma declaração conjunta. A principal demanda: a Alemanha deve introduzir o modelo nórdico, como muitos outros países já fizeram. A França o implantou em 2016; a Irlanda, em 2017. Na Suécia, ele já é válido há 20 anos.

Esse modelo estipula a proibição da compra de serviços de sexo. Isso difere da proibição da prostituição: a compra de serviços sexuais é criminalizada. Assim, a punição atinge o cliente, não a prostituta.

É difícil responder até que ponto a lei sueca conteve a prostituição. Alguns especialistas dizem que a prostituição mudou: da rua para os apartamentos ou para a internet. Mas também há estudos que mostram que o mercado do sexo encolheu no geral.

Na Alemanha, a prostituição foi tratada como um atentado contra a moral e os bons costumes até 2002. A então aprovada lei da prostituição tinha o objetivo de fortalecer os direitos das prostitutas e legalizar os serviços sexuais.

Desde 2017, existe uma lei de proteção à prostituição, que visa proteger as mulheres contra a violência e a coerção. Bordéis precisam de uma autorização de trabalho, prostitutas devem ser registradas e obter um certificado, que nessa cena é chamado de "hurrenpass" ou "passaporte-meretriz".

No primeiro ano após a sua entrada em vigor, apenas cerca de 7 mil mulheres se registraram – dependendo da estatística, calcula-se que existam entre 200 mil e um milhão de prostitutas na Alemanha.

O país tem também uma das legislações de prostituição mais liberais do continente, sendo muitas vezes apelidado de o "bordel da Europa". Entre 80% e 90% das prostitutas vêm do exterior. Elas chegaram à Alemanha por meio de traficantes de pessoas, e muitas trabalham sob coerção e condições desumanas.

O governo alemão considera uma proibição da compra de serviços de sexo como o caminho errado, apontando que há o risco de que "as profissionais do sexo sejam forçadas a entrar na ilegalidade e tornarem-se vulneráveis aos perigos e riscos da indústria", disse um porta-voz do Ministério da Família há alguns dias.

Os participantes do congresso em Mainz dizem considerar esse raciocínio cínico, assim como o argumento amplamente generalizado de que muitas mulheres se prostituem voluntariamente.

 "Já há 34 anos venho cuidando de mulheres que foram exploradas", afirma Lea Ackermann, fundadora da ONG Solidariedade com Mulheres em Aflição (Solwodi). "Hoje eu digo: nenhuma mulher faz isso voluntariamente."

A pobreza é uma razão muito forte para a prostituição, explica Gerhard Trabert, fundador da associação Pobreza e Saúde na Alemanha. "Sabemos que cada vez mais mulheres estão se prostituindo simplesmente para sobreviver, porque as transferências sociais não são mais suficientes para que elas possam fazer parte da sociedade."

Trabert também defende a proibição da prostituição – e um repensar da sociedade. "Principalmente entre os homens jovens, precisamos de uma imagem diferente da mulher: que ela não seja um objeto de desejo, mas um sujeito e que usá-la dessa forma e praticar violência contra ela nada tem a ver com o amor."

Os participantes do congresso concordam que, regularmente, a demanda por uma proibição de compra de serviços de sexo é vista com bons olhos, e a possibilidade de uma queixa constitucional é amplamente aplaudida.

Alice Schwarzer faz discurso de abertura no congresso em MainzFoto: DW/R. Klein

Em sua opinião, o lobby das prostitutas impede uma legislação mais rigorosa na Alemanha. "Essa legislação ensina que os homens têm o direito ao sexo e que podem usar uma mulher a qualquer momento e depois descartá-la como um maço de cigarros", afirma Norak.

Representantes de associações de prostitutas não estavam presentes no congresso. Não houve nem contato nem convite, diz Simone Wiegratz, diretora do centro de aconselhamento para profissionais do sexo Hydra.

Mas, mesmo com um convite, provavelmente não se teria ido, comenta ela, que também é membro da diretoria da União de Centros de Aconselhamento para Profissionais do Sexo (Bufas) – as diferentes posições são simplesmente claras, apontou a diretora do Hydra.

Hydra e Bufas estão comprometidos em equiparar cada vez mais o trabalho sexual com outras formas de emprego. As entidades rejeitam estritamente a proibição da compra de serviços sexuais ou a proibição da prostituição.

De acordo com Simone Wiegratz, as mulheres não poderiam mais se defender adequadamente, porque estariam agindo na ilegalidade e seriam socialmente condenadas ao ostracismo. "Quando se é colocado num canto sujo e não se pode falar, então se está desprotegido." Assim, as mulheres estariam em condições ainda mais difíceis, explicou Wiegratz.

Ela também disse não concordar com a afirmação de que a prostituição é sempre forçada. Algumas mulheres, no entanto, não refletiriam corretamente sobre a decisão, reconhece, informando que, por isso, na consulta inicial sempre se pergunta às mulheres sobre os seus motivos.

Simone Wiegratz também disse não ver que a prostituição seja prejudicial para todas as mulheres. "Algumas podem lidar bem com isso, traçando uma linha demarcatória dentro de si, que as ajuda a levar bem a vida."

De acordo com sua experiência própria, Sandra Norak afirmou que não concorda com tais afirmações. "O que eu vi em seis anos foi simplesmente que nenhuma prostituição é boa", diz. "Ela sempre faz alguma coisa com as mulheres. Ela nunca foi tolerável para nenhuma mulher que conheci até hoje."

Hoje, Sandra Norak estuda direito e deixou para trás o tempo em que trabalhava como prostituta. Ela afirma que sua vida vai bem. "Mas que, mesmo assim, nunca se esquece do que aconteceu naquele período."

nome alterado pela redação

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