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Alemanha sofre com escassez de moradia

Helena Kaschel
24 de fevereiro de 2021

Falta de casas com aluguéis acessíveis é um problema dos centros urbanos há anos, e tende a piorar com os efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho. Mas a crise pode também ser uma chance para o setor imobiliário.

Vista aérea da cidade de Colônia, Alemanha
Foto: Geisler-Fotopress/picture alliance

As más notícias chegaram a Petra Fischer (nome modificado) e seu marido justamente no réveillon de 2019: depois de 36 anos, o casal devia deixar seu apartamento no bairro de Schöneberg, no sudoeste de Berlim. O atual proprietário requisitava o imóvel para a filha.

Desde então, o casal, ambos empregados, ela em meio expediente, procura uma nova moradia equivalente, com no mínimo dois quartos, banheiro, cozinha e varanda. Como aluguel máximo, eles estipularam 800 euros – calefação e custos de condomínio incluídos.

Isso equivale a cerca de dois terços da renda conjunta e é muito mais do que pagavam até agora. Como entraram com uma ação contra a ordem de despejo para uso próprio, devem documentar seus esforços de busca: até o momento candidataram-se 120 vezes, sem sucesso.

"Na verdade, seria muito bom se fosse aqui perto, pois naturalmente estamos muito arraigados no nosso kiez [parte de um bairro]. Dá para compreender, depois de tantos anos, até porque nossa família vive aqui e tenho que cuidar de um familiar", conta Petra à DW. Apesar disso, ela e o marido estão procurando por toda a cidade.

Eles utilizam os sistemas de alarme de portais imobiliários e as associações residenciais municipais, mas também acionaram amigos e conhecidos. Contudo, no segmento do mercado que lhes convém as ofertas são poucas, e "quando tem alguma, simplesmente não entramos em consideração", queixa-se a alemã de 56 anos.

As novas ofertas são desativadas após umas poucas horas. Quando sequer há uma resposta negativa às candidaturas dos Fischer, a justificativa é a grande demanda. As moradias sociais, subvencionadas pelo governo, para as quais é preciso apresentar um atestado especial estão fora de cogitação. Eles poderiam ter alugado algo na nova zona residencial de defronte, mas quase 20 euros por metro quadrado "é simplesmente demais".

Armazéns são reformados para virar espaço residencial no bairro berlinense de SpandauFoto: Bildagentur-online/Joko/picture alliance

Problema crônico nos centros urbanos alemães

O casal não está só com suas vicissitudes: segundo uma análise do portal imobiliário Immowelt, os aluguéis nos grandes centros alemães subiram desproporcionalmente entre 2009 e 2019: em Berlim, uma média de 104%. A associação residencial berlinense Hogowe revela que recebe uma média de 300 candidaturas por unidade residencial.

"Já há anos presenciamos, sobretudo nas metrópoles e nas cidades universitárias, uma enorme pressão de demanda", comenta Lukas Siebenkotten, presidente da associação de inquilinos Deutscher Mieterbund (DMB).

"Quem tinha até agora um apartamento relativamente em conta e não pode permanecer – por exemplo, devido a um despejo para uso próprio – não tem quase nenhuma chance de encontrar algo no segmento de preço equivalente." A situação é especialmente difícil para aqueles cujo salário está exatamente acima do limite que dá direito à ajuda estatal.

De acordo com a confederação Soziales Wohnen, a que também pertence a DMB, um dos motivos para a carência é que, com poucas exceções, há anos não se constroem imóveis de preço acessível nos centros urbanos ou regiões em expansão.

Frank Eckardt, professor de pesquisa urbana sociológica da Universidade Bauhaus de Weimar, complementa que o fato também se deve à composição demográfica das metrópoles: a maioria dos moradores dos centros de metrópoles como Frankfurt ou Munique é solteira, e a metade em idade madura, portanto "para investidores imobiliários, há pouco interesse em construir nesse segmento: custos altos e arrecadação de aluguéis relativamente baixa".

Pandemia como chance para o mercado imobiliário

Ao todo, faltam atualmente na Alemanha 670 mil moradias, quase exclusivamente de aluguéis razoáveis ou subvencionadas, relatava numa coletiva de imprensa, no início de fevereiro, Matthias Günther, diretor do Instituto Pestel, de Hannover.

Segundo a Soziales Wohnen, a cada ano desaparecem do mercado 43 mil moradias sociais subvencionadas. Para enfrentar a carência, numa cúpula em 2018 os governos federal, estaduais e municipais alemães deliberaram numerosas medidas, entre as quais uma investida bilionária para criação de moradias sociais e incentivos tributários à construção de objetos para aluguel.

A meta era, entre 2017 até o terceiro trimestre de 2021, criar 1,5 milhão de novas residências no país. O governo federal afirmou que até agora 1,2 milhão de novas moradias foram construídas neste período.

Independente do resultado da iniciativa, porém, a Soziales Wohnen alerta que, devido à epidemia de covid-19 e o consequente agravamento da situação no mercado de trabalho, a falta de moradia na Alemanha deverá piorar nos próximos meses.

Contudo a crise também traz uma chance: caso o trabalho em home-office se estabeleça no longo prazo, numerosos escritórios poderão ser transformados em apartamentos. A confederação estima que, deste modo, só até 2025 o potencial é de 235 mil novas moradias.

Eckardt vai um passo mais longe: na sequência da pandemia, haverá numerosas falências e consequentemente edifícios vazios, entre os quais também hotéis: "Por que não considerar um programa para, aos que sucumbiram à crise, pelo menos fazer a oferta de transformar seus imóveis em espaços residenciais?" Para as cidades, essa seria uma "chance única" de criar moradia a preços razoáveis, defende o urbanista.

Enquanto isso, em Berlim, Petra e o marido torcem para encontrar um novo apartamento ou poder permanecer no antigo. "A questão é: se tivermos mesmo que sair, para onde?" Mudar de cidade é impensável, devido ao parente carente de cuidados. Em último caso, só lhes restará estocar os móveis em algum lugar e ir se hospedar na casa de amigos ou da família.

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