Estação marca transição para dias curtos e frios, mas antes da chegada do inverno dá um espetáculo de cores e sensações. Na coluna, Karina Gomes comenta algumas "alemanices" do outono e descreve a melancolia da estação.
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Desde 22 de setembro, muita coisa mudou. Cada troca de estação define uma nova rotina, novos costumes e sentimentos. Como camaleões, nossos corpos e emoções se adaptam ao novo cenário de tantas cores. O outono europeu chegou pintando a paisagem alemã de tons variados entre o castanho, amarelo, laranja, vermelho e roxo.
O mix de cores nos impressiona pela beleza, mas o vento frio nos lembra que os dias ficarão cada vez mais curtos e escuros e que as temperaturas vão despencar de forma lenta e gradativa. Os dias são ensolarados, mas são o prenúncio da palidez do inverno. É, portanto, uma beleza melancólica. E apesar de ser o aviso do longo e quase eterno frio, é uma das estações mais encantadoras da Alemanha, com costumes, comidas e bebidas típicas da época.
Ruas pintadas
Com a ausência de luz e calor, as plantas param de sintetizar clorofila, pigmento que as deixou verdinhas durante a primavera e o verão. Os lagos passam a refletir as novas cores das folhas de plátano e carvalho, que ao caírem tingem o chão dos mais variados tons entre o amarelo e o vermelho.
Pequenos montes de folhas se acumulam nos canteiros das ruas, calçadas, em cima dos carros, nos telhados e insistem invadir a entrada da sua casa, talvez esperando ser acolhidas do frio que está por vir. Nas ruas, os limpadores usam um equipamento de ar para "varrer" as folhas e abrir caminho.
Com o vento, as folhas passeiam para todos os lados. Cada folha cai com charme e leveza. Para completar a melancolia, crianças e adultos empinam pipas (Drachen, dragão em alemão) que dançam no vento com o pôr do sol de fundo.
Coleção de castanhas
Não apenas as folhas, mas as castanhas caem no chão por todos os lados. As crianças não perdem tempo e fazem colares e montam com palitos pequenos animais de castanhas. Barraquinhas na rua vendem a tradicional "marone", castanha comestível assada, com sabor forte e autêntico. Em casa, também há pessoas que assam castanhas para comer acompanhadas de chá.
Em Bonn, a antiga capital da Alemanha Ocidental, a corrida para colher castanhas é frenética. Desde 1936, a fábrica de balas de goma Haribo faz todos os anos uma campanha de troca das castanhas por Gummibärchen (ursinhos de goma), que são muito populares na Alemanha. Em dois dias de outubro, centenas de famílias fazem filas em frente à fábrica para fazer a troca. As pessoas arrastam sacos enormes ou carrinhos com caixotes cheios de castanhas colhidas nas ruas.
As castanhas são doadas para instituições que protegem animais selvagens e vão servir como alimento. Dez quilos de castanha (Kastanie) ou cinco quilos de bolota, o fruto do carvalho (Eichel), as preferidas dos esquilos, valem um pacote de um quilo de balinhas de goma.
Abóboras em todas as formas
Mal começa o outono, os supermercados são invadidos por abóboras de todos os tamanhos e cores. Abóboras verdes em formato de coroa ou as tradicionais grandes para o Halloween são encontradas em toda parte. Algumas são apenas para decoração, outras, podem ser servidas – de acordo com a fome e o gosto – como pratos frios, quentes, doces ou salgados.
Colheita de cogumelos
Os alemães são especialistas na colheita de cogumelos e sabem diferenciar os comestíveis dos venenosos. O outono é a época certa para se aventurar nas florestas e colher cogumelos raros, como o Steinpilz (cogumelo porcino). Famílias, casais e grupos de amigos saem com pequenas faquinhas e sacos de pano para fazer a colheita, que é uma diversão perfeita para o fim de semana.
Federweisser
O vinho novo (neuer Wein), ou Federweisser, é a bebida típica do outono na Alemanha. Feita do mosto de uvas brancas, a bebida é resultado dos estágios iniciais da fermentação do suco da uva fresca espremida. O teor alcoólico varia de 4% a 10%.
A estação que marca o início da colheita das uvas também convida para os festivais de vinho em cidades cercadas pelos vinhedos alemães e para passeios nas trilhas de vinho nas montanhas.
Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África é mestre em direitos humanos e tem prêmios jornalísticos na área.
Tradições de outono na Alemanha
Acabou-se o que era doce: adeus verão, sol e calor. Mas para os alemães, o período de transição para a estação fria é repleto de costumes apaixonantes e divertidos.
Foto: picture-alliance/All Canada Photos
Festa da Colheita
Já no século 3º, os cristãos agradeciam a Deus pelas dádivas trazidas pela safra de outono. Na Alemanha, a Erntedankfest (Festa da Colheita) é normalmente celebrada no primeiro domingo de outubro, embora alguns se antecipem, já começando em setembro. Ao lado dos tradicionais festivais de vinho, as festas da abóbora e labirintos em campos de milho são cada vez mais populares no país.
Foto: picture-alliance/All Canada Photos
Reunificação da Alemanha
Como seriam hoje a Alemanha e o mundo, se em 9 de novembro de 1989, o Muro de Berlim não tivesse sido derrubado? O Portão de Brandemburgo simboliza tanto a divisão da Alemanha como sua reunificação. Oficialmente, a reunião das duas metades do país só ocorreu quase um ano mais tarde, sendo agora o 3 de outubro um feriado nacional.
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Dia da Unidade Alemã
Todos os anos, em 3 de outubro, o país celebra o Dia da Unidade Alemã. Políticos fazem discursos, nas cidades realizam-se concertos, e fogos de artifício não podem faltar. Para alguns alemães, contudo, o significado político e histórico desse dia é secundário: eles se alegram, acima de tudo, por não ter que ir trabalhar.
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Soltar pipa
Quando o tempo vira e os ventos ficam mais fortes, está na hora de soltar pipa. E nem é preciso ser feriado. Podem-se comprar os papagaios (ou "dragões", como dizem os alemães) em todas as cores e tamanhos – ou fazer o seu próprio. A temporada é marcada em toda a Alemanha por festivais de pipas.
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Colher castanhas
No outono, caem no chão não apenas folhas, mas também frutos. Entre os achados prediletos das crianças estão as castanhas. Mas atenção, pois há dois tipos: as comestíveis, ditas portuguesas; e as castanhas-da-índia (foto). Com essas, se podem construir bonecos divertidos. Além disso, têm uso medicinal e servem como alimento para animais.
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Dia das Bruxas
Para os celtas, o 31 de outubro marcava o fim do verão e o início da estação escura. Para afastar os maus espíritos, eles portavam máscaras assustadoras. Esse hábito manteve-se sobretudo nos Estados Unidos, festejado como Halloween ou Dia das Bruxas. Nas últimas décadas, foi adotado na Alemanha – sem muito entusiasmo, mas com direito a bonecos de abóbora e crianças pedindo doces de casa em casa.
Foto: picture alliance/dpa/P. Pleul
Todos os Santos
A rigor, todo santo da Igreja Católica Apostólica Romana tem seu próprio dia. Mas, com seu número crescendo rapidamente, o papa Gregório 6º institui um dia para a veneração de todos os santos. Ele é celebrado na Alemanha em 1º de novembro, desde o ano 835. Feriado religioso, é também o dia de se homenagearem os mortos queridos – equivalente ao Finados, em 2 de novembro, no Brasil.
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Dia de São Martinho
Em 11 de novembro, os olhos das crianças alemãs brilham de felicidade. Depois de atravessarem o bairro na procissão de São Martinho, com música e fogueiras, um homem a cavalo distribui homenzinhos de pão doce. Em seguida, os pequenos vão cantando com suas lanternas de casa em casa e ganham doces. O costume remonta ao bispo Martinho de Tours que, segundo a lenda, dividiu seu manto com um mendigo.
Foto: picture-alliance/dpa
Ganso de São Martinho
O ganso desempenha um papel central nas lendas em torno de São Martinho. Consta que ele teria se ocultado num viveiro de gansos, para escapar da nomeação como bispo. No entanto as barulhentas aves revelaram o esconderijo do modesto monge. Por isso, hoje em dia elas vão parar no prato em 11 de novembro, o Dia de São Martinho.
Foto: Imago
Tempo de couve-crespa
Em vastas regiões do Norte da Alemanha, a época do "grünkohl" (couve-crespa) é um ponto alto do outono. Famílias e amigos saem em kohlfahrt, excursões pela natureza que acabam com uma opulenta refeição de couve-crespa numa hospedaria. A verdura de inverno é geralmente servida com batatas e acompanhamento de carne em conserva ou embutidos, como mettwurst ou kasseler.
Foto: Colourbox
Ramos de Santa Bárbara
Em algumas regiões da Alemanha, em 4 de dezembro, dia de Santa Bárbara, cortam-se tradicionalmente galhos de cerejeira ou outra árvore de fruta, colocando-os num vaso para esperar-se que floresçam pontualmente no dia de Natal. A mártir assim homenageada era uma virgem grega, decapitada no fim do século 3º pelo próprio pai, devido a sua fé cristã.
Foto: imago/imagebroker/Bahnmüller
Papai Noel adiantado
O que seria do fim do outono sem São Nicolau? De vestes vermelhas e barba branca, ele é homenageado todos os anos em 6 de dezembro. As crianças bem comportadas ganham presentes, as travessas, reprimendas. A festividade remonta ao bispo bizantino Nicolau de Mira. Nos EUA, ficou conhecido como Santa Claus; para o mundo latino, com algumas modificações de indumentária, virou Papai Noel.