Baixar e trocar filmes e séries é estritamente proibido na Alemanha. Escritórios jurídicos especializados rastreiam IPs e enviam multas pesadas. Um episódio de "Walking Dead" pode valer 800 euros.
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O ano é 2012, primeiros dias na Alemanha e uma nova temporada de Walking Dead é lançada. O simples download de um episódio se tornou a sua experiência mais embaraçosa no país com uma das leis mais rígidas do mundo contra pirataria.
O dono do apartamento que ela alugava recebeu uma intimação por correio cobrando o pagamento de 800 euros pelo crime de troca de conteúdo ilegal. O download e upload do episódio foram feitos via torrent gratuitamente.
Um escritório de advocacia ligado à distribuição e direitos autorais da série na Alemanha rastreou o IP do computador para localizar a infratora brasileira que não tinha a menor ideia de que downloads e trocas de filmes e séries são estritamente proibidos por aqui.
O jeitinho foi ligar para o escritório de advocacia, sofrendo para se explicar em alemão, e argumentar que era apenas uma estudante e não tinha condições de desembolsar tantos euros de uma vez. Foi até preciso chorar, literalmente. Mas a negociação funcionou. A multa foi reduzida para 200 euros.
Depois da enorme vergonha, ficou a lição. Milhares de escritórios jurídicos especializados em identificar downloads e uploads ilegais acionam os responsáveis pelo endereço do IP e cobram multas elevadas. É preciso pagar e se comprometer a não baixar arquivos de forma ilegal novamente.
O medo de se enquadrar na lei é tanto que donos de apartamentos até colocam uma cláusula no contrato de aluguel para que o inquilino se comprometa a não realizar downloads ilegais e não utilizar torrent, big torrent e emule.
É preciso prestar atenção se o torrent não está funcionando automaticamente. Sem querer, é possível levar uma multa. É preciso desativar todo e qualquer tipo de download.
No Youtube, é muito comum ser impedido de ouvir músicas ou assistir a filmes que têm a propriedade intelectual protegida pela Sociedade Alemã de Autores e Editores (Gema). Os vídeos aparecem com um emoticon de expressão triste: "Infelizmente este vídeo não está disponível na Alemanha."
No ano passado, a associação assinou um acordo com o Youtube para desbloquear vídeos protegidos pela entidade. As negociações levaram nove anos.
Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos em direitos humanos e sustentabilidade e vive há três anos na Alemanha.
O cinema entre a Alemanha e o Brasil
A DW selecionou alguns filmes que abordam a interseção cultural entre Brasil e Alemanha.
Foto: João Ricardo
A outra pátria
Dirigido por Edgar Reitz (2013), "A outra pátria" fala da onda de emigração de alemães da região do Hunsrück para o Brasil entre os anos de 1842 e 1845, em fuga da pobreza e da fome. O longa-metragem é uma espécie de prólogo da conhecida série "Heimat" (palavra alemã para pátria ou lugar de origem), série dirigida por Reitz com mais de 15 horas de duração sobre a história alemã.
Filme dirigido por Maria Schrader, "Vor der Morgenröte" (Antes da aurora, 2016) retrata os últimos anos de vida de Stefan Zweig. Dividido em seis episódios, o longa reconstrói o exílio do escritor austríaco no Brasil, após sua fuga do nazismo na Europa. Zweig, que acabou se suicidando em Petrópolis, em 1942, oscilava entre a gratidão pela acolhida no Brasil e a nostalgia de um tempo passado.
Foto: X Verleih AG
Muito romântico
Melissa Dullius e Gustavo Jahn atravessam o Oceano Atlântico, em um navio de carga rumo a Berlim, na busca de novas experiências. Na transição lenta, o casal passa o tempo lendo e fotografando. "Muito romântico" (2016) mistura lembranças e encenações, tendo Berlim, cidade em constante transformação, como centro da narrativa construída a partir da perspectiva romântica e singular dos cineastas.
Foto: Distruktur
Outro Sertão
Documentário de 2013 sobre João Guimarães Rosa como diplomata na Alemanha sob o regime nazista. O filme, dirigido por Soraia Vilela e Adriana Jacobsen, resgata a estada do então diplomata em Hamburgo (1938-1942) e traz depoimentos de judeus que deixaram a Alemanha e emigraram para o Brasil naquele momento. Destaque é uma entrevista inédita de Guimarães Rosa à TV alemã, concedida em 1962.
Foto: Outro Sertão
Walachai
O documentário (2011) parte da experiência pessoal da diretora Rejane Zilles em um vilarejo de descendentes de imigrantes alemães, que resistem às mudanças do tempo, mantendo as raízes culturais e o dialeto do Hunsrück, região do oeste alemão. A diretora volta ao povoado e reúne mais de 40 horas de depoimentos entre os moradores, selecionados em quase uma hora e meia de documentário.
Foto: João Ricardo
Praia do futuro
Dirigido por Karim Aïnouz, diretor brasileiro que vive em Berlim, o filme foi rodado em Berlim, Fortaleza e na costa alemã do Mar do Norte. Lançado em 2014, o longa-metragem conta a história de amor entre o salva-vidas Donato (Wagner Moura) e Konrad (Clemens Schick).
Foto: Alexandre Ermel
Menino 23
O documentário "Menino 23", de Belisário Franca, tem como ponto de partida as investigações do historiador Sidney Aguilar Filho sobre tijolos marcados com a suástica nazista, encontrados no interior do Brasil, que revelam a história de meninos órfãos e negros, vítimas de um projeto criminoso de eugenia. Aloizio Silva, o "menino 23", sobreviveu até os 93 anos.
Foto: Globo Filmes/Menino23
Cinema, aspirinas e urubus
Com direção de Marcelo Gomes, o filme de 2005 narra a história de um alemão que, em fuga da Segunda Guerra Mundial, vai trabalhar como vendedor de aspirinas no sertão nordestino. As aspirinas são, porém, uma forma de viabilizar a exibição de filmes promocionais nos vilarejos. No caminho, o protagonista encontra um nordestino que tenta seguir para o Rio de Janeiro e o encontro muda a vida de ambos.
Foto: Divulgação/Presse
Ilha dos esquecidos
Longa-metragem de 1999, dirigido por Thomas Keller e Andreas Weiser, é um filme sobre o presídio que existiu na Ilha Grande (Rio de Janeiro) até o ano de 1994. O documentário resgata a história dos moradores do lugar, que eram obrigados a aceitar as limitações constantes da ilha que servia de sede a uma penitenciária, para logo depois terem que aprender a lidar com a nova liberdade.
Foto: Andreas Weiser
Os Mucker
"Os Mucker" (1978), de Jorge Bodanzky e Wolf Gauer, recria os acontecimentos da revolta na gaúcha Ferrabraz, no século 19, quando um movimento de caráter religioso, formado por imigrantes alemães e liderado por Jacobina Mentz Maurer, foi combatido por tropas do Exército Imperial. O filme, primeira coprodução entre Brasil e Alemanha, relembra esse episódio negado pela historiografia oficial.