Os "Schrebergärten" – jardins urbanos alemães – são muitas vezes confundidos com favelas por estrangeiros, mas são espaços de lazer superdisputados na Alemanha. Terrenos públicos são arrendados à população.
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A primeira impressão do olhar estrangeiro sobre as pequenas casinhas amontoadas à beira das ferrovias ou no meio das cidades é de que são "favelas ao estilo alemão".
Os barraquinhos de madeira enfileirados e separados por cercas são, na verdade, parte dos disputados jardins urbanos da Alemanha – os Schrebergärten.
Os terrenos públicos cedidos a mais de 15 mil associações que coordenam o aluguel e a utilização dos espaços servem para o cultivo de legumes, verduras e flores. Ou ainda para aproveitar as noites quentes do verão depois do trabalho ou fazer um churrasco no fim de semana.
É uma opção econômica para quem mora em apartamentos e não tem um espaço de lazer ao ar livre. Os "puxadinhos" nas grandes e pequenas cidades da Alemanha já foram considerados caretas, mas se tornam cada vez mais populares entre as famílias jovens alemãs.
Os mais de um milhão de Schrebergärten na Alemanha cobrem uma área de quase 50 mil hectares e são disputadíssimos. Há longas filas de espera para conseguir alugar um pequeno lote. Os preços variam de acordo com a região e instalações próximas, como piscinas públicas ou espaços de diversões para crianças.
O arrendamento dos lotes é, geralmente, por tempo indeterminado e pago anualmente à associação que gere a área, mas os cerca de 5 milhões de locatários precisam cumprir as regras de organização e limpeza. As cercas vivas precisam ser aparadas de forma impecável, o gramado bem cortado, e os caminhos de passagem sempre limpos para que os vizinhos não reclamem.
Tem até quem comemore a festa de casamento nos pequenos jardins, idealizados há 200 anos. A primeira colônia de jardins urbanos foi estabelecida em 1814 por um pastor na cidade de Kappeln, no extremo-norte da Alemanha.
Já o nome "Schrebergarten" é uma alusão ao médico Daniel Schreber, de Leipzig, que incentivou a criação de espaços verdes de lazer para que crianças pudessem ficar mais perto da natureza e serem mais saudáveis.
Esses jardins também estão presentes na Áustria, Suíça e outros países na Europa Central e Escandinávia. As casinhas de cada lote não podem servir como moradia, e os produtos cultivados não podem ser vendidos. Os locatários também precisam respeitar leis ambientais.
O movimento kleingärten (pequenos jardins, em alemão) inovou a ecologia urbana e o paisagismo das cidades alemãs, com espaços públicos voltados ao cultivo sustentável e ao lazer. Com a primavera e a chegada do verão, quem tem um Schrebergarten volta a enfeitar os jardins e colocar as cadeiras do lado de fora para aproveitar o sol. São pulmões verdes em meio ao asfalto.
Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos em direitos humanos e sustentabilidade e vive há três anos na Alemanha.
O alemão e seu jardim
O jardim é um assunto muito sério na Alemanha. Por isso, o tema reúne uma série de peculiaridades que espelham valores tipicamente alemães.
Foto: picture alliance / Rzepka
"Gemütlichkeit", o aconchego em casa
Em toda a Alemanha, da primavera ao final do outono, terraços e jardins são enfeitados com flores e plantas. O verão é curto no país, por isso o tempo de aproveitar o jardim é vivido intensamente. Seja no começo da primavera, ou na chegada do outono, há rituais que são seguidos à risca para ter um jardim colorido no verão e protegido no inverno.
Foto: picture-alliance/dpa
E o turista pergunta: "É uma favela?"
Em geral, estes pequenos jardins e hortas alugados não são habitados e estão organizados em associações. Para regulamentá-los, há uma legislação nacional (Bundeskleingartengesetz). Estas áreas plantadas servem de compensação verde no espaço urbano. A ideia iniciou no fim do século 18 para combater fome e miséria. Eles foram muito importantes também após a 2ª Guerra, para a produção de alimentos.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Schmidt
Valorização do espaço
Se tornou comum famílias que moram em apartamento alugar um pequeno pedaço de terra de agricultores que têm propriedades próximas a áreas urbanas. O tamanho pode ser, por exemplo, 4 x 4 metros. O contrato vale por alguns meses. É interessante especialmente para crianças, que podem cultivar flores e legumes.
Foto: picture-alliance/ZB/P. Pleul
Horários definidos
O barulho do cortador de grama pode ser um fator de conflito entre vizinhos, portanto, quem não tem uma máquina silenciosa e quer evitar confusão, só corta a grama das 9 às 13 e das 15 às 17 horas. Aos domingos e feriados, esse trabalho é tabu. Ou se adquire um robô, como o da foto, que corta a grama sozinho e é silencioso.
Foto: picture alliance/NurPhoto/J. Arriens
Respeito à privacidade
Quando se quer fazer uma festa no terraço ou no jardim, o melhor é logo convidar os vizinhos. Só assim eles não se sentirão incomodados pela fumaça ou chamarão a polícia por causa do barulho. É bom conferir o contrato de aluguel, pois fazer churrasco pode ser proibido. E quanto ao horário de silêncio, ele vale das 22 às 6 horas. Fazer festa pode, mas desde que não incomode os outros.
Foto: Elke Dubois/TZS
A distância da cerca
Antes de plantar árvores e arbustos, é preciso se certificar sobre as regulamentações estaduais quanto à distância a respeitar até a divisa com o vizinho. Isso para que, após alguns anos, a sombra ou os galhos não o incomodem. E atenção: não se pode cortar galhos nem colher frutos sem a permissão do proprietário, mesmo que tenham invadido o terreno da gente.
Foto: Mehdi Haeri
Um produto para cada coisa
Basta querer (e poder) gastar, que as opções nas lojas especializadas são variadas. Não só pelas plantas em si, também há terra e adubo para cada variedade de planta, móveis, ferramentas especiais para todo tipo de trabalho e métodos dos mais variados contra pragas, sejam químicos ou mesmo uma fita cheia de cola para colocar em volta do caule ou tronco e assim evitar formigas.
Foto: picture-alliance/dpa/BUGA 2015/T. Uhlemann
Aproveitamento da chuva e reciclagem do lixo
O recolhimento da água da chuva é comum. E também o lixo, que vai para o tonel de produtos orgânicos, recolhido semanalmente. Ali podem-se descartar não só a grama cortada, mas também galhos de árvores e ervas.
Foto: picture-alliance/dpa/K.D Gabbert
Inspiração não falta
Não só as lojas de plantas oferecem inspiração e mostram novidades. A proximidade com a Holanda – um indiscutível centro de produção de flores – e as exposições estaduais e nacionais de jardinagem e paisagismo também servem de estímulo.
Foto: DW
Anão de jardim, um clichê?
Muitos consideram o anão de jardim uma coisa ultrapassada, mesmo assim ele é considerado cult por muita gente. Hoje em dia, ele está à venda em diferentes materiais e nas mais variadas cores e posições.