Ameaças de morte a opositores da extrema direita na Alemanha
19 de julho de 2020
E-mails são assinados "NSU 2.0", aludindo a rede terrorista. Entre destinatários, está repórter Deniz Yücel, condenado na Turquia. Secretário do Interior não descarta rede radical de direita na polícia estadual.
Anúncio
Pelo menos 15 figuras da política e jornalismo da Alemanha que se engajam contra a extrema direita receberam e-mails contendo ameaças de morte neste fim de semana (18-19/07), noticiou o semanário Welt am Sonntag.
Mensagens desse gênero estão em circulação pelo menos desde 2018, assinadas "NSU 2.0". Trata-se de uma alusão à rede de terrorismo neonazista Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU) que perpetrou uma série de assassinatos entre 2000 e 2007 antes de ser desbaratada.
Das mensagens atuais consta pela primeira vez o nome do repórter teuto-turco Deniz Yücel, que esteve um ano preso na Turquia, acusado de fazer propaganda para o Partido Popular do Curdistão (PKK), desencadeando uma crise diplomática entre Berlim e Ancara.
Após um ano, jornalistas da DW pedem libertação de colega
01:57
Condenado à revelia na Turquia, mas de volta à Alemanha desde 2018, ele criticou a polícia por não informá-lo do incidente: "Acho inquietante só ter ficado dessas mensagens de ameaça através das pesquisas dos meus colegas do Die Welt", disse, referindo-se ao jornal para que trabalha.
Entre os destinatários da atual série de e-mails estão o secretário do Interior do estado de Hessen, Peter Beuth, a advogada Seda Basay-Yildiz, a líder do partido A Esquerda Janine Wissler e a satirista Idil Baydar, assim como as redações de meios de comunicação. Wissler e Baydar já haviam sido ameaçadas anteriormente.
No início de julho, o secretário Beuth declarou não poder descartar a possibilidade da existência de uma rede de extrema direita dentro da polícia estadual: "Espero da polícia de Hessen que empreenda todos os esforços para dispersar essa suspeita", comentou, e anunciou um catálogo de medidas que incluem a nomeação de um investigador especial para o caso. Na segunda-feira, a bancada estadual do A Esquerda organizou em Frankfurt uma manifestação contra a suposta presença ultradireitista no órgão de segurança.
Pelo menos desde 2018, mensagens contendo ameaças de violência e morte têm sido enviadas a políticos, celebridades e organizações judaicas da Alemanha. Investigadores deduziram que pelo menos três incidentes envolveram acesso ilícito a computadores da polícia, colocando a instituição sob foco negativo.
Segundo a emissora SWR, já em 2017 houve consultas irregulares de dados por dois agentes da lei de Hessen. Além disso, desde 2015 realizaram-se inquéritos contra 65 funcionárias e funcionários da polícia estadual por conexões com a cena radical de direita. Atualmente ainda estão em curso 35 processos, em 17 casos as investigações foram encerradas.
Desde o golpe militar fracassado contra o presidente Erdogan, em julho de 2016, relações entre Ancara e Berlim têm se deteriorado constantemente. Mas o processo já começara antes, e não há fim à vista.
Foto: picture-alliance/POP-EYE/B. Kriemann
Caso Böhmermann
31 de março de 2016: O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, apresenta queixa contra o humorista alemão Jan Böhmermann por seu "poema difamatório" a respeito dele, envolvendo bestialidade, entre outras acusações. Em 4 de outubro, os promotores encerraram o caso, mas um conflito diplomático entre Ancara e Berlim estava desencadeado.
2 de junho de 2016: Parlamento alemão aprova quase unanimemente resolução classificando como genocídio o massacre de centenas de milhares de armênios pelo Império Otomano, em 1915. Ancara retira seu embaixador de Berlim, a comunidade turca promove protestos em várias cidades alemãs. Segundo a Turquia, o número de mortes seria exagerado, e também havia muçulmanos turcos entre as vítimas.
Foto: Getty Images/AFP/S. Gallup
Tensões após golpe fracassado
15 de julho de 2016: Uma facção das Forças Armadas turcas tenta derrubar o presidente turco, mas fracassa. Ancara acusa Berlim de não se posicionar contra a tentativa de putsch nem fazer algo contra a organização do pregador exilado Fethullah Gülen, acusado por Erdogan de orquestrar o golpe militar.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Suna
Alemanha critica purgação pós-golpe
Logo em seguida à tentativa de golpe, as autoridades turcas fizeram uma devassa no Exército e no Judiciário, detendo milhares de pessoas. Logo em seguida, a purgação foi expandida, incluindo funcionários públicos civis, diretores e professores universitários. Políticos alemães criticaram as detenções. Diplomatas, acadêmicos e militares turcos fugiram do país e pediram asilo na Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Suna
Manifestações curdas em Colônia
A devassa de Erdogan pós-golpe foi também condenada por ativistas curdos em manifestações na cidade de Colônia, no oeste alemão. Em muitas delas se exigia a libertação de Abdullah Öcalan, líder encarcerado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). Ancara Turquia acusa Berlim de não fazer esforços suficientes para sustar as atividades do grupo. que classifica de terrorista.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Meissner
Prisões de cidadãos alemães na Turquia
14 de fevereiro de 2017: Deniz Yücel, correspondente do jornal "Die Welt", é colocado sob custódia policial na Turquia. Outros cidadãos alemães, como a jornalista Mesale Tolu e o ativista de direitos humanos Peter Steudtner, são detidos pelo que Berlim define como "razões políticas". Todos os três foram acusados pelas autoridades turcas de apoiar organizações terroristas.
Março de 2017: Municipalidades alemãs proíbem ministros turcos de realizarem comícios a favor do referendo de abril na Turquia, para ampliar os poderes presidenciais de Erdogan. Este acusa a Alemanha de empregar "táticas nazistas" contra cidadãos turcos em seu território e deputados turcos em visita. Dirigentes alemães condenam severamente o líder turco, acusando-o de ter ido longe demais.
Foto: picture-alliance/dpa/O. Berg
Espionagem
30 de março de 2017: A Alemanha acusa a Turquia de espionar centenas de adeptos de Gülen, assim como mais de 200 associações e escolas ligadas ao movimento do pregador na Alemanha. Paralelamente, requerentes de asilo turcos acusam o departamento de imigração BAMF de repassar as informações deles para veículos de imprensa ligados ao governo turco.
Foto: Imago/Chromeorange/M. Schroeder
Erdogan insta turco-alemães a não votarem em "inimigos"
18 de agosto de 2017: O presidente chama três dos principais partidos políticos da Alemanha de inimigos da Turquia e insta os alemães de origem turca a não votarem neles na eleição geral de setembro. Seus alvos são a União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, o Partido Social-Democrata (SPD) e o Partido Verde. A chefe de governo acusa Erdogan de se imiscuir na eleição.
Foto: picture-alliance/abaca/AA/M. Ali Ozcan
Merkel contra Turquia na UE
4 de setembro de 2017: A chanceler federal alemã, Angela Merkel, afirma, durante debate eleitoral, ser contra a Turquia se tornar membro da União Europeia e promete conversar com outros líderes da UE sobre o fim das negociações com Ancara nesse sentido. Em outubro, ela apoia a iniciativa de cortar os fundos pré-filiação da Turquia.
Foto: Reuters/F. Bensch
Ofensiva militar turca em Afrin
20 de janeiro de 2018: Forças Armadas turcas e seus aliados rebeldes sírios lançam a Operação Ramo de Oliveira contra o enclave curdo de Afrin, no norte da Síria. A ofensiva é criticada por políticos alemães e desencadeia protestos de comunidades curdas na Alemanha.
Foto: Getty Images/AFP/O. Kose
Deniz Yücel é libertado da prisão
16 de fevereiro de 2018: A Turquia liberta o jornalista turco-alemão Deniz Yücel, depois de mantê-lo preso por mais de um ano sem acusações formais. Segunda a mídia estatal turca, o turco-alemão foi libertado da detenção pré-julgamento sob fiança. A promotoria exige para ele pena de 18 anos de prisão, por "propaganda terrorista" e incitação popular.