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Brics em Brasília, entre reafirmação e reconfiguração

15 de novembro de 2019

Desde a criação do bloco, em 2006, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul se desenvolveram distintamente - e hoje perseguem interesses em parte contrários. Ainda assim, cúpula confirmou relevância global do Brics.

Presidentes Jair Bolsonaro, Vladimir Putin e Xi Jinping
Bolsonaro, Putin e Xi reestudam papel do Brics na economia mundialFoto: Getty Images/AFP/S. Lima

Foi como um encontro de velhos amigos, afirmou o presidente Jair Bolsonaro após o encontro de cúpula dos Brics em Brasília. De fato, os líderes reunidos se assemelhavam, sobretudo na idade e no gênero: os chefes de Estado do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul têm todos mais de 60 anos de idade. Mas para encontrar outros pontos em comum, em sua reunião sob a égide brasileira, eles vão ter que se esforçar muito.

No comunicado final, manifestaram consenso quanto à intenção de fomentar o multilateralismo, rechaçar o protecionismo e ampliar o comércio dentro do bloco. Atrás dessa reivindicação, estava uma crítica indireta aos Estados Unidos do presidente Donald Trump – mas só indireta mesmo, pois o presidente populista de direita do Brasil é fã declarado de seu colega americano, e também para a Índia os EUA são um parceiro comercial estrategicamente importante.

Ainda assim evidenciou-se que, enquanto os conflitos de interesse dentro do Brics aumentaram, o significado do bloco como associação dos países emergentes em rápido crescimento diminuiu. Foi sob o aspecto do crescimento que, na década de 2000, o Jim O'Neill, economista-chefe do banco de investimentos Goldman Sachs, reuniu quatro países sob o acrônimo Bric.

Em 2010, por motivos políticos, a África do Sul foi acrescentada, como representante do continente africano. Contudo o bloco, responsável por 40% da população mundial e cerca de um terço do produto econômico mundial, se transformou numa constelação heterogênea.

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É fato que se manteve a divisão de trabalho original, elaborada por O'Neill ao propor o Bric: na economia mundial, China é a fabricante industrial ("galpão"); Índia, a prestadora de serviços ("fábrica de ideias"); Brasil, o fornecedor de produtos agrários e matérias-primas ("alimentador"); e Rússia, a de petróleo e gás ("posto de abastecimento").

Contudo a Índia e a China cresceram vertiginosamente, deixando seus parceiros do Brics para trás: desde 2001, sua participação na economia mundial cresceu de 12% para 27%, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Por sua vez, Rússia, Brasil e África do Sul caíram de 7% para 6%. Após vários anos de crise, estes dois últimos se mantiveram como potências regionais, na periferia da economia mundial, enquanto a Rússia segue na liderança militar do grupo.

Entretanto, o fato de os demais chefes de Estado terem se disposto a percorrer o longo caminho até Brasília mostra que importância ainda conferem ao bloco, como centro de poder geopolítico alternativo.

O presidente chinês, Xi Jinping, criticou que o crescente protecionismo internacional faça estagnar o comércio e os investimentos. Em Brasília, ele se posicionou como o economista de mercado, protetor do clima e incentivador da economia digital global – obviamente como alternativa a Trump.

Seu homólogo russo, Vladimir Putin, cuja economia sofre com as sanções da União Europeia, declarou interesse em maior cooperação internacional nas áreas de farmacêutica, viagem aérea e espacial, informática e tecnologia nuclear. O chefe de Estado indiano, Narendra Modi, em contrapartida, quer intensificar o livre-comércio dentro do Brics.

O anfitrião Bolsonaro manteve-se bastante reservado, do ponto de vista político. Chamou a atenção o modo como cortejava Xi Jinping: apenas um ano atrás, em sua campanha eleitoral, ele bradava contra a expansão chinesa no Brasil. Agora, expressou gratidão por os conglomerados de energia chineses terem impedido que o recente megaleilãodo pré-sal fosse um completo fiasco.

Xi mostrou-se generoso, anunciando um fundo de investimento no valor de 100 bilhões de dólares, a ser criado para projetos de infraestrutura no Brasil. A China pretende disponibilizar 15 bilhões de dólares imediatamente, tão logo o Brasil possa garantir uma participação própria de 5 bilhões de dólares.

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