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Análise: Mercosul-UE, longa espera com risco de entraves

29 de junho de 2019

O tratado de livre-comércio entre os blocos europeu e sul-americano poderá ser importante impulso modernizador para economias do Brasil e região. Porém isso ainda demorará alguns anos – e a resistência já se anuncia.

Pessoas pisam sobre estrelas da bandeira da União Europeia
Analistas sul-americanos estimam que levará de um ano e meio a cinco anos até o acordo UE-Mercosul entrar em vigorFoto: Getty Images/S. Gallup

Finalmente! Desde 1999 a União Europeia e o Mercosul negociavam um tratado de livre-comércio – a primeira vez que falaram a respeito foi 25 anos atrás, portanto há um quarto de século.

Em suas dimensões, o acordo é, de fato, impressionante: o maior entre dois blocos econômicos, em todo o mundo, abarcando um mercado conjunto de 780 milhões de consumidores e cerca de um quarto do PIB global. Trata-se do tratado economicamente mais importante que a UE já fechou, contendo as maiores reduções de taxas aduaneiras.

Ainda não se conhecem seus detalhes, por isso os especialistas em comércio exterior se manifestam a respeito ainda de forma genérica. O ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, por exemplo, receia que a UE tenha se aproveitado da debilidade política e econômica do Mercosul para negociar condições mais vantajosas para os europeus.

Rubens Barbosa, ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos, por sua vez, saúda o acordo, "mas agora a competitividade dos produtos da América do Sul tem que ser aumentada, e isso só é possível se reduzirmos os custos extras". Para as economias do Mercosul, abaladas pela crise, o acordo poderia representar um importante impulso a suas balanças comerciais, aos investimentos diretos e à confiança dos investidores.

Agora as cadeias de valor entre a UE e os Estados sul-americanos precisam ser recalculadas. Por um lado, as empresas locais poderão aumentar mais rapidamente sua produtividade, com a importação facilitada de produtos de maquinaria, eletrônica e informática. Por outro lado, agora as companhias do Brasil e da Argentina terão que se afirmar na concorrência mundial.

É fato que os prazos de transição e carência para o Mercosul têm se configurado brandos: as montadoras de automóveis, por exemplo, dispõem de 15 anos até terem que concorrer com as importações livres de taxas; nos próximos sete anos não há ameaça de redução de tarifas alfandegárias. No entanto, cada setor empresarial em breve terá que considerar com exatidão como pretende utilizar as capacidades na América do Sul, que provavelmente logo serão grandes demais.

Há também muitas companhias da Europa que se adaptaram aos mercados sul-americanos fechados, com fábricas e produtos próprios que não comercializam mais nos países industriais. As mesmas montadoras que agora contam poder exportar veículos de qualidade superior para a América do Sul, em parte já produzem há décadas na região, sendo tão beneficiadas pelas tarifas externas ou créditos subvencionados quanto as empresas locais. Isso se aplica a conglomerados de química, medicamentos e eletroeletrônicos.

Para as companhias europeias, entretanto, abre-se um mercado de 260 milhões de consumidores, até então de difícil acesso para os exportadores, devido às elevadas taxas aduaneiras sobre medicamentos, maquinaria e peças de automóveis, entre outros.

Lá, eles se encontram sob pressão crescente: a China não é apenas o maior parceiro comercial do Mercosul, à frente da UE, também os investimentos diretos do Extremo Oriente aumentam vertiginosamente na América do Sul. Com o tratado de livre-comércio, as multinacionais europeias ganham agora uma pausa para respirar, diante do avanço chinês no subcontinente.

Analistas sul-americanos estimam que levará de um ano e meio a cinco anos até o tratado comercial entrar em vigor: ele ainda precisa ser finalizado e, em seguida, ratificado pelos Estados participantes e pelo Parlamento Europeu. Contudo não é só nos lobbies e na política oficial da Europa que se acumula a resistência contra o acordo com os sul-americanos: ativistas da sociedade civil igualmente começam a se mobilizar.

A crítica se dirige, sobretudo, ao presidente Jair Bolsonaro, que pouco interesse mostra pela defesa ambiental, direitos humanos ou a proteção das minorias. Associações de preservação ambiental como a Greenpeace já começam a advertir contra o consumo de produtos agropecuários brasileiros. Deverá aumentar a pressão das sociedades civis da Europa sobre os parlamentos nacionais, para que eles recusem as ratificações. Também no Brasil e na Argentina os sindicatos organizarão resistência, juntamente com as confederações de indústria.

Enquanto isso, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, argumenta que o tratado de livre-comércio Mercosul-UE é o melhor meio de influenciar as condições ambientais na América do Sul. E a Comissão Europeia, por sua vez, assegura que os altos padrões e controles de segurança europeus permanecerão intocados.

Quem deve ter ficado bem chateado com a notícia sobre o acerto em Osaka, porém, foi Donald Trump. Ainda na manhã de sexta-feira, à margem da cúpula do G20, ele havia cortejado Bolsonaro e proposto um tratado de livre-comércio com os EUA. Contudo desta vez o autoproclamado "dealmaker" chegou tarde demais com sua oferta.

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