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Antiga capital alemã vira reduto salafista

Matthias von Hein (av)13 de novembro de 2014

Passado como capital determinou a forte presença muçulmana na pacata Bonn, em especial das camadas mais conservadoras. Um duplo perigo: de um lado, a radicalização; do outro, o anti-islamismo.

Foto: picture-alliance/dpa

Bonn, capital da República Federal da Alemanha de 1949 a 1999, certamente preferiria ser associada às instituições da ONU e conglomerados empresariais lá sediados, ao romantismo renano, ao festival de música Beethovenfest ou a seu Carnaval. Porém, recentemente a pacata cidade tem antes virado manchetes relacionadas a salafismo, fundamentalismo islâmico, terrorismo e jihad.

Atualmente, por exemplo, um cidadão de Bonn convertido ao islã responde diante do Tribunal Estadual de Düsseldorf por um atentado à bomba frustrado contra a estação ferroviária central da cidade.

Redator do jornal Bonner General-Anzeiger, há anos Frank Vallender se ocupa do tema extremismo em Bonn. Em entrevista à DW, ele lembra jihadistas locais como Bekkay Harrach: antes de ser morto em 2010 no Afeganistão, ele enaltecia a chamada "guerra santa" em vídeos na internet.

Outro caso é o dos irmãos Yassin e Mounir Chouka, também naturais da cidade e que incitavam a atentados na Alemanha em suas mensagens de vídeo a partir da fronteira afegã-paquistanesa. Ao que tudo indica, esses apelos encontraram solo fértil junto ao homem que está atualmente em julgamento.

Raízes no passado como capital

O fato de a localidade de 300 mil habitantes à margem do Reno ter aparentemente se transformado num centro de salafistas radicais também deixa apreensiva a encarregada municipal de Integração, Coletta Manemann. Em mais de um sentido: pois de um lado está a radicalização, sobretudo dos homens mais jovens, do outro, a ameaça do anti-islamismo.

Ela atribui a inegável concentração de salafistas extremistas em Bonn ao passado da cidade como capital federal. Desde cedo, lá se construíram várias mesquitas, pois as embaixadas dos países árabes insistiam na importância de que seus funcionários tivessem um local para orar.

Pitoresco: centro da cidadezinha de BonnFoto: DW/L.Tarek

Entretanto, pelo menos temporariamente, algumas dessas casas de oração se transformaram em pontos de encontro para extremistas. Segundo fontes da polícia, Bonn oferecia aos radicais islâmicos uma boa rede de conexões.

O árabe é o segundo idioma mais falado na cidade, em especial no distrito de Bad Godesberg, no sul. Se por um lado isso atraiu até o Reno muitos árabes que querem se tratar com médicos de sua própria cultura e idioma, a atração também se exerceu sobre os muçulmanos fundamentalistas. Depois que foram fechados seus locais de reunião em Hamburgo e Ulm, em 2005, grupos inteiros de islamistas conhecidos da polícia se mudaram para Bonn.

Mais véus, menos salsichão

A paisagem urbana de Bad Godesberg é marcada por restaurantes árabes e por lojas que procuram atrair a clientela com cartazes em escrita árabe.

Lá é mais fácil seguir os preceitos alimentares islâmicos do que encontrar um tradicional salsichão alemão. Imobiliárias anunciam em árabe apartamentos e casas mobiliados para temporada. Mulheres cobertas de véus da cabeça aos pés passeiam pela zona de pedestres; durante o verão, uma loja oferece "trajes islâmicos femininos".

Mais ao sul de Bad Godesberg ergue-se o prédio da Academia Rei Fahd, uma escola saudita que, por fora, lembra uma mesquita. Seu nome é citado repetidamente em conexão com o salafismo radical que se criou em Bonn.

Academia Rei Fahd obedece currículo escolar sauditaFoto: DW/M. von Hein

Ibrahim al-Megren, diretor da escola há quatro anos, se esforça para dispersar essa impressão. Em seu espaçoso escritório, acompanhado por café e biscoitos, ele relata que os livros escolares são anualmente revisados e fala da cooperação estreita com as autoridades alemãs.

Hoje, além da formação secundária da Arábia Saudita, sua instituição também oferece um certificado de conclusão reconhecido internacionalmente, conta, visivelmente orgulhoso.

Passado duvidoso

Em 2003, porém a escola entrou na mira dos órgãos de segurança interna alemães: um professor teria conclamado à "guerra santa". De repente, as autoridades de ensino do país notaram que em algumas classes só havia uma aula de idioma alemão por semana.

As publicações escolares foram submetidas a sindicância. Segundo o diário Frankfurter Allgemeiner Zeitung, nelas se glorificava a "luta contra os infiéis" e se prometia aos mártires recompensa no paraíso.

Os alunos não eram apenas filhos de diplomatas ou de outras famílias cuja permanência na Alemanha fosse temporária: dois terços dos jovens da Academia Rei Fahd possuíam cidadania alemã. Aplicando regulamentos especiais, as autoridades educacionais os haviam liberado da obrigatoriedade de frequentar as escolas alemãs

O resultado foi que famílias de forte orientação religiosa haviam se mudado de todas as partes da Alemanha especialmente para Bonn, a fim de que seus filhos fossem educados na Academia Fahd, de maneira estritamente conservadora e isolados das influências ocidentais. Na juventude, o jihadista Bekkay Harrach também frequentou a instituição.

Ibrahim Al-Megren, diretor da AcademiaFoto: DW/M. von Hein

Hoje, a escola transmite uma imagem de abertura e transparência. Existem dias de portas abertas, participação em festivais de leitura, além de uma busca por diálogo com os vizinhos, com outras escolas e religiões. Por seus corredores veem-se também mulheres sem lenço.

Entretanto nota-se também que há muito espaço vazio. A academia, construída para 600 estudantes, atualmente não é frequentada por mais do que 150. Desde o escândalo de 2003, os órgãos de ensino se tornaram bem mais restritivos com a liberação da escolaridade regular.

Respostas fáceis do extremismo

Apesar de tudo, as famílias extremamente religiosas ainda se mantêm em Bonn. Seus filhos frequentam agora escolas alemãs comuns. Numa delas, próxima à Academia Fahd, a taxa de colegiais de fé muçulmana é de 80%. Num dia de portas abertas no fim de outubro, mulheres totalmente veladas tomam café com bolo juntamente com os filhos.

Mas a diretora enfatiza o fato de que, ao conversar com os professores, essas mães retiram o véu – afinal, a mímica facial é uma parte importante da comunicação. Ela não percebe qualquer influência de pregadores fundamentalistas sobre seu corpo discente.

Por outro lado, a educadora registra um interesse crescente por questões de religião e política – por exemplo, pelos conflitos na Síria e no Iraque, ou pelo "Estado Islâmico" (EI). Por vezes, os alunos tentam provocar, repetindo teses que escutaram na mesquita ou em suas famílias.

Um tanto resignada, a diretora constata que as coisas são fáceis para o extremismo, pois oferece explicações simples para um mundo complicado. E dá uma orientação forte, ao dizer explicitamente o que supostamente é certo ou errado.

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