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Após 25 anos, atentado de Lockerbie ainda é cercado de enigmas

Alois Berger (md)21 de dezembro de 2013

Líbia assumiu a autoria e indenizou as famílias das vítimas da explosão de um Boeing 747 sobre a cidade de Lockerbie. Mas muitos questionam se o regime de Kadafi teria sido o único envolvido no ataque.

Lockerbie Attentat
Foto: Roy Letkey/AFP/Getty Images

No dia 21 de dezembro de 1988, por volta de 19h, um Boeing 747 da companhia aérea americana Pan Am caía em Lockerbie, na Escócia, matando todos os 249 ocupantes. A queda também matou 11 moradores da localidade. Nos destroços, investigadores encontraram traços de explosivo plástico Semtex. Apesar de vários grupos, principalmente islâmicos, terem assumido o ataque, a suspeita rapidamente recaiu sobre a Líbia.

Um quarto de século mais tarde, ainda existem mais perguntas que respostas – apesar de anos de investigações britânicas; de um processo internacional; da condenação de um agente de inteligência da Líbia; do pagamento de compensações e da publicação de diversos livros sobre o atentado.

"Lockerbie continua um atentado enigmático", escreve o jornalista e especialista em inteligência Erich Schmidt-Eenboom. "Nele, podemos ver que há sempre grande quantidade de partes envolvidas no jogo do terrorismo internacional, que existem teorias da conspiração e que tais operações de inteligência não poderão ser esclarecidas sem a abertura de arquivos."

Contradições no tribunal

O filósofo e professor universitário austríaco Hans Köchler vai ainda mais longe. Ele foi enviado a Haia como observador do caso Lockerbie em 2000 pelo secretário-geral das Nações Unidas. Köchler estava presente quando juízes escoceses absolveram um ex-integrante do serviço secreto líbio e condenaram outro, Abdel Basset Ali al-Megrahi, à prisão perpétua. "Por tudo o que eu sei e vi, foi produzido ali um erro judicial", afirma Köchler.

Ele diz que a produção de provas se deu "de forma estranha". Köchler lembra que a mais importante evidência, uma peça eletrônica do tamanho de uma unha, só tinha aparecido meses após o início da investigação. O objeto era o pedaço de um dispositivo de detonação que uma empresa suíça teria fornecido à Líbia. "Mas tal fragmento deveria ter sido queimado junto com a bomba", aponta. "Físicos escoceses já fizeram explosões testes com Semtex. Elas liberam um gás extremamente quente, que não deixa sobrar nada."

Reconstrução do atentado: produção de provas levantou dúvidasFoto: Getty Images

A empresa suíça afirmou, no decorrer do julgamento, que a peça apresentada no processo saíra de um detonador para amostra que a polícia tinha recolhido em Zurique. "Tais inconsistências acompanharam todo o processo", lembra Köchler. Ele também se recorda que durante todo o julgamento dois homens estavam presentes no tribunal, embora não constassem nos documentos do processo. "Eram dois funcionários do FBI [polícia federal americana], que falavam o tempo todo com os integrantes da equipe de promotores."

Confissão líbia

O especialista em inteligência Erich Schmidt-Eenboom também se recorda de Lockerbie como um processo político. "Tanto o decorrer como o resultado do processo mostraram claramente que houve negociações por trás dos panos que não eram destinadas à busca da verdade e sim a permitir uma melhor solução política para ambos os lados."

Schmidt- Eenboom acredita que, após o atentado, os EUA viram uma chance de finalmente conseguir se livrar do então ditador líbio Muamar Kadafi. Segundo ele, o então presidente dos EUA, George Bush, procurava motivos para derrubar o regime líbio, no mais tardar após o atentado contra a discoteca berlinense La Belle, frequentada principalmente por soldados americanos.

Hans Köchler foi observador do processo, enviado pela ONUFoto: cc-by-sa/Köchler

O regime líbio sabia disso e procurava meios de escapar. Enquanto a comunidade internacional intensificava as sanções políticas e econômicas contra a Líbia, Kadafi ofereceu entregar agentes de inteligência suspeitos a um tribunal escocês. A única condição é que o processo ocorresse em campo neutro. Por isso, a escolha por Haia.

Quando Kadafi finalmente entregou os dois agentes, em abril de 1999, ele passou a ser visto pela comunidade internacional não mais como um líder imprevisível, mas como um presidente com quem era possível dialogar. Depois, se mostrou cada vez mais disposto a negociar uma compensação para as famílias das vítimas, caso o Ocidente relaxasse as sanções então impostas ao regime líbio.

Compensação a vítimas

Foi nesse clima que o processo, finalmente, foi realizado. Era quando todos os lados estavam preocupados em botar panos quentes na situação. Até mesmo os únicos condenados receberam sinais de que poderiam contar com uma libertação precoce.

Quando, então, Kadafi assumiu oficialmente a responsabilidade pelo ataque, em 2002 e, mais tarde, pagou 2,5 bilhões dólares às famílias das vítimas, o ditador conseguia novamente voltar ao palco político internacional. "Foi uma manobra tática para ser readmitido na comunidade internacional e ser capaz de fechar novamente negócios de petróleo com o Reino Unido", opina Schmidt-Eenboom.

Abdel Basset Ali al-Megrahi, quando foi preso: processo teve só um condenadoFoto: picture-alliance/dpa

Só restam especulações sobre os verdadeiros mandantes do atentado de Lockerbie. O Irã é sempre mencionado, assim como a Organização para a Libertação Palestina (OLP). Mas 25 anos após Lockerbie, aparentemente não há alguém que queira realmente saber a verdade.

O mundo mudou, as motivações de então já não contam mais hoje em dia. O único condenado foi libertado em 2009 por razões de saúde, e morreu de câncer em 2012. Somente idealistas, como o então observador do processo Hans Köchler, exigem a reabertura do caso. "É necessário, para restaurar a confiança no Estado e na justiça. Porque na Escócia muitos estão convencidos de que o processo não foi legítimo."

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