Presidente celebra melhora nas relações com Congresso e avanço de projetos, mas analistas questionam se período de aparente calmaria é duradouro. Impopularidade, desemprego e escândalos ainda pairam sobre o governo.
Anúncio
Michel Temer completou no último sábado (12/11) 180 dias à frente da Presidência. Para marcar a data, o governo usou a imprensa oficial para elencar medidas tomadas no período. Houve destaques para pontos como a melhoria do diálogo com o Congresso e a implementação de reformas. Nada foi dito sobre a contínua deterioração dos números econômicos e a impopularidade da administração.
Especialistas ouvidos pela DW concordam que os seis meses de governo Temer trouxeram alguma calmaria para as relações com o Congresso. No entanto, eles manifestam dúvidas sobre a capacidade do presidente de aproveitar o momento para avançar ainda mais com as reformas e especulam se a instabilidade política não vai tardar a voltar.
"Está mais calmo em comparação com os últimos meses de Dilma, mas será que isso vai permanecer se a economia continuar a se degradar? Também há a possibilidade de novos escândalos e brigas conforme a disputa de 2018 se aproxima", afirmou o analista Gaspard Estrada, da Sciences Po, de Paris. "O governo não tem apoio junto à opinião pública. Além disso, o PT já foi punido nas eleições municipais. O partido não está mais aí para ser atacado quando as coisas não derem certo.”
Para o cientista político Rolf Rauschenbach, da Universidade de St. Gallen, na Suíça, os últimos meses demonstraram que o governo Temer deve continuar a ser encarado apenas como um período transitório até 2018. "Ele trouxe alguma tranquilidade para o cenário num curto prazo. Mas é ilusório achar que o quadro vai melhorar radicalmente. Ele pode tomar mais medidas e seguir numa direção estável, mas os problemas mais graves vão continuar.”
Popularidade
Apesar da melhoria no trato com o Congresso e o fortalecimento da sua base, o apoio a Temer continua restrito aos salões de Brasília. Um levantamento do instituto Ipsos divulgado no fim de outubro mostrou que 46% dos brasileiros consideram o governo ruim ou péssimo. Apenas 2% afirmaram que ele superou expectativas ao assumir. A impopularidade e episódios como as vaias na abertura dos Jogos Olímpicos e no desfile de 7 de Setembro têm feito Temer evitar aparições públicas.
O tempo do presidente é gasto sobretudo com encontros com deputados e senadores. Tudo com o objetivo de cimentar a base. Nos seus primeiros cinco meses de governo, Temer recebeu em seu gabinete 80 dos 594 membros do Congresso, ou 13,4% do total – algo contrastante com o comportamento de Dilma, que era refratária a esse tipo de agenda.
"Esse governo tem um ativo e um passivo. O ativo é a maioria no Parlamento. Já o passivo é a desconfiança da opinião pública, que só deve piorar se os números econômicos não reagirem. Ele tem a mesma popularidade de Dilma – que perdeu o cargo", afirma Estrada. "Se as coisas não melhorarem, aliados também vão começar a causar problemas e ninguém vai querer estar associado ao Temer quando as eleições de 2018 se aproximarem."
Após seis meses de governo, a maior parte dos índices econômicos segue exibindo um cenário desalentador. A taxa de desemprego continuou a avançar. Chegou a 11,8% no terceiro trimestre, somando 12 milhões de desempregados. A queda da receita e o deficit da Previdência continuam sangrando as contas do governo, que registrou um rombo de 96,6 bilhões de reais até setembro – o maior em 20 anos.
Apesar disso, o governo ainda exibe otimismo. Temer afirmou na semana passada que a taxa de desemprego deve começar a ser atenuada a partir do segundo semestre de 2017. Empresários ainda demonstram confiança de que o governo deve retome logo o crescimento. "Isso parece mais wishful thinking (pensamento positivo) do que alguma coisa baseada na realidade. A tendência é que o cenário mundial fique mais complicado com a vitória de Donald Trump [nos EUA] e isso vai afetar o país”, afirma Estrada.
No plano das reformas, o governo conseguiu avançar alguns projetos, como a PEC do teto de gastos públicos, as mudanças no pré-sal e a revisão da meta fiscal para 2016. A controversa PEC, que vem sendo criticada por diversos setores da sociedade civil, ainda deve ser avaliada pelo plenário do Senado. Já as mudanças no pré-sal ainda aguardam a sanção do presidente.
Outras medidas, como o ambicioso programa de privatizações, seguem lentamente, apesar de anúncios regulares sobre planos na área.
Transparência e eficiência
O discurso também entra em choque com a realidade em temas como a procura por transparência na administração e melhora da eficiência da máquina. Apesar de todas as falas sobre austeridade, o presidente sancionou reajustes para milhares de servidores. O impacto deve ser de cerca de 50 bilhões de reais nos próximos quatro anos. Já gastos sigilosos realizados com cartão corporativo cresceram quase 40% nos primeiros cinco meses de governo.
Mas o calcanhar de Aquiles do governo continua sendo a Lava Jato. Nos seus primeiros dias, quando ainda era interino, o governo Temer foi acossado por escândalos envolvendo aliados próximos do presidente, como o senador Romero Jucá. No momento, nenhuma figura do alto escalão está sendo "fritada”, mas o governo vive a expectativa de potenciais estragos envolvendo vazamentos da delação dos executivos da Odebrecht – que podem atingir Temer diretamente e vários ministros – e os efeitos da prisão do ex-deputado Eduardo Cunha, um antigo aliado do presidente.
Temer ainda enfrenta uma ação no TSE que pede a cassação da sua chapa nas eleições de 2014 por causa de irregularidades na campanha. Na semana passada, o assunto voltou a ganhar destaque graças à divulgação da imagem de um cheque de 1 milhão de reais entregue pela construtora Andrade Gutierrez ao diretório nacional do PMDB como doação para a campanha de Temer. Com tudo isso, os próximos seis meses de governo parecem imprevisíveis.
Os envolvidos na Operação Lava Jato
A operação que investiga um megaesquema de corrupção na Petrobras já acusou mais de 200 pessoas, sendo que metade delas foi condenada. Relembre as principais ações penais da Lava Jato e seus envolvidos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/N. Antoine
Youssef absolvido
Denúncia: Evasão de 124 mil dólares não declarados, lavagem de dinheiro proveniente do tráfico de drogas e tráfico de 700 kg de cocaína.<br/> Resultado: Dois condenados (René Luiz Pereira e Carlos Habib Chater, dono do posto que deu nome à operação), um absolvido em 1ª instância (o doleiro Alberto Youssef, na foto) e um absolvido em 2ª instância (André Catão).<br/> Data: 21 de outubro de 2014.
Foto: cc-by/Valter Campanato/ABr
Primeira condenação de Youssef e Costa
Denúncia: Lavagem de dinheiro e formação de grupo criminoso organizado. Houve desvio de dinheiro público na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por meio de contratos superfaturados.</br> Resultado: Oito condenados (entre eles, Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, na foto) e dois absolvidos.</br> Data: 22 de abril de 2015.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agencia Brasil
Youssef e o dinheiro do mensalão
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Os recursos, que ultrapassam 1 milhão de reais, pertenciam ao ex-deputado federal José Janene, morto em 2010, e eram provenientes do esquema do mensalão.</br> Resultado: Quatro condenados: Alberto Youssef, Carlos Habib Chater, Ediel Viana da Silva (funcionário do Posto da Torre) e Carlos Alberto Pereira da Costa (laranja de Youssef).</br> Data: 6 de maio de 2015.
Foto: Reuters
Cerveró é condenado
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Nestor Cerveró (foto), ex-diretor da área Internacional da Petrobras, comprou um apartamento de luxo no Rio de Janeiro – hoje avaliado em 7,5 milhões de reais – com dinheiro de propina da Petrobras.</br> Resultado: Um condenado.</br> Data: 26 de maio de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
A primeira sentença a empreiteiros
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da construtora Camargo Corrêa com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas pela empresa ultrapassam os 50 milhões de reais.</br> Resultado: Seis condenados (entre eles, Youssef, Costa e três ex-dirigentes da Camargo Corrêa) e três absolvidos.</br> Data: 20 de julho de 2015.
Foto: AFP/Getty Images/Y. Chiba
Próximo alvo: executivos da OAS
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da empreiteira OAS com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas somam quase 30 milhões de reais.</br> Resultado: Sete condenados (Youssef, Costa, na foto, e mais cinco executivos ligados à OAS, entre eles, o presidente, José Aldemário Pinheiro Filho).</br> Data: 5 de agosto de 2015.
Foto: picture-alliance/AP/E. Peres
Novo operador: Fernando Baiano
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo pagamento e recebimento de propina em contratos com a Petrobras. As vantagens indevidas superam 50 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (Nestor Cerveró, em sua segunda condenação, o lobista Fernando Baiano e um ex-consultor da Toyo Setal, Júlio Camargo) e um absolvido (Youssef).</br> Data: 17 de agosto de 2015.
Foto: Reuters/S. Moraes
Um petista e mais dois ex-Petrobras
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. As propinas negociadas chegaram a 40 milhões de reais.</br> Resultado: Dez condenados (entre eles, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, na foto, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, o ex-gerente da estatal Pedro Barusco e Alberto Youssef) e um absolvido (Paulo Roberto Costa).</br> Data: 21 de setembro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/C. Villalba Racines
Primeiro político condenado
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 1 milhão de reais, por meio de contratos de publicidade firmados com a Caixa e o Ministério da Saúde.</br> Resultado: Três condenados: o ex-deputado federal André Vargas (foto), o irmão dele, Leon Vargas, e o publicitário Ricardo Hoffmann.</br> Data: 22 de setembro de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
O segundo político
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 11 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (entre eles, o ex-deputado federal Pedro Corrêa, que chegou a receber propina enquanto era julgado na Ação Penal 470, o mensalão, processo em que também foi condenado) e dois absolvidos.</br> Data: 29 de outubro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
Mais empreiteiras na mira
Denúncia: Lobistas, doleiros, ex-diretores da Petrobras e executivos ligados à construtora Andrade Gutierrez (entre eles, o presidente da empresa, Otávio Marques de Azevedo, na foto) foram denunciados por formação de quadrilha, corrupção, organização criminosa e lavagem de capitais, após envolvimento no esquema da Petrobras.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: Reuters/F. de Holanda TPX Images of the day
Agora, a Odebrecht
Denúncia: Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht – então presidente da empreiteira Odebrecht – é acusado de envolvimento com o esquema de corrupção. A empresa pagava propina, que era repassada a funcionários da Petrobras.</br> Resultado: Foi condenado a 19 anos de prisão por crimes como corrupção e organização criminosa.</br> Data: 8 de março de 2016.
Foto: Reuters/E. Castro-Mendivil/Files
Mais uma vez condenado
Denúncia: O ex-ministro José Dirceu passou a ser réu da Lava Jato enquanto cumpria pena pelo mensalão. Ele e outras 14 pessoas foram denunciadas por vários atos de corrupção dentro da Petrobras.</br> Resultado: Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Outras dez pessoas também foram condenadas.</br> Data: 18 de maio de 2016.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Alves
Outra denúncia contra Odebrecht
Denúncia: Marcelo Odebrecht é reu outra vez, junto a outros executivos do grupo, em processo que investiga irregularidades em oito contratos firmados pela empresa com a Petrobras. Segundo o MPF, as propinas chegaram a 137 milhões de reais.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: picture alliance/ZUMAPRESS.com
Collor acusado de corrupção
Denúncia: O senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) é acusado de cometer crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, tendo recebido pelo menos 3 milhões de reais em propinas de contratos da Petrobras. Em julho, a Polícia Federal fez buscas em suas propriedades e confiscou três carros de luxo.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images
Repasses ao PT
Denúncia: O pecuarista José Carlos Bumlai é acusado de corrupção, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, por fraudes na compra de um navio-sonda pela Petrobras. Em depoimento, confessou ter feito um empréstimo de 12 milhões de reais no Banco Schahin para repassar ao PT. Entre os outros dez réus, estão Cerveró, Vaccari e executivos do Grupo Schahin.</br>Resultado: Denúncia aceita pela Justiça.
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
A denúncia contra Cunha
Denúncia: O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de receber milhões de reais em propina no esquema de corrupção na Petrobas, que teriam sido depositados em contas em seu nome na Suíça. Ele responde pelos crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réu aguarda julgamento.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Mulher de Cunha também é ré
Denúncia: A jornalista Cláudia Cordeiro Cruz, mulher de Eduardo Cunha, é acusada de esconder, em conta secreta no exterior, valores provenientes do esquema criminoso instalado na diretoria internacional da Petrobras. Ela responde pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.<br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; ré aguarda julgamento.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Lula e Delcídio
Denúncia: O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio do Amaral e outras cinco pessoas são acusados de terem tentado atrapalhar as investigações da Lava Jato ao negociar para impedir que o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró assinasse acordo de delação premiada.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam julgamento.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Ex-ministro e senadora denunciados
Denúncia: A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo (foto), são acusados de pedir e receber propina no valor de 1 milhão de reais oriundos da Petrobras. O montante teria sido usado na campanha de Gleisi ao Senado em 2010.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Lula e o tríplex
Denúncia: O ex-presidente Lula é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter supostamente recebido 3,7 milhões de reais em vantagens indevidas da construtora OAS. Parte do montante está relacionada a um tríplex no Guarujá. Também são alvos da ação a mulher do petista, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.<br> Resultado: Denúncia apresentada pelo MPF, aguarda decisão.