Argentina e o controle de preços: desta vez vai funcionar?
Tobias Käufer
18 de fevereiro de 2023
Na tentativa de controlar inflação desenfreada, governo argentino impôs limita aos preços de alguns produtos nos supermercados. Economistas, porém, veem a estratégia com extremo ceticismo.
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Nas prateleiras dos supermercados da Avenida Córdoba, em Buenos Aires, pequenas placas em azul e branco anunciam: precios justos. O aviso integra uma estratégia de impor tetos de preços, por meio da qual o governo do presidente Alberto Fernández tenta conter a inflação e, consequentemente, os constantes aumentos dos preços.
De 1º de fevereiro até 30 de junho, os preços de alguns produtos pré-selecionados de uso diário só podem aumentar 3,2% por mês.
Para se ter uma ideia, em dezembro de 2022 a taxa de inflação na Argentina foi de quase 95% em comparação com o mesmo período no ano anterior. Isso gera consequências dramáticas para a população, pois o custo de vida cresce muito mais rapidamente do que os salários e remunerações.
Publicidade e distorção
Nos táxis, na televisão ou no rádio, o governo argentino tem promovido a estratégia como a solução para a crise econômica. Para supervisionar a ação, ele confia em voluntários de seu partido, que fiscalizam os preços nos supermercados.
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"Este é um programa que visa reduzir a inflação e alcançar a estabilidade dos preços, a fim de restaurar o poder de compra da população", declarou Fernández ao divulgar o programa, em 2022. Com eleições marcadas par outubro, o governo se encontra sob pressão, pois os índices de pobreza crescem, enquanto seu nível de popularidade cai.
Lars-Andre Richter, da Fundação Friedrich Naumann, de Buenos Aires, ligada ao partido liberal alemão FDP, considera a estratégia problemática: "Os controles de preços são geralmente um problema por causa do efeito de distorção do mercado. Na Argentina, o governo quer combater a inflação. Isso é como tentar represar um rio com algumas pedras."
"Oficialmente, a culpa pela alta taxa de inflação está sendo atribuída aos produtores e suas supostas tendências especulativas. Isso é uma clara distorção dos fatos", acrescenta Richter.
A seu ver, a culpa da inflação seria antes do excesso de dinheiro em circulação, já que as máquinas do Banco Central estão imprimindo pesos "praticamente 24 horas por dia". E a própria denominação da propaganda governamental de "preços justos" não passaria da " exaltação moralista de uma política econômica equivocada".
Estratégia prestes a falhar
Nos bairros pobres de Buenos Aires, cujos habitantes vivem em barracos onde falta até mesmo água corrente, o brutal encarecimento dos alimentos e outros artigos básicos causa ainda mais estragos.
Por isso, para o padre "Paco" Oliveira, que se ocupa dos pobres, apesar de boa, a estratégia do governo não basta: "Um preço justo é um acordo com as empresas para que elas não aumentem os preços de certos produtos além do nível acordado. Mas isso está longe de ser suficiente. Os cidadãos precisam receber, pelo seu trabalho, salários acima da inflação."
Agustin Etchebarne, do centro de pesquisas focado em políticas públicas e sem fins lucrativos Libertad y Progreso, também é crítico em relação à medida.
"Controles de preços não têm como funcionar, pois, se um preço é fixado abaixo do do mercado livre, se distorcem os sinais, convidando os produtores a produzirem menos, e os consumidores, a consumirem mais." Portando, a ação pode levar a "gargalos de abastecimento e prateleiras de supermercado vazias".
Uma vez novamente liberados, os preços que mais tendem a subir, segundo o pesquisador, serão os que foram controlados. Assim, ele prevê que a estratégia de preço justo falhará, como tantas outras iniciativas desse tipo aplicadas "em todo o mundo, nos últimos 4 mil anos".
"Na Argentina, temos uma longa tradição de controles fracassados de preços que sempre terminam em distúrbios sociais, chegando até a hiperinflação." Como exemplo, Etchebarne cita o fim do governo de Raúl Alfonsín (1983-1989), primeiro presidente eleito após a ditadura militar argentina.
Dez ex-presidentes latino-americanos que já foram presos
A recente prisão de Pedro Castillo no Peru não é um caso isolado na América Latina. Líderes de outros países da região, como Argentina, Honduras e Panamá também já enfrentaram problemas com a Justiça.
Foto: Renato Pajuelo/AP/picture alliance
Pedro Castillo (Peru)
Pedro Castillo, destituído da presidência do Peru após ter ordenado a dissolução do Parlamento (07/12), foi detido e levado ao presídio de Barbadillo. Às acusações de corrupção que já enfrentava, o Ministério Público acrescentou a do alegado crime de rebelião "por violação da ordem constitucional". O ex-presidente Alberto Fujimori está detido na mesma prisão.
Foto: Renato Pajuelo/AP/picture alliance
Lula (Brasil)
Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, passou 580 dias na prisão entre abril de 2018 e novembro de 2019, após ser condenado por corrupção. Em março de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as duas sentenças por irregularidades processuais cometidas pelo Ministério Público e pelo juiz do caso. Assim, conseguiu disputar a eleição de 2022, na qual derrotou Jair Bolsonaro.
Foto: Reuters/R. Buhrer
Alberto Fujimori (Peru)
Alberto Fuijimori, que governou o Peru entre 1990 e 2000, deu um autogolpe em 1992. Seu governo foi marcado por vários casos de corrupção, e ele cumpre pena de 25 anos de prisão por homicídio qualificado, usurpação de funções, corrupção e espionagem, além de desvio de fundos e peculato.
Foto: Martin Mejia/AP/picture alliance
Ollanta Humala (Peru)
Ollanta Humala (2011-2016) completou seu mandato presidencial no Peru, mas, um ano depois, foi colocado em prisão preventiva. Ele e a esposa estão sendo investigados pelo suposto recebimento ilegal de dinheiro da Odebrecht para a campanha presidencial peruana em 2011. Em abril de 2018, o Tribunal Constitucional do Peru revogou a prisão preventiva, mas o processo continua.
Foto: El Comercio/GDA/ZUMA Press/picture alliance
Jeanine Áñez (Bolívia)
Jeanine Áñez assumiu a presidência interina da Bolívia em 12 de novembro de 2019 como segunda vice-presidente do Senado, dois dias após a renúncia de Evo Morales. Ela foi detida em 13 de março de 2021, e numa decisão polêmica, um tribunal a condenou a 10 anos de prisão pelos crimes de violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição. Ela está presa em La Paz.
Foto: Juan Karita/AP Photo/picture alliance
Otto Pérez Molina (Guatemala)
Um tribunal condenou em 07/12 o ex-presidente Otto Pérez Molina, general aposentado que governou a Guatemala de 2012 a 2015, a 16 anos de prisão por liderar uma rede milionária de fraudes alfandegárias que o obrigou a renunciar em 2015. Pérez havia sido preso em 3 de setembro de 2015 após grandes protestos e está em prisão domiciliar desde novembro de 2021.
Foto: Luis Vargas/AA/picture alliance
Juan Orlando Hernández (Honduras)
O ex-presidente hondurenho Juan Orlando Hernández (2014-2022) foi extraditado para os Estados Unidos em abril de 2022, onde é acusado de conspiração para importar cocaína, posse de metralhadoras e armas pesadas e conspiração para possuir tais armas. Ele está detido na Penitenciária Federal do Condado de Brooklyn e pode pegar prisão perpétua se for condenado.
Foto: Andy Buchanan/AFP
Ricardo Martinelli (Panamá)
Ricardo Martinelli, que governou o Panamá de 2009 a 2014, foi preso em junho de 2017 na Flórida. No ano seguinte, ele foi extraditado pelos EUA para ser julgado em seu país num caso sobre escutas ilegais, do qual foi posteriormente absolvido. O ex-presidente também enfrenta um julgamento por suposta cobrança de propina da brasileira Odebrecht.
Foto: picture-alliance/AP Images/A. Franco
Álvaro Uribe (Colômbia)
Acusado de fraude processual e suborno, o ex-líder colombiano Álvaro Uribe (2002-2010) ficou 67 dias na prisão em 2020 "devido a possíveis riscos de obstrução da Justiça". O Ministério Público, no entanto, anunciou que solicitará o encerramento da investigação, após concluir que não houve crime e que a responsabilidade criminal de Uribe não pode ser comprovada.
Foto: Long Visual Press/LongVisual/ZUMA Press/picture alliance
Carlos Menem (Argentina)
O presidente argentino Carlos Menem (1989-1999) enfrentou diversos processos. Em seu primeiro julgamento, em 2008, ele era acusado de tráfico de armas para o Equador e a Croácia entre 1991 e 1995. Ele passou seis meses em prisão domiciliar preventiva em 2001, e foi solto depois que a Suprema Corte anulou as acusações. Desde 2005 teve imunidade como senador, cargo que ocupou até sua morte em 2021.