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As chamas que saem pela boca

26 de agosto de 2019

O fogo do caos político que os populistas e ultradireitistas acenderam pelo mundo pode fazer com que eles acabem queimando a si mesmos. No Brasil, as chamas que destroem a Amazônia já chegaram ao Planalto.

Queimada na Chapada dos Guimarães, Mato Grosso, em 14 de agosto de 2019
Queimada na Chapada dos Guimarães, Mato Grosso, em 14 de agosto de 2019Foto: picture-alliance/dpa/ICMBio/Christian Niel Berlinck

Caros brasileiros,

eles se vendem como patriotas. Como religiosos, incorruptíveis e fortes. Estou falando de políticos populistas da extrema direita que não têm papas na língua. Abrem tanto a boca que depois mal conseguem dar conta das frases envenenadas e ignorantes que saíram dela. As consequências são drásticas: vão do soluço político até a morte política por asfixia.

Além do presidente Jair Bolsonaro, o ministro do Interior e vice-primeiro-ministro italiano, Matteo Salvini, é um dos mais recente exemplos desse tipo de comportamento. Ele rompeu com o movimento Movimento Cinco Estrelas (M5S) e causou uma crise de governo na Itália. O objetivo de Salvini são eleições antecipadas. Ele conta com com uma grande aprovação nas urnas e pretende aumentar seu poder.

Mas esse plano pode não dar certo. O presidente italiano, Sergio Mattarella, em vez de convocar novas eleições, determinou que o M5S tentasse formar uma nova base de governo com outros partidos no Parlamento. Um novo pleito também não garantiria a vitória de Salvini, que está perdendo apoio nas pesquisas.

Outro exemplo é a crise de governo recente na Áustria. Devido a um escândalo de corrupção, o então vice-chanceler federal, Heinz-Christian Strache, teve que renunciar em maio. O político do populista e ultradireitista Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ) governava junto com os conservadores.

No Reino Unido, o premiê Boris Johnson causa grandes temores apostando num Brexit sem acordo. Com medo do caos político e econômico, muitas empresas já transferiram suas filiais para a Europa continental. E os escoceses ameaçaram realizar um novo referendo sobre sua independência.

Será que Johnson será o último premiê do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte? Se, depois do Brexit, os escoceses decidirem mesmo por sua independência, a grande Grã-Bretanha passaria a ser minúscula.

Britain first, America first, Brasil acima de tudo – me parece que todas essas frases vazias, mais cedo ou mais tarde, tendem a se voltar contra o próprio país ou o próprio governo. Será que o presidente Donald Trump confunde o "America first" com Trump first?

Ainda na sexta-feira passada, em sua conta no Twitter, Trump disse que os Estados Unidos não precisavam da China. Para o espanto de seus próprios aliados, ordenou que as empresas americanas saíssem da China  e voltassem a produzir no mercado americano. 

"Britain first, America first": Boris Johnson e Donald Trump no G7Foto: imago images/i Images

Na cúpula do G7 na França, Trump mudou de ideia, dizendo que não tinha a intenção de exigir que empresas americanas saíssem da China. Ficou evidente: se celulares, televisões, roupas e sapatos ficarem bem mais caros devido a taxas ou maiores custos de produção, eleitores desiludidos poderiam atrapalhar a reeleição de Trump em 2020.

De repente, o autoproclamado patriota se revelou antipatriota ao colocar a própria carreira politica acima de tudo. O risco de uma guerra comercial contra a China, que pode desacelerar não somente a economia americana, mas afetar a economia global, é minimizado até passar a ameaçar um possível segundo mandato. Que revelação maquiavélica!

Parece que esse estilo errático e barulhento de governar está chegado à sua fase da autodestruição. As mentiras, o ódio, a ignorância e as ofensas são como as queimadas na Amazônia, que primeiro são estimuladas, depois minimizadas, e por fim se tornam incontroláveis.

O fogo do caos político que os populistas e ultradireitistas acenderam produz tantas chamas e fumaça que eles podem acabar queimando a si mesmos. No Brasil, as chamas que destroem a Amazônia já chegaram ao Congresso, ao Planalto, às ruas e ao agronegócio.

O governo Bolsonaro, que sempre diz que a "Amazônia é nossa", terá que assumir que a "Amazônia queimada é nossa" também. Provavelmente, ele não verá o acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia entrar em vigor, pois a ratificação desse pacto pode se dissolver nas chamas que consomem a Amazônia, assim como a aprovação de seu governo.

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