Frases curtas, termos simples e imagens acessíveis: presidente repete na Casa Branca estratégia que o levou a vencer a eleição. Sua fala, seja no palanque ou no Twitter, chega ao público diretamente e sem filtro.
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A linguagem revela muito sobre o caráter de uma pessoa. O mesmo vale para um político como Donald Trump. A linguista americana Elisabeth Wehling, da Universidade de Berkeley, virou a noite em seu escritório na Califórnia, no primeiro discurso do presidente dos Estados Unidos no Congresso: para alguém que pesquisa a linguagem da política, era hora de trabalho.
O estilo retórico de Trump é um tema apaixonante para ela, e diariamente o político fornece novo material de análise. Enquanto a mídia estava em polvorosa com o estilo do novo presidente, Wehling escutava com toda atenção. E não encontrou nada de novo, em termos de conteúdo.
Apenas a apresentação é diferente. "Nota-se, claro, que o discurso havia sido redigido. Não é por acaso que se divulgou um vídeo em que Trump é visto ensaiando", afirma.
Esse tipo de teste é comum antes de declarações importantes, mas não para o ex-magnata imobiliário: até agora, o 45º presidente dispensava o teleponto e textos ensaiados, falando espontaneamente e sem censura.
Elisabeth Wehling ouve outro tom, mas detecta a mesma mensagem. "As imagens dele continuam sendo muito intensas, representativas de sua mentalidade ultraconservadora": sangue, guerra e a viúva de um soldado são símbolos com que Trump procura emocionar.
Comunicação pelo Twitter
Donald Trump sabe o efeito que suas palavras têm, e o aplica com precisão, não só em discursos, mas também nos tuítes. Para Wehling, é tudo planejado: tuitar para desviar a atenção da própria política.
Ao mesmo tempo, ele gera imagens mentais que chegam até os leitores diretamente e sem filtro. E aí, como quem não quer nada, Trump pergunta a opinião deles. "Ele escreve um tuíte, joga no ar uma tese crassa e fica vendo como as pessoas reagem."
Os fãs compartilham os tuítes, repetindo, assim, essas imagens verbais. Mas o perigo é quando os adversários copiam esse comportamento, escrevendo sobre "notícias falsas" e repetindo as assertivas do político.
"Donald Trump é um empresário experiente, ele sabe como fazer suas ideias 'pegarem'", diz Wehling. Portanto, afirma, é um grande erro da imprensa condenar as ideias dele, mas, mesmo assim, divulgá-las.
Forma diferente, conteúdo igual
Trump visa despertar emoções no público com sua linguagem. Outra linguista americana, Jean K. Gordon, comparou as palavras nos discursos do atual presidente às dos democratas Bill Clinton e Barack Obama, e descobriu que as falas de Trump concentram o maior número de conceitos negativos.
O discurso no Congresso, porém, foi bem mais positivo, indicando uma nova estratégia dele e de sua equipe.
Os tuítes e discursos espontâneos do chefe de Estado republicano são confiáveis para os apoiadores dele. Ele emprega frases curtas, palavras simples e imagens acessíveis. Essa também foi sua estratégia antes das eleições – e ele venceu. Agora, é criticado por isso.
"O discurso de Trump no memorial em Langley e sua apresentação no National Prayer Breakfast foram catastróficos", exemplifica Theresa Heyd, linguista da Universidade Duisburg-Essen.
Mas recentemente ele mostrou que sabe ser diferente: depois de um comportamento agressivo e incontrolado, apresenta-se tranquilo e bem disciplinado. Elisabeth Wehling, no entanto, considera exagerada a euforia em torno do novo tom de Trump:
"Tanto faz como tanto fez, se ele fala com grosseria ou calmo: o que realmente importa são os conteúdos, e eles permaneceram iguais."
Os decretos de Donald Trump
Donald Trump estremeceu o cenário político em seus primeiros dias como presidente dos EUA com uma série de decretos e memorandos impactantes. Entenda a diferença e o significado de cada um deles.
Foto: picture-alliance/dpa/Sachs
Forma rápida de cumprir promessas eleitorais
Com menos de duas semanas na presidência, Donald Trump emitiu 17 medidas executivas. Embora este número em si não seja significativo – no mesmo período Barack Obama assinou praticamente o mesmo número de ordens – o conteúdo dos decretos de Trump é. Parece que o novo presidente dos EUA quer implementar muitas de suas promessas de campanha – incluindo as controversas - o mais rápido possível.
Foto: Reuters/K. Lamarque
O que são ordens executivas e memorandos?
As ações executivas (EA) permitem que o presidente dos EUA dê ordens que não precisam de aprovação do Congresso a agências governamentais, contornando o processo legislativo e acelerando sua implementação. Ordens executivas são uma forma mais abrangente de EA que muitas vezes lidam com diretrizes organizacionais maiores, enquanto memorandos presidenciais ordenam agências específicas a fazer algo.
Foto: picture-alliance/CNP/A. Harrer
Enfraquecer Obamacare (ordem executiva)
A primeira ordem executiva assinada por Trump foi uma para retardar partes do Affordable Care Act (Obamacare) para "minimizar encargos regulatórios". Enquanto Trump sozinho não pode revogar a legislação instituída por Obama, ele pode minar a implementação do programa de saúde enquanto a maioria republicana no Congresso se prepara para revogá-lo.
Foto: Reuters/J. Rinaldi
Retirar subsídio para aborto (memorando)
Trump reinstituiu uma política que impede o financiamento federal para ONGs que fornecem aconselhamento sobre aborto e defendem o direito ao aborto. Essa diretriz tem uma longa história: foi inicialmente instaurada pelo republicano Ronald Reagan, rescindida pelo democrata Bill Clinton, reinstituída pelo republicano George W. Bush, antes de ser reativada pelo democrata Barack Obama.
Foto: REUTERS/A. P. Bernstein
Deportação de imigrantes (ordem executiva)
Trump ordenou que os agentes de imigração expandissem o escopo das deportações. Ele visa retirar concessões federais das chamadas cidades-santuário (onde imigrantes sem documentos não são processados) e que imigrantes suspeitos de um crime sejam detidos, mesmo sem acusação. Trump pretende contratar 10 mil novos agentes e publicar um relatório sobre crimes cometidos por imigrantes sem documentação.
Foto: picture alliance/AP Images/G. Bull
Construir o muro (ordem executiva)
Numa ordem executiva assinada em 25 de janeiro, Trump solicitou "a construção imediata de um muro físico", a fim de proteger a fronteira entre México e EUA. Ele também se referiu aos imigrantes sem documentos como "deportáveis", dizendo que o Poder Executivo deve "acabar com o abuso das disposições de liberdade condicional e refúgio usadas para impedir a remoção legal de estrangeiros deportáveis."
Foto: Getty Images/AFP/S. Huffaker
Veto a muçulmanos (ordem executiva)
Trump assinou este controverso decreto em 27 de janeiro. Ele proibiu pessoas de sete países de maioria muçulmana de entrar nos EUA por três meses, suspendeu indefinidamente o programa de refugiados sírios e suspendeu a admissão de refugiados por 120 dias. Protestos contra a ordem estouraram em todo o país e até mesmo os senadores republicanos John McCain e Lindsey Graham criticaram a medida.
Foto: DW/M. Shwayder
EUA deixam TPP (memorando)
Não foi nenhuma surpresa Donald Trump ter abandonado a Parceria Transpacífico (TPP). Durante a campanha, ele criticou frequentemente o TPP e a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), afirmando que outros países se beneficiaram desses acordos comerciais, em detrimento dos EUA. O porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, disse que Trump prefere lidar individualmente com os países.
Foto: Getty Images/AFP/
Sinal verde para oleodutos (memorando)
Três memorandos diferentes – um sobre a construção do oleoduto Dakota Access, outro sobre a continuação da construção do oleoduto Keystone e uma terceira ordem sobre o uso de materiais americanos nas obras – foram emitidos no quarto dia de Trump no governo. Obama tinha negado licenças para ambos os oleodutos após protestos em massa de ambientalistas, que temem o impacto de eventuais vazamentos.
Foto: REUTERS/S. Keith
Expandir as Forças Armadas (memorando)
Trump cumpriu sua promessa eleitoral de investir num Exército maior ao assinar na sua primeira semana no cargo um memorando que pede mais tropas, navios de guerra e um arsenal nuclear modernizado. Quatro dias antes ele ordenou congelar a contratação de civis em agências federais por até 90 dias, para que seu governo possa desenvolver um plano de longo prazo para encolher a força de trabalho.
Foto: Reuters/K. Pempel
Steve Bannon no NSC (memorando)
Trump ordenou uma revisão do Conselho de Segurança Nacional (NSC) para elevar o papel de Stephen Bannon. Trump retirou vários membros do painel responsável por tomar decisões de política externa, enquanto seu estrategista-chefe – conhecido por opiniões de extrema direita – servirá no comitê geralmente preenchido por generais. Isso rompe com a norma de longa data de não nomear políticos para o NSC.
Foto: pciture-alliance/AP Photo/E. Vucci
Desregulamentações (executiva e memorando)
Trump quer que agências federais eliminem ao menos duas normas para cada nova regulamentação e ordenou o congelamento de regulamentações federais, até que um chefe de departamento designado por ele possa revisá-las. Ele também pediu pela rápida aprovação de "projetos de infraestrutura de alta prioridade". Na campanha, Trump disse que o "excesso de regulamentações" feriu o comércio americano.
Foto: Getty Images/AFP/M. Ralston
Precedente presidencial
Obama emitiu um total de 277 ordens executivas – uma média de quase três por mês e um pouco menos do que seu antecessor, George W. Bush (291). Obama assinou 644 memorando presidenciais para contornar imposições no Congresso – um precedente do qual Trump aparenta estar tirando proveito, embora a maioria em ambas as Casas do Congresso seja republicana.