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As histórias de "terror" de inquilinos despejados

Kate Brady ca
30 de novembro de 2017

Enquanto crise de moradia se acirra na Alemanha, senhorios despejam locatários com o intuito de aumentar valor dos aluguéis. Projeto de coletivo alemão de artistas tem proprietários inescrupulosos como alvo.

Mão com telefone sai da terra diante de túmulo
"Senhorio perseguido": coletivo preparou "telefonemas do além" a proprietários desonestosFoto: L. Bösch

"Neste outono, os locatários despejados estão voltando para amaldiçoar aqueles que os puseram na rua", narra uma estranha gravação intitulada Senhorio perseguido: a volta dos inquilinos despejados.

Lançado nesta semana pelo coletivo de artistas Peng!, o projeto Haunted Landlord (Senhorio perseguido) procura se vingar de locadores inescrupulosos que despejaram pessoas de suas casas em Berlim, Leipzig e Frankfurt, recorrendo a diferentes meios de pressão e assédio.

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Visitas espontâneas por parte do proprietário, ameaças, desligamento da água e aquecimento, remoção de chuveiros e vasos sanitários, lâmpadas desenroscadas nas escadas e instalação de câmeras de segurança: esses são apenas alguns dos métodos utilizados pelos senhorios nos 38 depoimentos coletados nas últimas semanas pelo Peng!.

Num dos casos, o proprietário jogou pessoalmente o aviso de despejo na caixa de correio do locatário na noite de Natal. E, em Leipzig, inquilinos informaram ter recebido chamadas telefônicas em horas totalmente inadequadas.

Despejar locatários para alugar ou vender imóveis por um preço mais alto está se tornando um negócio lucrativo, particularmente na capital alemã, onde bairros muito procurados, como Prenzlauerberg, Kreuzberg e Friedrichshain, sofreram grandes transformações após anos de gentrificação.

Nesta semana, os telefones particulares e empresariais dos proprietários estão tocando cerca de 20 vezes por dia através de chamadas automatizadas. Gravado por atores, o texto de cada telefonema reconta a experiência de um inquilino despejado indevidamente.

"Espero que você tenha a consciência pesada por ter usado os seus pais para retirar o apartamento de pessoas necessitadas", diz uma voz no outro lado da linha. "Você mentiu para nós e nos colocou sob pressão para nos expulsar de seu apartamento. Meses depois, nós o vimos num portal de aluguel de imóveis. O preço mais do que duplicou!"

Outro antigo inquilino lembra: "Você não comprou nenhum óleo de aquecimento e saiu de férias. Você deixou os seus inquilinos sem aquecimento por sete semanas durante o inverno."

Berlim foi particularmente afetada com aumento de aluguéisFoto: picture-alliance/R. Schlesinger

85% dos alemães vivem de aluguel

"Muitas dessas histórias passam despercebidas. Os responsáveis podem simplesmente ignorar a situação e ficar ricos, enquanto os despejados são deixados à própria sorte com sua raiva e falta de habitação", disse à DW Nora Moll, porta-voz do Peng!. 

Na página de internet do projeto Haunted Landlord, o coletivo convida pessoas com histórias semelhantes a se apresentar e compartilhá-las.

O coletivo de artistas diz também que visa contribuir para o debate político sobre habitação na Alemanha, onde 85% da população vive de aluguel – mais do que em qualquer outro país da União Europeia.

Atualmente, a Alemanha está sendo tomada por uma crise habitacional cada vez pior. O Grupo Federal de Trabalho para Pessoas Sem Moradia (BAG W) estimou, no início de novembro, que 1,2 milhão de pessoas podem estar vivendo em abrigos em 2018.

"A principal causa de escassez de moradias é uma política de habitação que fracassou durante décadas na Alemanha, além de esforços insuficientes para combater a pobreza", disse Thomas Specht, diretor da associação.

Lacunas na legislação para conter aumento de aluguéis

Em 2015, numa tentativa de conter o aumento das locações, o governo alemão introduziu o chamado "freio" no preço dos aluguéis (Mietpreisbremse). A medida visava impedir que proprietários cobrassem mais de 10% acima de um valor médio por metro quadrado estabelecido por um organismo regulatório para cada distrito da cidade.

Dois anos depois, a eficácia do "freio de aluguel" ainda está sendo questionada pelos críticos. Um deles é Johannes Fechner, deputado social-democrata no Parlamento alemão.

As negociações para a formação de um governo em Berlim após as eleições legislativas de setembro continuam. E a política habitacional pode vir a ser um ponto de discórdia entre os potenciais parceiros na repentina possibilidade de uma nova coalizão entre a conservadora União CDU/CSU, liderada pela chanceler federal Angela Merkel, e o Partido Social-Democrata (SPD).

85% dos alemães vivem de aluguelFoto: picture alliance/dpa/A. Warnecke

Fechner afirmou que mais habitações e uma ampliação do "freio dos aluguéis" podem ser peças-chave no próximo período legislativo para enfrentar a escassez de moradias e os aumentos para os inquilinos.

"As regras do 'freio' no preço das locações também precisam ser endurecidas para incluir limites no tanto que os proprietários podem aumentar os aluguéis após reformar a propriedade", disse Fechner à DW.

Recorde de aumento nos aluguéis

De acordo com o grupo alemão de pesquisa imobiliária F+B, na Alemanha, novos aluguéis aumentaram em média 17% nos últimos dez anos, e Berlim foi particularmente afetada.

O índice de aluguel da capital alemã de 2017 mostra que em média o chamado Kaltmiete ou "aluguel frio" – sem os custos, entre outros, de água e calefação – está aumentando 4,6% ao ano. O preço médio do metro quadrado é agora de 6,39 euros (por volta de 24,60 reais).

Moll, ativista do Peng!, afirma que a habitação ameaça se tornar uma mercadoria na Alemanha devido à escassez de propriedades e aos crescentes aluguéis estimulados pela gentrificação.

"Enquanto o problema da habitação for deixado para o 'livre mercado', o aluguel e o despejo continuarão a ser regra e um meio comum de maximizar os lucros", disse a ativista. "Precisamos de uma política urbana e de habitação e que puna a repressão, tornando-a não lucrativa em vez de recompensadora."

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