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História

As sombras do colonialismo alemão

22 de junho de 2020

Por um breve período, a Alemanha chegou a manter um dos maiores impérios coloniais do mundo. No contexto dos protestos antirracistas globais, esse cruel passado e seus protagonistas também ocupam o banco dos réus.

Funcionários coloniais alemães no Togo sentados em mesa e africanos em pé atrás
Funcionários coloniais alemães no TogoFoto: picture-alliance/akg-images

A estátua do mercador de escravos Edward Colston é atirada no porto de Bristol; em Boston, a de Cristóvão Colombo é decapitada; precavendo-se de uma destruição, os próprios governantes da Antuérpia removem uma escultura do rei Leopoldo 2º, responsabilizado pelas piores atrocidades em sua "colônia particular" do Congo.

Atualmente, símbolos coloniais são visados em todo o mundo como expressão de racismo branco. Por longos anos, ninguém se interessou por eles, mas a coisa mudou, o mais tardar, com a violenta morte do afro-americano George Floyd, por um policial branco em Minneapolis.

A Alemanha tem apenas uma breve história colonial, de 1884 ao fim da Primeira Guerra Mundial, quando teve que abrir mão de suas colônias na África, Oceania e Ásia Oriental. No entanto, em seu auge, o império colonial alemão era o quarto maior do mundo, e deixa vestígios até hoje.

Ruas e praças do país continuam ostentando os nomes de colonizadores como Carl Peters, Adolf Lüderitz ou Gustav Nachtigal. Até poucos anos atrás, o comandante das forças de proteção da África Oriental Alemã, Paul von Lettow-Vorbeck, dava nome a casernas e escolas.

Continua sendo mantida em Bad Lauterberg im Harz, Baixa Saxônia, uma estátua de Hermann von Wissmann, um dos governadores da colônia; assim como em Stendal, na Saxônia-Anhalt, está um busto de Nachtigal, que foi comissário imperial da África Ocidental Alemã.

A discussão sobre como encarar o passado colonial está a pleno vapor: o que se deve fazer com as estátuas, os nomes de ruas e a arte colonial saqueada que hoje estão em museus? A Alemanha deve se desculpar e pagar reparações por crimes coloniais, como a repressão brutal do levante dos hereros e dos nama no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia), ou dos maji-maji na África Oriental, somando centenas de milhares de mortos? Todas essas são sombras da história colonial alemã, mesmo que já datem de mais de um século.
 

Rua em Berlim ainda leva o nome de LüderitzFoto: DW/D. Pelz

No assim chamado "Bairro Africano" de Berlim, já há anos se discute mudar os nomes de certas ruas. Há mais de dois anos, a assembleia dos deputados locais decidiu rebatizá-las com os nomes de combatentes ao domínio colonial alemão. Contudo, numerosos moradores e comerciantes são contra, em muitos casos sequer por motivos políticos, mas para evitar os custos de uma mudança de endereço. Outros se apegam ao nome antigo por puro hábito.

A Iniciativa Pró-Bairro Africano propôs uma forma criativa de manter os nomes: a rua Lüderitz seria nomeada segundo a cidade homônima na Namíbia; a praça Nachtigal passaria a ser uma homenagem ao teólogo Johann Nachtigal. E desde 1986 a alameda Petersallee não recorda mais o colonialista Carl Peters, que governou com brutalidade na África Oriental, mas sim Hans Peters, membro da resistência contra o nacional-socialismo. Para alguns, assim apenas se contorna o problema. Seja como for, nada é definitivo, e a disputa prossegue.

Em Hamburgo, no terreno da antiga caserna Lettow-Vorbeck, acrescentaram-se placas explicativas aos bustos de homens como Paul von Lettow-Vorbeck e Lothar von Trotha, que participaram decisivamente para esmagar os levantes nas colônia alemãs.

Ainda não está claro que futuro terão os monumentos. Para o Senado da cidade hanseática, a questão fundamental é manter a difícil história nacional também na consciência das gerações futuras: a intenção não é glorificar nem redimir, mas sim manter sinais de advertência e memória.

Mudança em monumentos 

A associação Postkolonial vai mais longe: ativa em cerca de 20 cidades alemãs, em Hamburgo ela se empenha "por uma descolonização abrangente do espaço urbano hamburguês [...] e a apresentação da história da resistência anticolonial, assim como por uma lembrança honrosa às vítimas do colonialismo e racismo", segundo consta de seu website.

Isso inclui renomear ruas, mas a associação não almeja simplesmente apagar todos os vestígios do colonialismo. Christian Kopp, porta-voz da Postkolonial em Berlim, cogita, por exemplo, instaurar antimemoriais: para ele, apenas postar uma placas informativa crítica diante do monumento é definitivamente insuficiente.

Enquanto historiador, Jürgen Zimmerer diz ter "interesse em que monumentos sejam mantidos como fontes históricas". "No entanto, devem ser radicalmente desconstruídos e 'des-heroizados', para neutralizar sua função exaltadora – por exemplo, colocando-os deitados ou de cabeça para baixo."

Prisioneiros hereros após revolta na Namíbia Foto: Bundesarchiv, Bild 146-2003-0005/Unknown/CC-BY-SA 3.0

Um exemplo de cancelamento tácito da realidade histórica é a sepultura de Lothar von Trotha, em Bonn. Com sua "ordem de extermínio", em 1904, ele esmagou cruelmente a revolta das etnias herero e nama, no Sudoeste Africano Alemão.

Alguns historiadores consideram esse o primeiro genocídio do século 20 – algo que o governo alemão até hoje não reconhece oficialmente. Entretanto, no túmulo de Von Trotha não há qualquer referência a esse passado.

No início de junho, o presidente da Namíbia, Hage Geingob, declarou em Windhuk que a Alemanha estaria agora pronta a reconhecer o genocídio e a pedir desculpas, mas do lado alemão não houve confirmação. Até agora a principal justificativa de Berlim para negar reparações tem sido a Namíbia ter se beneficiado de ampla ajuda ao desenvolvimento.

Fatos históricos através da lente atual

No geral, os partidos alemães se mostram abertos a uma abordagem crítica do passado colonial do país. Com uma clara exceção: a populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD).

No contexto da atual discussão sobre os memoriais, o presidente da bancada da sigla populista de direita no parlamento federal, Alexander Gauland, declarou: "Até agora só se conhecia de sistemas totalitários tais tentativas de impor uma imagem histórica limpa de todos os aspectos perturbadores." E o deputado da AfD Gottfried Curio se queixou, em vídeo do que considera tentativas da esquerda de inculcar nos alemães um "culto de culpa com a África".

Mas será válido medir figuras e épocas históricas com os critérios de hoje em dia? A resposta do historiador Jürgen Zimmerer é um decidido "sim", "caso contrário, não podemos nos distanciar de Hitler, Himmler e companhia, nem condená-los". O atual debate, porém, gira em torno de "se essas personalidades históricas se prestam como modelos a ser honrados": "E nesse ponto, nossos critérios atuais são decisivos: nós refletimos em monumentos também nossos próprios valores e percepções."

Até agora, o colonialismo alemão foi uma parte pouco observada da história. Johann Hinrich Claussen, encarregado de cultura da Igreja Luterana da Alemanha, é um dos que estão felizes por a sociedade alemã estar se ocupando do tema através de protestos.

Não é possível comparar a forma da Alemanha de lidar com monumentos às abordagens dos Estados Unidos ou no Reino Unido, admite Claussen. Contudo o colonialismo alemão está finalmente chegando à consciência pública, e aí o teólogo vê uma grande chance educativa.

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