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Fim da República de Weimar

Sonia Phalnikar (ca)29 de janeiro de 2008

Há 75 anos, Hitler assumia o poder e dava fim à República de Weimar. A experiência democrática alemã entre 1919 e 1933 teve verdadeiramente uma chance? O autor e historiador americano Eric Weitz responde.

1933: Hitler subia ao poderFoto: picture-alliance/dpa
Professor Eric D. WeitzFoto: Eric Weitz

Em 30 de janeiro de 1933, Hitler assumia o poder na Alemanha, dando fim à República de Weimar – o experimento democrático alemão entre 1919 e 1933. O período foi batizado por historiadores como "República de Weimar" em homenagem à cidade de Weimar, onde se reuniu a Assembléia Nacional que escreveu e adotou a nova Constituição para o Império Alemão após a derrota na Primeira Guerra Mundial.

Em 2007, Eric Weitz, chefe do departamento de História da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, publicou um livro sobre o período, intitulado Weimar Germany: Promise and Tragedy (A Alemanha de Weimar: Promessa e Tragédia). DW-WORLD.DE conversou com o autor.

DW-WORLD.DE: Uma das premissas de seu livro é que a República de Weimar não deve ser vista simplesmente como um prelúdio para a ditadura nazista, mas como uma era própria.

Eric Weitz: Ela deve ser vista, com certeza, como uma era própria. A República de Weimar foi um período maravilhosamente criativo. Nós não devemos sempre analisar os 14 anos da República de Weimar partindo dos 12 anos do Terceiro Reich porque a República foi um período de grande inovação cultural, política e social. Nós precisamos lembrá-la e valorizá-la separadamente. Cada aspecto da República de Weimar, da vida na Alemanha nos anos de 1920 foi debatido intensamente – tanto no seu alto nível artístico e intelectual como também no nível da política e da sociedade.

Como o senhor explica o florescimento cultural e artístico na Alemanha, e particularmente em Berlim, nos anos de 1920? Afinal de contas, esta era uma nação devastada pela guerra, com milhões de mortos e atormentada pela hiperinflação e pela instabilidade.

Inflação de 1923: dinheiro para queimarFoto: picture-alliance / akg-images

A intensa inovação de Weimar está precisamente relacionada a esses fatores. Muitas pessoas se concentram somente no desespero advindo da Primeira Guerra Mundial. Certamente, havia desespero em abundância. Dois milhões de alemães morreram nessa guerra, quatro milhões ficaram feridos. Os homens que retornaram estavam, em sua maioria, severamente feridos, tanto fisicamente como de forma psíquica.

As mulheres que estiveram no front doméstico durante os anos de guerra vivenciaram quatro anos de intensa privação. E veio então a crise do pós-guerra – reorganização e hiperinflação.

Mas, até certo ponto, aquela intensa instabilidade econômica, social e política alimentou esse profundo engajamento intelectual com questões relativas à vida na era moderna, de como deveria ser a configuração política da Alemanha. Mas, além disso, a revolução de 1918/19 também foi crucial para a efervecência cultural. Esta revolução estabeleceu um sistema democrático, o mais democrático que os alemães haviam vivenciado até aquele momento.

O espírito da revolução criou um sentimento de que o futuro estava aberto, que era de possibilidades ilimitadas e poderia ser moldado de forma mais humanitária. Isso não poderia ter durado muito, mas foi esse sentimento que embasou grande parte da inovação cultural da República.

Mesmo assim, existiam pessoas na Alemanha que odiavam a República de Weimar. Quem eram elas? E por que queriam que ela falhasse se era tão promissora e atraente?

Tudo relacionado à República de Weimar foi contestado. A maior parte do trabalho ou todo o trabalho dos artistas, pensadores e arquitetos que focalizo neste livro foi intensamente desafiado pela direita. Eu quero dizer o establishment de direita – os antigos aristocratas, funcionários de alto escalão, oficiais das Forças Armadas, homens de negócios, banqueiros, pessoas da Igreja que eram, definitivamente, anti-socialistas e anticomunistas, mas também antidemocratas. A revolução de 1918/19 deixou o poder dessas pessoas intacto. Ela estabeleceu uma democracia política, mas não minou, de forma alguma, a situação social e de poder daquela velha elite conservadora.

Essa elite, após a fúria inicial da revolução, desafiou todos os passos da República. Muitos dos pontos de conflito não estavam somente na esfera política, mas também na cultural e social. Havia, por exemplo, as assim chamadas "Guerras dos Telhados de Zehlendorf", nas quais conservadores, arquitetos e críticos – nazistas também – clamavam que os tetos planos da Arquitetura Moderna eram marcadamente não germânicos e que a verdadeira arquitetura germânica tinha tetos pontiagudos. Tais críticos condenaram os tetos planos como forma de arquitetura judaica. A emancipação da mulher nos anos de 1920 e o ativo discurso em torno da satisfação erótica eram outros focos de intenso conflito.

Você diria que a República de Weimar foi uma das primeiras vítimas da globalização? Você acha que ela teria sobrevivido se a crise de 1929 não tivesse acontecido?

Ilustração: Presidente Hindenburg nomeia Hitler chanceler em 1933

A Grande Depressão foi o último golpe. Se observarmos a economia e a eleição de 1928, justamente anterior à Grande Depressão, poderemos ver um retorno para o centro político e sinais de sério progresso econômico. Este é o último dos assim chamados fabulosos anos dourados da República. Sem a depressão, a República teria ao menos tido uma chance. Ela sobreviveu à inquietante e desorientadora hiperinflação de 1923. Mas foi a depressão que se espalhou rapidamente dos Estados Unidos para a Alemanha que deu o golpe final.

Ao mesmo tempo, não devemos esquecer que poucas democracias foram fundadas em situações tão difíceis como a República de Weimar. A República precisava de mais tempo para respirar, precisava de uma atitude mais generosa e indulgente por parte dos aliados ocidentais, precisava de estabilidade econômica e progresso – tudo isso era escasso nos anos após a Primeira Guerra Mundial.

O que levou, finalmente, ao declínio da democracia na República de Weimar? Afinal de contas, nas eleições gerais de 1928, os nazistas contabilizaram somente 2,6% dos votos e, cinco anos depois, Hitler assumia o poder.

Alemães não elegeram Hitler para o poderFoto: AP

É verdade, em 1928 os nazistas eram um grupo marginal, sem importância política e que dispunha de pouca ressonância para além de alguns lugares bastante específicos já em crise antes da Grande Depressão – principalmente regiões agrícolas. Mas, de certa forma, a República estava seriamente fragilizada e o sistema político paralisado antes da tomada de poder pelos nazistas. Numa depressão, as pessoas procuram soluções e a República não oferecia nenhuma para a crise econômica.

A partir dos anos de 1930, a Alemanha foi governada por uma ditadura presidencial, porque o sistema político estava tão fragmentado que o Parlamento não podia se reunir ou funcionar com maioria parlamentar. Assim a partir da primavera de 1930, o chanceler Heinrich Brüning e seus sucessores governaram através de poderes emergenciais proclamados pelo presidente, o marechal-de-campo Paul von Hindenburg.

Mas quero sublinhar o fato de que os nazistas nunca receberam a maioria dos votos numa eleição livre sem contestações. No verão [europeu] de 1932, eles receberam 37,4% dos votos – a mais alta porcentagem que alcançariam. É um salto significante, com certeza, mas não é maioria e a frase comum que se escuta nos Estados Unidos, de que "o povo alemão elegeu Hitler para o poder ou elegeu os nazistas para o poder" – é errada, inexata e não verdadeira.

Os nazistas nunca foram eleitos para o poder. Na eleição seguinte, no outono [europeu] de 1932, eles já haviam perdido uma porcentagem significante do apoio ganho no verão. O Partido Nazista estava bagunçado. No final, eles subiram ao poder porque a elite conservadora, uma clique de homens poderosos em torno do presidente Hindenburg, entregou o poder aos nazistas. Essa aliança foi o que, definitivamente, acabou com a República.

Que lições podem ser tiradas da República de Weimar? No seu livro, está implícita a questão de que se é possível que democracias contemporâneas sucumbam a forças neofascistas da mesma forma que a República de Weimar sucumbiu aos nazistas.

A Alemanha de hoje é um sistema democrático bem estabelecido. Quanto a isso, não tenho nenhuma preocupação. É claro que existem alguns grupos de extrema direita que podem ser perigosos e a reação contra eles algumas vezes é muito lenta. No entanto, esses grupos são bastante marginais e Berlim não é Weimar.

Minhas preocupações são mais com o meu país, os Estados Unidos, no sentido de que as ameaças à democracia nem sempre vêm de fora. O maior perigo vem de dentro. Esse foi certamente o caso em Weimar, especialmente nos seus últimos anos. O que me preocupa é quando algumas pessoas ou instituições falam de democracia, mas, na verdade, esvaziam as práticas democráticas.

É claro que os nazistas nunca estiveram comprometidos com a democracia, mas usavam a retórica populista que encontrava ressonância nas pessoas. Quando esse tipo de retórica mascara práticas não democráticas, então é a hora de nos preocuparmos.

A analogia que realmente me preocupa é quando conservadores do establishment fazem com que conservadores radicais se tornem "aceitáveis pela sociedade". Acredito que, até certo ponto, isso realmente aconteceu nos Estados Unidos.

Quando os conservadores do establishment vão além das fronteiras do discurso democrático legitimado e do acervo constitucional e fazem com que o programa, os indivíduos e as idéias dos conservadores radicais se tornem aceitáveis – é aí que estamos em apuros.

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