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"Aumento de refugiados é realidade nova para o Brasil"

Marina Estarque, de São Paulo12 de outubro de 2015

Solicitações de refúgio cresceram 2.000% nos últimos anos. Em entrevista à DW, presidente do Conare afirma que São Paulo, principal destino dos migrantes no país, terá novo abrigo e anuncia campanha contra xenofobia.

Refugiados têm aulas de português em São Paulo: maioria dos recém-chegados fala árabeFoto: Marina Estarque

Até o fim do ano, São Paulo terá um novo abrigo para refugiados e imigrantes, disse em entrevista à DW Brasil o secretário nacional de Justiça e presidente Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), Beto Vasconcelos.

Em 2014, a prefeitura de São Paulo, em parceria com o Ministério da Justiça, lançou o Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes (Crai). Com capacidade para 110 pessoas, o centro já foi inaugurado com sua lotação máxima. No mesmo semestre, o governo estadual abriu a Casa de Passagem Terra Nova, para 50 pessoas.

A oferta é pequena, considerando o aumento da demanda. Em 2014, a cidade foi a principal porta de entrada de refugiados na America Latina, em número de pedidos de asilo. No Brasil, entre 2010 e 2014, as solicitações de refúgio aumentaram 2.131%. Atualmente, são 8.530 refugiados no país – a maioria vinda da Síria (2.097).

Em 2013, o Conare emitiu uma norma permitindo a concessão de vistos especiais para pessoas afetadas pelo conflito na Síria. Em setembro, o conselho optou por prorrogar a resolução por dois anos. Nesse período, o Brasil concedeu quase 8 mil vistos do tipo.

DW Brasil: Na semana passada, o Conare assinou um acordo de cooperação com a Agência da ONU para Refugiados (Acnur) para melhorar a emissão de vistos especiais para sírios nos consulados e embaixadas brasileiras em Turquia, Líbano e Jordânia. Qual é a importância do acordo?

Beto Vasconcelos: A parceria tem por escopo a transferência de conhecimento e experiência do Acnur para as nossas unidades consulares e embaixadas. É uma capacitação sobre como lidar com o tema do refúgio diretamente com pessoas afetadas pelo conflito. Um auxílio no processamento, identificação e documentação dessas pessoas. Também prevê troca de informação sobre casos em que parte da família já esteja no Brasil e casos sensíveis ou urgentes.

O Brasil é elogiado por essa política de "portas abertas", mas criticado pela falta de estrutura para receber refugiados. Faltam abrigos e cursos de português, há uma lentidão em emitir documentos, entre outros problemas. Que ações estão previstas para melhorar essa situação?

Beto Vasconcelos: "Brasil tem legislação moderna que garante vários direitos aos refugiados"Foto: Conare

O Brasil tem uma legislação moderna que garante vários direitos aos refugiados, como acesso universal ao sistema público de educação e de saúde. Sobre abrigo, assistência jurídica, social e psicológica, nós temos parcerias importantes com entidades públicas, como a prefeitura de São Paulo, que tem o Crai (Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes), por exemplo. E temos parcerias com entidades da sociedade civil, como a Caritas, que oferecem inclusive auxilio financeiro para refugiados em casos mais sensíveis.

O senhor mencionou o Crai, mas o centro já inaugurou lotado. Tem alguma previsão de novos abrigos no município?

Nós estamos concluindo a abertura de uma nova unidade em São Paulo, que vai fazer parte do Crai, com mais 150 vagas para imigrantes e refugiados, ainda neste semestre.

Os refugiados reclamam que a concessão do pedido de asilo demora mais de um ano...

Acho importante destacar que o aumento do número de solicitantes e de refugiados é uma realidade nova para o Brasil. É um reflexo da crise humanitária que o mundo tem vivido. Então nós temos que ampliar sim a rede pública e a rede de parceria com a sociedade civil, para cada vez acolher melhor.

Quanto ao processo de refúgio, nos últimos meses nós implementamos um plano de fortalecimento do Conare, que deve ser concluído no início do ano que vem. Isso vai aumentar fortemente a nossa capacidade de resposta a esse aumento de solicitações. Já abrimos atendimento descentralizado no Rio, em São Paulo e Porto Alegre. Estamos monitorando a implementação, mas essas unidades estão em funcionamento desde setembro. E, em Brasília, abrimos também uma unidade de videoconferência. Tudo isso vai aumentar a nossa capilaridade nas entrevistas e acelerar os julgamentos.

E a falta de cursos de português?

Nós já temos medidas implementadas, mas estamos estudando a ampliação da oferta de aulas de português com o Ministério da Educação e teremos uma resposta ainda neste semestre. Esse novo perfil de refugiados é de uma língua muito distante do português, como o árabe, no caso dos sírios.

Outra reclamação comum é impossibilidade de validar diplomas, o que acaba dificultando a entrada dos refugiados no mercado de trabalho. Como resolver isso?

É uma questão complexa, cada universidade tem uma política própria de validação de diploma. Há um dispositivo constitucional que garante a autonomia universitária.

Então acaba dependendo da iniciativa da universidade?

Sim, é verdade. Mas nós temos estimulado, principalmente no atual momento em que há uma maior sensibilidade para o tema. E eu tenho visto cada vez mais universidades inovando nesse sentido.

Em janeiro, o Ministério da Justiça fez um acordo com o Acnur para melhorar a situação do Conector no aeroporto de Guarulhos, onde vários solicitantes de refúgio e imigrantes ficaram retidos em condições desumanas. Em junho, essa situação ainda não havia mudado. Houve algum avanço?

Sim. De junho para cá, nós fizemos reuniões de trabalho com o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública da União e com a Secretaria Nacional de Justiça e o Conare, bem como a Policia Federal. E criamos procedimentos para evitar qualquer problema em relação aos solicitantes de refúgio. Agora o departamento da Polícia Federal tem expedido os formulários para que os solicitantes possam rapidamente preencher, encaminhar a solicitação e se locomover pelo país. Então esse problema foi equacionado.

Nesta terça-feira (13/10), o Conare vai lançar uma campanha contra a xenofobia. Houve um aumento do número de casos?

Não tenho medida para dizer se aumentou ou diminuiu. O que nos motiva a fazer essas campanhas é informar, porque nós acreditamos que isso diminui comportamentos xenófobos ou preconceituosos. Primeiro lançamos uma campanha de sensibilização sobre o refúgio, explicamos quem são essas pessoas e por que elas deixam seus países. Agora nós vamos entrar em uma segunda fase, com uma campanha contra a xenofobia, o preconceito, o ódio e o racismo, que fala sobre a nossa identidade brasileira, construída por fluxos migratórios.

Nós estamos em um momento de corte de gastos. Na sexta-feira saiu um anúncio no Diário Oficial de um crédito extraordinário de 15 milhões de reais para a política de assistência a refugiados. Como o ajuste fiscal afetou o Conare?

Nós não tivemos cortes, pelo contrário, tivemos ampliação orçamentária. Temos conseguido manter e até ampliar várias medidas e o nosso espaço.

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