Em seu anonimato, as igrejas e capelas de autoestrada da Alemanha fornecem a viajantes e moradores um oásis de paz para a reflexão. Essa congregação virtual já reúne 1 milhão de fiéis, estendendo-se à Áustria e Suíça.
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"Amado Deus, por favor, dá a meu pai força para morrer e protege o meu filho no Afeganistão."
"Que todos os que sofrem de câncer tenham Deus a seu lado."
"Obrigado por este homem ao meu lado."
São preces dirigidas aos céus: gratidão e depressão, enfermidades, catástrofe, carreira. Nos livros de votos encontrados em todas as igrejas de autoestrada da Alemanha (autobahnkirchen), está espelhada a alma do país. Seus frequentadores buscam uma pausa do estresse rodoviário, se afastam por alguns minutos das artérias de trânsito, em pulsação incessante, que atravessam o país. Eles são integrantes de uma congregação crescente: os frequentadores anônimos das igrejas de autoestrada.
"A igreja, para mim, é como uma tenda, um espaço protegido onde, em princípio, nada pode me acontecer", diz Katharina Schulz [nome alterado], após visitar a Autobahnkirche Siegerland, no estado da Renânia do Norte-Vestfália. "Eu venho aqui quando tenho preocupações."
O sexagenário Gerhard Sauer, da cidade vizinha de Neunkirchen, aprecia o culto noturno semanal: "Já vim várias vezes aqui sozinho, para refletir. Mas os cultos breves tocam fundo, são sempre cheios de emoção."
Inaugurada em 2013 na autoestrada A-45, a igreja de Siegerland oferece um oásis de tranquilidade em meio ao ruído de fundo permanente dos pneus em movimento. Por lá passam cerca de 2 mil frequentadores a cada mês, e já encheram 11 livros de votos com seus desejos, orações e prestações de graças.
As anotações revelam uma Alemanha sem ódio. "As pessoas registram ali suas apreensões e gratidão, não tanto a sua cólera", afirma Ute Pohl, presidente da Associação de Amigos da igreja Siegerland. Muitos partilham dos pensamentos e preces expressas nas notas, à vezes até mesmo acrescentando seu próprio ponto de vista.
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Também Alessia tem esperanças de que suas súplicas sejam escutadas, sobretudo pelo namorado que a abandonou. Ela vem regularmente à Autobahnkapelle Sankt Raphael, na parada rodoviária de Nievenheim, nas proximidades de Colônia, para expor seu mal de amor.
Sob os olhos do arcanjo Rafael, a jovem derrama o coração no livro de votos aberto num pedestal no canto direito da autobahnkapelle: "Querido Deus, na verdade eu gostaria de chegar com pensamentos positivos, quando venho aqui. Por favor, devolva ao Stefan a fé no nosso relacionamento."
Também na Autobahnkirche Siegerland ocorre esse tipo de diálogo entre casais. Ute Pohl conhece o fenômeno. "As pessoas que fazem esse tipo de anotação estão esperando uma resposta", explica, acrescentando, com um risinho: "Se isso acontecer aqui na igreja, esperemos que o Espírito Santo conceda sua influência positiva."
A congregação de frequentadores das igrejas e capelas de autoestrada aumenta: todos os anos cerca de 1 milhão de fiéis aproveitam essa pausa no asfalto. A primeira casa de culto do gênero da Alemanha foi inaugurada já em 1958, na A-8, em Adelsried, no estado da Baviera. Hoje elas já são 47 no país, e nesse ínterim também foram abertas outras na Áustria e na Suíça.
O crescimento parte da base, pois não há uma central de planejamento das autobahnkirchen. Como no caso da de Siegerland, quem constrói as capelas por conta própria costumam ser particulares, associações ou paróquias locais.
Ao contrário dos templos tradicionais, os frequentadores em geral não permanecem mais do que cinco ou dez minutos, como constatou um estudo do centro de pesquisa social eclesiástica da Faculdade Católica de Freiburg. A maioria está registrada como membro da Igreja, tem mais de 50 anos de idade, é do sexo masculino, casado e vive na Alemanha.
O anonimato da autoestrada é um atrativo. Segundo o estudo, quem para uma vez numa das igrejas tende a retornar na próxima viagem. A maioria em geral não se incomoda de só raramente haver um sacerdote presente. Pelo contrário: dois terços param sem premeditação, acendem uma vela e fazem uma breve oração.
O caminhoneiro Herbert [nome alterado] é um desses habitués: pelo menos duas vezes por semana ele desce na luterana Autobahnkirche Medenbach, para "simplesmente relaxar e deixar as coisas se assentarem". Musculoso, de short azul-escuro, ele vai com passo firme até a porta de vidro de entrada, empurra-a com cuidado, passa pelo altar e acende uma vela votiva.
Então senta-se numa das cadeiras de madeira clara, abaixa a cabeça e desfruta o momento de silêncio. Seu olhar se fixa nas numerosas velas. "Uma namorada minha foi quem me ensinou que se acende uma vela na igreja pelos amigos e os outros seres humanos." Após uma curta pausa, ressalva: "A namorada, eu esqueci, mas o ritual continua lá."
Celebrações unem tradição religiosa a costumes pagãos: há desde procissões até competições com ovos coloridos. A Páscoa também é usada como oportunidade para protestar pelo meio ambiente.
Foto: Imago
Religião e tradição
A Páscoa é, ao lado do Natal, a comemoração mais importante do calendário cristão. Mas os símbolos e costumes mais conhecidos da festa nem sempre possuem um caráter religioso. Ao longo dos anos, ovos, coelhos e cordeirinhos da Páscoa se tornaram populares, e a tradição se mesclou a costumes pagãos. A Páscoa enquanto celebração da ressurreição de Jesus Cristo é cada vez menos conhecida na Alemanha.
Foto: st-fotograf - Fotolia.com
Quinta-feira Santa
Nesse dia, a Igreja católica relembra a última ceia que Jesus celebrou com seus discípulos. Ele partiu o pão e bebeu com todos do mesmo cálice. O ritual da Eucaristia se tornou a cerimônia central das missas e foi também imortalizado na arte e nos hinos religiosos.
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Sexta-Feira da Paixão
É quando os cristãos relembram a morte de Jesus. Em algumas comunidades religiosas, fiéis realizam procissões que representam a Via Sacra. Na Igreja Católica, a Sexta-Feira Santa é um dia de abstinência. Na Alemanha, algumas comunidades preservam a quietude neste dia, inclusive restringindo horários de baladas. Não é permitido comer carne, pois lembra o sofrimento do corpo de Cristo.
Foto: picture-alliance/dpa
Ovos de páscoa
Para cristãos ou não, não existe Páscoa sem ovos coloridos. No domingo, os pais escondem os ovos para que as crianças os procurem. Para os cristãos, o ovo de Páscoa simboliza a ressurreição de Jesus. Na Idade Média, além da carne, a Igreja proibia aos fiéis comer ovos durante a Quaresma. Para não estragar, eles passaram a ser cozidos e enfeitados e, também, dados como presente.
Foto: Fotolia/anoli
Coelho da Páscoa
Do ponto de vista biológico, não faz sentido que o coelho traga o ovo de Páscoa. Mas ele combina com essa época do ano, já que é considerado um mensageiro da primavera. O animal também é símbolo da fertilidade por se reproduzir de forma numerosa. Séculos atrás, se acreditava que também galos e cegonhas carregassem dádivas.
Foto: picture-alliance/ZB
Cordeiro da Páscoa
O cordeiro da Páscoa tem origem no ritual judaico de sacrifício do animal, que faz uma referência ao êxodo dos judeus do Egito. No cristianismo, o cordeiro é o símbolo do sofrimento de um inocente: Jesus. Na Alemanha, é tradicional este bolo em forma de cordeiro.
Foto: Fotolia/Thomas Geuking
Vela pascal
Originalmente, as velas iluminavam a missa da noite de Páscoa. A luz representa a revelação da ressurreição de Cristo para os fiéis, e a vela simboliza a vitória de Jesus sobre a morte. Com a vela pascal, todas as outras são acesas. É dessa maneira que a simbologia da iluminação cristã é repassada.
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Fogueira
O costume de acender uma fogueira na Páscoa já era conhecido entre os povos germânicos. Segundo a tradição, as chamas espantavam não apenas as privações do inverno, mas também fantasmas e demônios. O brilho das chamas também poderia trazer sorte. Hoje, a fogueira pascal é acesa sobretudo por famílias e moradores de pequenas vilas, que celebram a data juntos.
Foto: picture-alliance/dpa
Sinos e chocalhos
No domingo, os sinos das igrejas anunciam em alto tom a ressurreição de Cristo. Nas igrejas católicas, eles ficam em silêncio desde a Quinta-feira Santa. Depois, apenas os "Osterratschen" – espécie de chocalho de madeira – podem ser tocados. Por isso, em algumas regiões, crianças saem às ruas tocando o instrumento e batendo palmas para convocar os fiéis à missa e às orações.
Foto: picture-alliance/dpa
Água pascal
Alguns costumes, como o de buscar a água pascal, estão quase extintos. Na noite anterior ao domingo de Páscoa, mulheres jovens colhem água no rio. A água pascal é considerada um símbolo de vida: conserva a juventude e a beleza, e protege a fertilidade, desde que se mantenha silêncio na ida e na volta. Esse costume ainda existe entre as minorias eslavas da Sérvia que vivem no leste da Alemanha.
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Competição de ovos
A brincadeira de bater um ovo no outro ocorre em diferentes regiões da Alemanha. Trata-se de um dos jogos populares prediletos no café da manhã de Páscoa, especialmente na Baviera e na região do Reno. Ganha quem permanece mais tempo com o ovo intacto. O costume não tem fundo religioso.
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Caminhada
O que hoje os alemães praticam para ajudar na digestão do farto almoço de Páscoa, tem longa tradição. Depois do longo inverno europeu, neste passeio as pessoas saem para contemplar a primavera e o desabrochar das flores. O costume foi imortalizado por Goethe no romance "Fausto". Hoje, igrejas e clubes organizam a tradicional caminhada pascal.
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Marchas
A primeira marcha da páscoa alemã ocorreu em 1960. Desde então, se tornou uma grande tradição no país. Inicialmente, os participantes protestavam contra os planos do exército alemão de adquirir armas atômicas durante a Guerra Fria. Hoje em dia, grupos que lutam pela paz e ativistas do meio ambiente participam dos protestos.