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PolíticaPolônia

Autores condenados a se desculpar por livro sobre Holocausto

9 de fevereiro de 2021

Historiadores foram acusados de difamar ex-prefeito que teria participado do extermínio de judeus na Polônia. Críticos temem que decisão prejudique pesquisa sobre ações de poloneses durante Segunda Guerra.

Cerca de arame farpado em primeiro plano. Ao fundo, desfocado, o campo de concentração coberto de neve.
Somente em Auschwitz foram assassinados cerca de 1,2 milhão de prisioneiros, a maioria judeusFoto: Artur Widak/NurPhoto/picture alliance

Um tribunal de Varsóvia decidiu nesta terça-feira (09/02) que dois historiadores poloneses devem pedir desculpas por terem "manchado a memória" de um ex-prefeito polonês num livro que escreveram sobre o Holocausto, ao apontarem o envolvimento da antiga autoridade no extermínio de judeus.

O processo causou polêmica tanto na Polônia quanto em Israel. Acadêmicos temem que a decisão possa prejudicar a pesquisa imparcial sobre as ações de poloneses durante a Segunda Guerra Mundial.

O tribunal declarou que os pesquisadores Barbara Engelking, diretora do Conselho Internacional de Auschwitz na Polônia, e Jan Grabowski, da Universidade de Ottawa, devem se desculpar com Edward Malinowski por terem citado no livro Dalej jest noc (A Noite sem Fim, em tradução livre), de 2018, que o então prefeito do vilarejo de Malinowo entregou judeus a alemães nazistas.

A justiça, no entanto, não acatou o pedido de pagamento de uma indenização de 100 mil zlotys – o equivalente a cerca de R$ 145 mil.

O processo partiu de uma sobrinha de Malinowski, Filomena Leszczynska, de 81 anos, que considerou que a memória do tio havia sido difamada. A ação foi financiada pela Liga Polonesa Contra a Difamação, organização que se opõe à existência de envolvimento de poloneses no assassinato de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

A advogada de Leszczynska, Monika Brzozowska-Pasieka, alegou que Engelking e Grabowski não seguiram a metodologia correta de pesquisa no livro. "Filomena está extremamente satisfeita com este veredicto", disse Brzozowska-Pasieka após o julgamento. "A questão da compensação desde o início foi secundária", completou.

O livro menciona que o ex-prefeito pode ter participado de um massacre local de judeus por soldados alemães. No entanto, Leszczynska diz que seu falecido tio, na verdade, ajudou judeus. Para ela, houve "omissões" e "erros metodológicos" que fazem seu tio parecer alguém que traiu judeus.

De acordo com o livro, Malinowski permitiu que uma mulher judia sobrevivesse ao ajudá-la a se passar por não-judia. No entanto, em depoimento, a sobrevivente afirmou que ele foi cúmplice na morte de dezenas de judeus.

Tentativa de desacreditar pesquisa

Os historiadores negam a acusação e disseram que vão recorrer da decisão. Eles argumentam que o caso é uma tentativa de desacreditá-los pessoalmente e dissuadir outros acadêmicos de investigar a verdade sobre o extermínio de judeus na Polônia.

"Este é um caso do Estado polonês contra a liberdade de pesquisa", disse Grabowski, cujo pai era um sobrevivente do Holocausto.

Acadêmicos poloneses e organizações judaicas expressaram preocupação de que o julgamento possa minar a liberdade de pesquisa. Para Engelking, o caso é "um esforço" para mostrar aos pesquisadores "que há questões que não deveriam ser abordadas".

O Congresso Judaico Mundial disse, em comunicado, que estava "consternado" com a decisão. O memorial do Holocausto Yad Vashem de Jerusalém afirmou  que as acusações "equivalem a um ataque ao esforço para obter um quadro completo e equilibrado da história do Holocausto" e "constitui um sério ataque à pesquisa livre e aberta".

Críticos acusam o atual governo nacionalista da Polônia de tentar encobrir o papel de autoridades polonesas no genocídio de judeus durante a ocupação nazista alemã e desencorajar pesquisas acadêmicas sobre casos de colaboração.

Questão delicada

Mais de sete décadas depois do fim da Segunda Guerra Mundial, a contribuição de poloneses para o Holocausto continua sendo uma questão política delicada na Polônia. Várias pesquisas mostram que, enquanto milhares de poloneses arriscaram suas vidas para ajudar judeus, outros muitos participaram do genocídio.

O partido ultraconservador no poder, o Lei e Justiça (PiS), alega que os estudos que mostram a cumplicidade de poloneses no extermínio de judeus pela Alemanha nazista são uma tentativa de desonrar o país, que sofreu imensamente com o conflito.

Em 2018, a Polônia chegou a aprovar uma lei para criminalizar qualquer menção sobre a responsabilidade polonesa nos crimes cometidos por nazista durante a ocupação do país na Segunda Guerra Mundial. Após pressão internacional, a lei, que previa uma pena de até três anos de prisão, foi derrubada.

Quase todos os 3,2 milhões de judeus da Polônia morreram durante a Segunda Guerra – cerca da metade do total de judeus que teriam sido vítimas do Holocausto. Outros 3 milhões de poloneses morreram durante a ocupação nazista.

Somente em Auschwitz, o maior campo de extermínio nazista, foram assassinados cerca de 1,2 milhão de prisioneiros, a maioria judeus.

le/cn (efe, ap, ots)

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