Alemanha distribui iodo por medo de desastre nuclear
31 de agosto de 2017
Medida preventiva visa proteger moradores de área na fronteira com a Bélgica, próxima a controversa usina nuclear. Inspeções recentes revelaram centenas de danos à estrutura de reator belga.
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O medo de um acidente nuclear é grande na região da cidade de Aachen, situada na fronteira alemã com a Bélgica e a Holanda. Nesta sexta-feira (01/09) será iniciada a distribuição preventiva de comprimidos de iodo de alta dosagem, que devem proteger a população contra o câncer da tireoide em caso de acidente na controversa usina nuclear belga de Tihange, localizada a cerca de 70 quilômetros de Aachen.
"Corrente humana" pede fechamento de reatores nucleares
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Residentes do município de Aachen e de três distritos adjacentes podem solicitar os comprimidos via um portal online. A ingestão dos comprimidos tem como objetivo impedir que a tireoide absorva iodo radiativo, o que pode resultar num câncer.
Grávidas, lactantes e pessoas com até 45 anos de idade têm direito aos comprimidos. A comissão de proteção contra radiação aconselha cidadãos com mais de 45 anos a não tomar os comprimidos – neste caso, o risco de efeitos colaterais é maior do que o risco de desenvolver câncer de tireoide posteriormente.
Após o cadastro, os requerentes recebem um comprovante, com o qual retiram os comprimidos – até o fim de novembro – em farmácias autorizadas. Autoridades estimam que mais de um terço dos moradores da região irá adquirir os comprimidos.
Sobre a região fronteiriça paira a dúvida de se, em caso de um acidente nuclear, haveria tempo suficiente para fornecer comprimidos de iodo à população. Há muitos cenários a serem avaliados: se o acidente ocorre durante o dia, durante a noite, durante período de férias, quão forte são os ventos, se está chovendo.
"Dependendo do cenário, temos muitas dúvidas de que possamos distribuir comprimidos de iodo a tempo", explicou Markus Kremer, coordenador da distribuição dos comprimidos em Aachen. Por isso, os governos locais de Aachen e o conselho regional pressionaram o governo estadual da Renânia do Norte-Vestfália a autorizar o fornecimento preventivo de comprimidos de iodo.
A medida foi estimulada por preocupações quanto à segurança de reatores na usina nuclear de Tihange, na qual inspeções recentes revelaram fissuras na estrutura. Segundo a organização Nucléaire Stop, o órgão regulador nuclear belga encontrou um total de 3.219 indícios de danos no reator Tihange 2.
No ano passado, a ministra do Meio Ambiente da Alemanha, Barbara Hendricks, pediu à Bélgica o fechamento dos dois reatores até que as questões de segurança fossem esclarecidas. No entanto, o pedido foi rejeitado pelo órgão regulador nuclear da Bélgica.
Em toda a Alemanha, os comprimidos de iodo são armazenados centralmente e apenas liberados quando necessário. A medida visa, entre outros, evitar que os comprimidos sejam tomados cedo demais e, desta forma, perderem sua eficácia.
PV/dpa/ots
Quatro décadas de movimento antinuclear alemão
Protestos contra a energia atômica deram origem ao Partido Verde mais forte do mundo. Eles obtiveram muitas vitórias desde os anos 70, mas também registraram reveses.
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Nasce um movimento
O movimento antinuclear despontou na Alemanha já no início dos anos 1970, com os protestos contra os planos para a construção de uma usina nuclear em Wyhl, perto da fronteira com a França. A polícia foi acusada de empregar força excessiva para conter os manifestantes. Mas, no fim, estes venceram, e o projeto nuclear foi arquivado em 1975.
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Desobediência civil
Animados pelo sucesso em Wyhl, no fim da década de 70 protestos semelhantes de desobediência civil se realizaram em Brokdorf e Kalkar. Embora não tenham conseguido evitar a instalação dos reatores, eles provaram que o movimento antinuclear ganhava força no país.
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Não ao lixo radioativo
A cidade de Gorleben tornou-se palco de protestos veementes contra a indústria nuclear desde que, em 1977, foram anunciados planos de usar uma mina de sal desativada como depósito para resíduos atômicos. Apesar de a área próxima à fronteira da extinta Alemanha Oriental ser pouco populosa, seus habitantes logo deixaram claro que não aceitariam sem luta ter material radioativo perto de seus lares.
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Um passo para a bomba?
Desde o início, o movimento antinuclear alemão reuniu organizações religiosas, agricultores e moradores apreensivos, lado a lado com ativistas estudantis, acadêmicos e pacifistas, que viam uma conexão entre energia nuclear e a bomba atômica. Como país ao longo da fronteira da Guerra Fria, o medo de um conflito nuclear pairava na mente de muitos alemães.
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Ingresso na política partidária
No fim dos anos 70, ativistas antinucleares se juntaram a outros defensores do meio ambiente e da justiça social para formar o Partido Verde. Tendo conquistado seus primeiros assentos no parlamento federal em 1983, hoje ele é uma força política estabelecida na Alemanha, e possivelmente o Partido Verde mais forte do mundo.
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Os piores medos se tornam realidade
Em 1986, o derretimento nuclear de um reator a centenas de quilômetros, em Tchernobil, na Ucrânia, espalhou partículas radioativas pela Europa e fortaleceu a resistência à energia nuclear entre a opinião pública da Alemanha. O Partido Verde estava no poder em Hessen, mas o secretário do Meio Ambiente, Joschka Fischer, disse que não seria possível fechar de imediato as usinas do estado.
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Lei sela fim da energia atômica
Em 1998, os verdes passaram a integrar o governo federal da Alemanha, como parceiro minoritário do Partido Social-Democrata. Em 2002, essa coalizão "rubro-verde" aprovou uma lei proibindo novas usinas nucleares e reduzindo a vida útil das existentes, de modo que as últimas fossem desativadas em 2022.
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Mantendo a pressão
Mesmo com o fim da energia atômica à vista, o movimento antinuclear ainda tinha muito contra o que protestar. Numerosos ativistas, inclusive do Partido Verde – cujos então líderes Jürgen Trittin e Claudia Roth são vistos nesta foto de 2009 – exigiam um fim bem mais rápido dos reatores, dentro de uma onda antinuclear global.
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Parem este trem!
Continuava em aberto a questão de o que fazer com os resíduos radioativos dos reatores da Alemanha. Em 1995, os bastões irradiados eram reprocessados no exterior e depois trazidos de volta em trens para o depósito em Gorleben. Anos a fio, os assim chamados "transportes Castor" foram recebidos com protestos de ativistas, que sentavam sobre os trilhos dos trens até serem removidos pela polícia.
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Merkel reverte decisão dos verdes
A União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, sempre se opusera à lei limitando a vida útil das usinas nucleares. Assim, em 2009, ao formar uma coalizão com os liberais, o partido anulou a medida, num duro golpe para o movimento antinuclear.
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Fukushima força Merkel a rever a própria decisão
Em 2011, o derretimento nuclear de três reatores em Fukushima, no Japão, forçou o governo de Merkel a voltar atrás rapidamente. Poucos dias após o desastre, Berlim aprovava uma lei estabelecendo o fechamento da última usina nuclear da Alemanha em 2022. O processo de desativação gradual foi retomado, com oito reatores sendo desligados já em 2011.