Hong Kong ordena remoção de escultura que lembra massacre
8 de outubro de 2021
Peça que lembra massacre da Praça Tiananmen em 1989 era palco de vigília anual. Autor da obra, que criou escultura semelhante no Brasil para relembrar massacre de Eldorado do Carajás, critica remoção
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A Universidade de Hong Kong (HKU) ordenou nesta sexta-feira (08/10) a remoção de uma escultura que homenageia os manifestantes mortos na repressão da Praça da Paz Celestial (Tiananmen), em Pequim.
Chamada de "Coluna da Infâmia", a escultura de cobre, de oito metros de altura, costuma ser o ponto de encontro da vigília anual em Hong Kong que homenageia os mortos no massacre executado por tropas chinesas, apoiadas em tanques, que em 1989 abriram fogo contra os manifestantes pró-democracia desarmados.
O monumento, criado pelo artista dinamarquês Jens Galschiot, mostra 50 rostos angustiados e corpos empilhados uns sobre os outros, e está exposto num pátio da universidade desde o final dos anos 1990.
Galschiot criou esculturas semelhantes de mesmo nome em outros países, sempre para relembrar eventos trágicos.
Uma "Coluna da Infâmia" feita pelo artista chegou a ser exibido em 2000 em Brasília, para relembrar os motos do massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido em 1996. Hoje a escultura é exibida numa praça de Belém, no estado do Pará. Outra escultura, no México, lembra 45 indígenas assassinados por paramilitares.
A decisão das autoridades de Hong Kong foi criticada pelo escultor Galschiot, que declarou que a retirada ilustra a crescente repressão das autoridades chinesas contra dissidentes pró-democracia de Hong Kong.
Hong Kong foi colônia do Reino Unido e mantinha certa autonomia, mas desde 1997 está submetida à soberania da China. Nos últimos anos, as autoridades de Pequim vêm apertando o controle sobre a cidade e pouco a pouco têm sufocado as antigas liberdades do território, fechando jornais locais, proibindo ativistas de concorrer em eleições e condenado dissidentes a pesadas penas de prisão.
Neste ano, a vigília anual em memória dos mortos já não ocorreu em Hong Kong após pressão das autoridades. Na China continental, o aniversário de Tiananmen costuma ser marcado por um aumento na censura online. Nesse dia, a praça palco do massacre é rotineiramente cercada por forças de segurança.
Numa intimação dirigida à já dissolvida Aliança de Hong Kong (HKA) - antiga organizadora da vigília anual de Tiananmen no território semiautônomo -, a Universidade de Hong Kong exigiu ao grupo que "tome imediatamente as medidas necessárias para retirar a escultura das instalações da universidade", antes de 9h GMT (horário local) de 13 de outubro.
"Se não removerem a escultura, será considerada como abandonada", afirma a intimação, indicando que, nesse caso, a universidade se ocuparia da estátua da forma que considerar oportuna, sem mais detalhes.
Richard Tsoi, ex-membro do comitê permanente da HKA, afirmou que o pedido era "pouco razoável" e enviou uma solicitação ao reitor da HKU para que mantenha a estátua. "Como espaço com liberdade de expressão e liberdade acadêmica, a universidade de Hong Kong tem a responsabilidade social e a missão de preservar a "Coluna da Infâmiaa", destacou Tsoi em um comunicado.
Em uma resposta por e-mail à agência AFP na segunda-feira, o criador da estátua Jens Galschiot disse que estava "surpreso com a possibilidade de que o único monumento em homenagem a um evento tão importante na história da China seja profanado".
"Desejo que permaneça em Hong Kong, no mesmo lugar em que se encontra atualmente. Isso seria historicamente correto. É uma obra de arte importante que tem um vínculo histórico com Hong Kong e deveria permanecer em solo chinês", destacou Galschiot.
A HKU não respondeu às perguntas sobre a ordem de remoção da escultura.
jps (DW, ots, AFP)
O massacre da Praça da Paz Celestial
Autoridades chinesas tentaram censurar todas as fotos ligadas aos eventos de junho de 1989, em Pequim. Mas jornalistas como o fotógrafo Jeff Widener conseguiram captar imagens históricas.
Foto: Jeff Widener/AP
Deusa da Democracia
Enquanto o sol nasce sobre a Praça da Paz Celestial (Tiananmen), em Pequim, em 4 de junho de 1989, manifestantes constroem a "Deusa da Democracia" – uma estátua de dez metros de altura, feita de espuma e papel machê sobre uma armação de metal. Pela manhã, soldados apoiados por tanques e carros blindados derrubam a estátua, posicionada diante do retrato de Mao Tsé-tung na Cidade Proibida.
Foto: Jeff Widener/AP
Uma policial canta
Nos tensos dias anteriores ao massacre ordenado pelo governo chinês, moradores locais deram presentes aos soldados e oficiais de polícia. Militares até entoaram canções patrióticas junto com os manifestantes. Na foto, uma policial canta em voz alta na Praça da Paz Celestial, poucos dias antes de as tropas governamentais retomarem o controle sobre a área e esmagarem o movimento democrático.
Foto: Jeff Widener/AP
Confronto
Uma mulher envolve-se num confronto entre ativistas pró-democracia e soldados do Exército de Libertação Popular, próximo ao Grande Salão do Povo, em 3 de junho, horas antes de uma das mais sangrentas operações de repressão militar do século 20. Naquela mesma noite, o Exército abriu fogo contra civis desarmados e que ocupavam a Praça da Paz Celestial.
Foto: Jeff Widener/AP
Armas apreendidas
Milhares de manifestantes cercam um ônibus em que estão expostas armas apreendidas poucos dias antes. Durante a imposição da lei marcial, soldados e civis executam um jogo de "toma lá, dá cá": por vezes os manifestantes oferecem presentes aos soldados, por outras, as tropas recuam.
Foto: Jeff Widener/AP
Luta pela democracia
Na noite de 3 junho, um grupo de ativistas intercepta um veículo blindado para transporte de pessoal, às portas do Grande Salão do Povo. O carro acabara de atravessar as barricadas erigidas pelos civis, visando deter o avanço dos veículos militares. Ao mesmo tempo, não muito longe dali, soldados preparavam-se para abrir fogo sobre os manifestantes.
Foto: Jeff Widener/AP
Salvo por uma câmera
Na mesma noite, manifestantes atearam fogo a um veículo blindado na Avenida Chang'an, nas proximidades da Praça da Paz Celestial. Esta imagem foi a última feita pelo fotógrafo Jeff Widener, antes de ser atingido no rosto por um tijolo perdido, atirado por um dos ativistas. Embora ele tenha sofrido uma séria concussão, sua câmera de titânio Nikon F3 absorveu o choque, salvando-lhe a vida.
Foto: Jeff Widener/AP
O massacre
Em 4 de junho, após o brutal massacre do movimento democrático liderado por estudantes, um caminhão do Exército de Libertação Popular patrulha a Avenida Chang'an, diante do Beijing Hotel. Naquele mesmo dia, um veículo semelhante, cheio de soldados, disparara contra turistas no saguão desse hotel.
Foto: Jeff Widener/AP
O homem dos tanques
Sozinho, carregando sacolas de compras, um homem caminha pelo centro da Avenida Chang'an, detendo temporariamente o avanço dos tanques chineses, no dia seguinte ao massacre. Um quarto de século mais tarde, o destino desse homem continua um mistério. A imagem tornou-se símbolo dos eventos na Praça da Paz Celestial.
Foto: Jeff Widener/AP
Heróis derrubados
Em 5 de junho, na mesma Avenida Chang'an, um grupo mostra uma foto de ativistas no necrotério local, mortos pelos tiros dos soldados da 38ª divisão, durante a retomada da Praça da Paz Celestial. Os militares usaram balas dundum, que se expandem ao atingir a vítima, causando ferimentos grandes e dolorosos. Segundo dados da Anistia Internacional, foram mortos pelo menos 300 civis.
Foto: Jeff Widener/AP
Varredoras
Duas trabalhadoras varrem em torno dos restos de um ônibus incendiado, na Avenida Chang'an. Os protestos resultaram no incêndio de vários ônibus e veículos militares, matando e ferindo um grande número de soldados.
Foto: Jeff Widener/AP
Protegendo Mao
Ao lado de um tanque, soldados prestam guarda na entrada da Cidade Proibida, na ocupada Praça da Paz Celestial, alguns dias após o fim da revolta liderada pelos estudantes chineses.
Foto: Jeff Widener/AP
Parceiros da fotografia
Os fotógrafos Jeff Widener (esq.) e Liu Heung Shing, ambos da agência de notícias Associated Press, posam diante da Cidade Proibida, em Pequim, no final de maio de 1989, poucos dias antes do massacre da Praça da Paz Celestial.