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SociedadeBélgica

Bélgica confronta a passos lentos seu passado colonialista

3 de fevereiro de 2021

A exploração colonial belga data de 1870, com a brutal exploração de recursos naturais e humanos do Congo. A luta para compensar injustiças passadas e combater o racismo atual enfrenta grande resistência da sociedade.

Manifestantes erguem cartaz pedindo justiça para o Congo
Manifestação Vidas Negras Importam diante do Palácio da Justiça de Bruxelas, em junho de 2020Foto: DW/D. De Lorenzo

O belga negro Ibrahima, de 23 anos, morreu sob custódia polícial em Bruxelas, em 9 de janeiro. Alguns dias depois, irromperam protestos: cidadãos irados se chocaram com os agentes da lei e até atacaram o carro do rei da Bélgica, com o monarca dentro. A mídia local registrou cerca de 150 detenções relacionadas aos incidentes.

Temendo uma continuação dos tumultos, as forças de segurança da capital ficaram em estado de alerta durante todo janeiro. Alguns meses antes, o país reaquecera os esforços para prestar contas com seu passado de potência colonizadora, no contexto do movimento global Black Lives Matter (Vidas Negras Importam).

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07:05

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As autoridades belgas tomaram uma série de decisões para encarar questões de longa data relacionadas à cor da pele, desde a história de colonização cruel ao atual racismo sistemático, que segue afetando seus cidadãos negros.

A economia da Bélgica se beneficiou enormemente com a tomada do Congo, entre as décadas de 1870 e 1900. O rei Leopoldo 2º governava o país como seu feudo pessoal, explorando marfim e borracha. No processo, 10 milhões de africanos foram assassinados, segundo estimativas. Ainda assim, uma consulta em 2020 revelou que, para a metade dos belgas, a colonização fez mais bem do que prejudicou a nação africana.

Primeiros esforços

Os tumultos que se seguiram à morte de Ibrahima mostraram que as autoridades belgas ainda terão que se esforçar muito para conquistar a confiança da sociedade no sentido do combate ao racismo e da abordagem de suas causas históricas.

Cansados da relutância da elite em promover mudanças fundamentais, ativistas e grupos na diáspora assumiram a tarefa. Em meados de 2020, após amplos protestos antirracistas e pela descolonização, o Parlamento federal designou uma comissão para estudar o passado colonial da Bélgica.

Em julho, o rei Philippe enviou uma carta ao presidente da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, expressando seu "mais profundo pesar" pelos "atos de violência" cometidos pela Bélgica, relacionando-os ao racismo de hoje em dia.

Além disso, após ter rejeitado a ideia por muito tempo, as escolas da parte flamenga do país finalmente anunciaram que incluirão em seus currículos aulas sobre colonialismo, neocolonialismo e decolonização.

Estátuas de Leopoldo 2º foram pichadas em várias partes da BélgicaFoto: DW/D. De Lorenzo

De Patrice Lumumba ao racismo quotidiano

Para muitos, apesar de necessários, os pequenos passos da liderança belga na confrontação de seu passado colonialista são insuficientes para acarretar mudanças fundamentais. Um exemplo é a própria comissão encarregada de estudar a questão, duramente criticada por não incluir nenhum especialista ou historiador originário do Congo, Ruanda ou Burundi.

Porém talvez mais notável ainda é a longa e não solucionada história em torno da execução do primeiro líder congolês democraticamente eleito, Patrice Lumumba, em janeiro de 1961, armada pelos governos americano e belga. Depois do fuzilamento, os corpos dele e de dois correligionários foram dissolvidos em ácido sulfúrico.

Esse é um dos desafios que a Bélgica precisa superar, a fim de encarar seu passado e que perpetrou contra o Congo. Somente em 2000 o Parlamento belga estabeleceu uma comissão para "determinar as circunstâncias exatas do assassinato de Patrice Lumumba e o possível envolvimento de políticos belgas".

No entanto, ninguém foi processado até hoje, mesmo porque a maioria dos suspeitos já morreu de velhice. Em setembro de 2020, a Bélgica finalmente concordou em facilitar a repatriação para o Congo da única parte do corpo de Lumumba que restou: um dente, guardado secretamente pelo ex-agente de polícia Gerard Soete.

Segundo observadores, existe uma conexão direta entre o descaso belga quanto ao assassinato de Lumumba e a "mentalidade colonialista" que segue influenciando a sociedade nacional: ambos se baseiam numa percepção de supremacia.

Patrice Lumumba, primeiro líder congolês democraticamente eleito, foi assassinado em 17 de janeiro de 1961Foto: picture-alliance/AP Photo

Raios de esperança

Especialistas reivindicam que os esforços para compensar o passado se concentrem, acima de tudo, em evitar que brutalidades semelhantes voltem a acontecer: os crimes colonialistas devem ter consequências, não basta dizer que o que aconteceu foi ruim.

Contudo, até hoje nenhuma das companhias que durante décadas extraíram recursos do Congo concordou em pagar compensações. Isso, embora não só historiadores, como as próprias autoridades belgas tenham confirmado seu empenho na desestabilização do país africano e seus crimes como repressão violenta e uso de trabalho forçado.

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Na capital Bruxelas, a Praça Lumumba é um dos poucos monumentos que recordam a brutalidade do papel belga na colonização da África. O resto da cidade, porém, ostenta memoriais glorificadores desso passado, como estátuas e referências ao rei Leopoldo 2º.

Ainda assim, há alguns raios de esperança, na opinião de Karel Arnaut, professor de interculturalismo, migração e minorias da Universidade de Leuven: "Por estes dias, vemos na Bélgica a emergência de muitas iniciativas locais e de base, visando combater os legados do colonialismo."

Ele identifica uma nova onda de luta intelectual orquestrada por pesquisadores universitários, visando trazer à luz o que até agora foi descartado pela história oficial. Além disso, "grupos jovens e vibrantes da diáspora africana reconheceram que ativismo continuado é a única forma de fazer valer seus direitos".

Em janeiro, o Conselho Municipal da cidade de Gante respondeu positivamente a uma iniciativa pela mudança do nome da rua Leopoldo 2º. Antes, o polo turístico já removera uma estátua do monarca, atendendo a uma campanha local. "Isso me dá esperanças", afirma Arnaut.

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