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Banimento do X é triste, mas também histórico

Nina Lemos
Nina Lemos
2 de setembro de 2024

Apesar do sentimento de perda, todos meus amigos tuiteiros sentem orgulho pelo Brasil ter sido o primeiro país democrático a tomar uma medida forte contra Elon Musk, que não esconde seu apego à extrema direita.

Elon Musk chamou a decisão do STF de censuraFoto: FREDERIC J. BROWN/AFP

"Estou rindo de euforia, mas quando vocês começarem a desaparecer, eu acho que vou chorar." Esse foi um dos últimos posts que escrevi no Twitter, na madrugada de sexta-feira (30/08) para sábado, antes que a rede fosse banida no Brasil. "vai nada! Existe vida após a morte do X hahaha", respondeu o ex-deputado Jean Wyllys, uma das muitas pessoas que conheci no Twitter e que se tornaram meus amigos na vida real.  É, isso existe. Eu tenho muitos amigos de verdade que conheci na rede.

Sim, sou uma usuária hard do Twitter (que virou X quando foi comprado por Elon Musk, mas para nós sempre será o Twitter) há cerca de 18 anos, o que prova que eu tenho (ou tinha) com a rede um dos relacionamentos mais estáveis e duradouros da minha vida. E também tóxico, claro, já que não é nada legal ser viciada numa rede social. E foi nela também que sofri, em 2022, ataques de ódio em massa de apoiadores de Jair Bolsonaro.

Mas o apego que tenho à minha turma do Twitter é enorme. E acho que só quem "é do Twitter" é capaz de entender isso.

Por isso entrei em pânico na madrugada de sexta para sábado, quando soubemos que a rede sairia do ar no Brasil. Como moro na Alemanha, minha rede continuaria funcionando. Mas eu perderia contato com meus amigos da rede, onde tenho mais de 40 mil seguidores, e 99,9% deles são brasileiros.

A expectativa do fim começou na quarta-feira passada, quando o ministro do STF Alexandre de Moraes deu 24 horas para que o bilionário Elon Musk, o dono do Twitter que se acha dono do mundo (como já escrevi aqui), apresentasse um representante legal no país. Musk respondeu fazendo birra, escrevendo na própria rede que "Alexandre de Moraes era um ditador tirano e Lula era seu bichinho". No X, uma contagem regressiva começou. As 24 horas acabariam às 20h de quinta-feira no Brasil. Nada aconteceu. Na sexta-feira à noite, portais publicaram que agora era verdade. A Anatel já tinha sido notificada, e as operadoras derrubariam em breve o acesso ao X.

Imediatamente, um grande velório começou na rede. Foi tudo muito engraçado, e os memes e piadas foram ótimos. "Desculpa, gente, mas comprar um VPN para acessar o Twitter é como vender a TV para comprar droga. Seria interessante ter calma", escreveu um usuário num post que viralizou. "Queria muito saber a hora que o meu site vai afundar para que meu último tweet seja jogando uma maldição naquele bilionário safado", escreveu a criadora de conteúdo Bic Muller. 

É, enquanto Elon Musk e sua rede de seguidores extremistas espalhada mundo afora gritavam que o Brasil estava sendo alvo de "censura" e tinha virado "uma ditadura", todas as pessoas que eu conheço e/ou sigo apoiavam a decisão da Justiça brasileira de suspender o Twitter. "Vocês têm noção do quanto isso é gigante? Um país democrático colocando limite numa big tech que tentou desestabilizar a democracia", escreveu a professora de filosofia e tuiteira Biazita Gomes. O post teve 60 mil likes e foi compartilhado por mais de 7 mil pessoas.

"Para todos os meus colegas internacionais. O Twitter foi bloqueado no Brasil porque a lei brasileira determina que qualquer empresa de mídia social que opere no país tenha um representante legal. Elon Musk decidiu, propositalmente, não fazê-lo", avisou, em inglês, a jornalista Natalia Vianna, diretora executiva da Agência Pública.

É difícil abrir mão de algo que se gosta e que, para além do vício, é, também uma rede de informação e contatos. Mas, pelo menos na minha bolha, o respeito pela democracia brasileira é mais importante. Ninguém que eu conheça acha que o país deva aceitar os insultos, ofensas e descumprimentos da lei praticados por Elon Musk sem fazer nada. E, apesar do sentimento de perda, sentimos orgulho pelo Brasil ser o primeiro país democrático a tomar uma medida tão pesada contra Musk, que não esconde seu apego à extrema direita e seu desprezo pela democracia e as leis.

Acho que a maioria dos meus amigos tuiteiros querem, sim, que a rede volte. Vamos ser sinceros, para quem gosta de notícias, como nós, jornalistas e outros, nenhuma outra rede se compara ao X. "Debate de candidatos à prefeitura de SP para os exilados do Twitter é a sexta-feira à noite de quem tomou pé na bunda", escreveu minha amiga Eva Uviedo, artista plástica, no Threads, uma rede "estilo Twitter" que pertence à Meta e é conectada ao Instagram.

Com o banimento do Twitter, milhares de brasileiros abriram contas no Blue Sky (uma rede similar ao Twitter, mas com menos recursos) e no Threads. Por lá, tentamos nos encontrar. Mas vamos ser sinceros. Não é a mesma coisa. Se eu estivesse sem acesso ao X no domingo, não sei como teria acompanhado as eleições estaduais na Alemanha, os protestos em Tel Aviv e o que mais aconteceu de importante no fim de semana.

Espero que a Justiça do Brasil não faça concessões ao Elon Musk. Mas também espero que o milionário seja pressionado por investidores a voltar atrás e que o Twitter esteja de volta na minha próxima ida ao Brasil. Ou antes.

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Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000, quando lançou com duas amigas o grupo "02 Neurônio". Já foi colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. É uma das criadoras da revista TPM. Em 2015, mudou para Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada. Desde então, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão.

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

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O estado das coisas

Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000. Desde 2015, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão em Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada.