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Liberdade de imprensaBrasil

Bolsonaro é condenado por ofensa misógina contra jornalista

29 de junho de 2022

Justiça mantém condenação de Bolsonaro por ofensa à honra de Patrícia Campos Mello. "Uma vitória de todas nós mulheres", diz jornalista, alvo de ataque em 2020 após expor atuação da máquina de fake news bolsonarista.

Jair Bolsonaro e jornalistas
Bolsonaro atacou vários jornalistas durante seu governo e o Brasil vem caindo em rankings de liberdade de imprensaFoto: Alan Santos/Presidência da República do Brasil

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu manter a condenação de Jair Bolsonaro pelas ofensas misóginas que o presidente dirigiu contra a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo. Em decisão divulgada nesta quarta-feira (29/06), o tribunal também elevou o valor da indenização de R$ 20 mil para R$ 35 mil. Bolsonaro já havia sido derrotado em março de 2021 primeira instância na ação movida pela jornalista.

O placar para manter a condenação do presidente no Tribunal de Justiça foi de quatro votos a um. Votaram a favor da jornalista a relatora Clara Maria Araújo Xavier e os desembargadores Pedro de Alcântara, Silvério da Silva e Theodureto Camargo. O desembargador Salles Rossi foi o único voto dissonante.

"Ganhamos!!!! Por 4x1, o TJ de SP decidiu que não é aceitável um presidente da República ofender, usando insinuação sexual, uma jornalista. Uma vitória de todas nós mulheres", escreveu a jornalista Mello no Twitter após a divulgação da decisão. Agradeço à brilhante Tais Gasparian [advogada do jornal Folha de S.Paulo] e a todos vocês pela mobilização, sem vcs não seria possível", completou a jornalista.

Na terça-feira, antes do julgamento em segunda instância contra o presidente, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) soltaram uma nota pedindo que o TJ-SP "não se dobrasse ao poder político".

"O opressor reincidente de mulheres cometeu um crime que se reproduz cotidianamente com cúmplices de suas falas e atitudes políticas, na maioria das vezes contra profissionais da imprensa sem a visibilidade da jornalista [Patrícia Campos Mello]. Fazer justiça nesse caso é oferecer à jornalista, à imprensa e ao interesse público uma reparação concreta, junto com o sentimento de que o Judiciário não se dobra ao poder político de disseminadores do ódio, especialmente contra mulheres", afirmaram as entidades.

Entenda o caso

Em março de 2020, a jornalista Patrícia Campos Mello, que elaborou uma série de reportagens para o jornal Folha de S.Paulo sobre o disparo de notícias falsas nas eleições de 2018, foi alvo de um insulto com insinuação sexual proferido pelo presidente Jair Bolsonaro. Nas semanas que precederam a fala misógina do presidente, a jornalista já vinha sendo alvo de ataques nas redes após desagradar a base de extrema direita bolsonarista com suas reportagens que apontavam a existência de esquemas fraudulentos de divulgação de fake news para beneficiar Bolsonaro.

Na ocasião, ao falar com jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente, cercado da sua tradicional claque de apoiadores, disse, intercalando risadas, que a repórter "queria dar o furo a qualquer preço contra mim". No jargão do jornalismo, furo é um termo usado para designar a obtenção e divulgação de uma notícia exclusiva. Mas, no contexto usado pelo presidente, o termo acabou sendo instrumentalizado por Bolsonaro como um insulto sexual.

Isso porque dias antes um ex-funcionário de uma empresa de disparos de mensagens nas redes, em depoimento à CPI das fake news, havia insinuado que a repórter da Folha teria desejado obter informações para suas reportagens "a troco de sexo". O funcionário em questão, Hans River do Rio Nascimento, não apresentou qualquer prova, mas suas falas na CPI foram rapidamente instrumentalizadas por membros da extrema direita brasileira, que passaram a dirigir ataques contra a jornalista.

A jornalista Patrícia Campos Mello, durante o Global Media Forum, organizado pela DWFoto: Leila Endruweit/DW

Entre os que amplificaram as falas de Nascimento nas redes estava o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, que assim como o pai também foi condenado em duas instâncias a indenizar Patrícia Campos Mello. Além dos dois membros do clã Bolsonaro, o deputado estadual André Fernandes (PL-CE), que também amplificou os ataques, foi condenado a indenizar em R$ 50 mil a jornalista.

À época, os ataques misóginos contra Patrícia Campos Mello provocaram indignação entre vários setores da sociedade brasileira e expuseram ainda mais o funcionamento da máquina bolsonarista de assassinato de reputações nas redes, que mira com especial virulência jornalistas mulheres que desagradam ao Planalto.

Em 2020, Mello publicou o livro A máquina do ódio: Notas de uma repórter sobre fake news e violência digital, em que discorre sobre a forma como as redes sociais vêm sendo manipuladas por extremistas que lançam campanhas de difamação.

jps (ots)