Bolsonaro diz que desmatamento na Amazônia é "cultural"
20 de novembro de 2019
Presidente afirma que não é possível acabar com o desflorestamento e com as queimadas, minimizando dados mais recentes do Inpe, que apontaram aumento recorde de destruição do bioma.
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O presidente Jair Bolsonaro minimizou os números mais recentes sobre o desmatamento na Amazônia que apontam para um recorde de destruição entre agosto de 2018 e julho de 2019, dizendo se tratar de uma questão "cultural".
"Você não vai acabar com o desmatamento nem com as queimadas. É cultural", afirmou o presidente nesta quarta-feira (20/11) ao ser questionado sobre o tema quando deixava o Palácio do Planalto.
Dados revelados pelo Programa de Cálculo Desflorestamento na Amazônia (Prodes), o sistema de monitoramento por satélites operado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), revelaram que, ao todo, o bioma perdeu uma área de 9.762 km² (equivalente a sete cidades do Rio de Janeiro). É a maior taxa de desmatamento registrada desde 2008.
Esse aumento percentual de 29,5% também foi o terceiro maior da história, ficando atrás apenas das altas de 1995 (95%) e 1998 (31%). O período avaliado inclui sete meses do governo Bolsonaro.
Na terça-feira, ao ser perguntado também sobre o desmatamento recorde, o presidente se esquivou de comentar sobre o tema. Ele questionou se as mesmas perguntas seriam feitas para Marina Silva, quando ela era ministra do Meio Ambiente no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, época em que, segundo Bolsonaro, também houve um recorde de desmatamento.
"Não pergunta pra mim não. Não pergunta não, [o ministro do Meio Ambiente] Ricardo Salles está aí, conversa com ele", disse Bolsonaro em uma cerimônia em homenagem ao Dia da Bandeira. Marina Silva esteve à frente do Ministério entre janeiro de 2003 e maio de 2008, quando foi substituída por Carlos Minc.
Na segunda feira, após o diretor interino do Inpe, Darcton Policarpo Damião, anunciar os números mais recentes sobre o desmatamento, Salles tentou minimizar o conteúdo dos dados. "O número está seguindo uma tendência de aumento desde 2012", afirmou.
A taxa, porém, ficou pelo menos 1.500 km² acima da tendência de aumento do da devastação que vinha sendo registrada desde 2012. Segundo o Inpe, se o desmatamento continuasse na mesma tendência dos últimos anos, a área destruída teria sido de 8.278 km².
Questionado sobre os motivos que impulsionaram a alta da destruição na Amazônia, Salles afirmou que "não é verdade" que o discurso de governo de Jair Bolsonaro tenha incentivado o desmatamento na região.
Focos de incêndio na Floresta Amazônica atingem seu pior agosto em quase uma década. Em Rondônia, fogo é a última etapa de uma cadeia criminosa que inclui invasão de terras, extração ilegal de madeira e desmatamento.
Foto: Imago Images/Agencia EFE/J. Alves
Chamas em agosto
Com 30.901 focos de queimadas registrados por satélites no bioma Amazônia, o mês de agosto de 2019 superou o registrado no mesmo mês em todos os anos anteriores até 2010, quando o número chegou a 45.018. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que monitora as queimadas desde 1998. O recorde para o mês de agosto ainda é de 2007, com 63.764 focos.
Foto: Flávio Forner
Prejuízos à saúde
Na região de Porto Velho, capital de Rondônia, a fumaça das queimadas causa problemas sérios de saúde. Em um estudo realizado no estado, a Fiocruz analisou dados de 1998 a 2005 e concluiu que o número de mortes de idosos acima de 65 anos por doenças respiratórias aumenta durante os meses de queimadas. Até 80% das mortes estão relacionadas aos incêndios florestais.
Foto: Flávio Forner
O futuro da floresta nacional
A Floresta Nacional do Bom Futuro, perto de Porto Velho, foi criada em 1988 para proteger originalmente 280 mil hectares da Floresta Amazônica. Em 2010, um decreto reduziu a área para 98 mil hectares por conta da ocupação da região. A Flona (floresta nacional) é uma das mais ameaçadas no bioma, com histórico de invasões, desmatamento e queimadas.
Foto: Flávio Forner
Plantão na floresta
Brigadistas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ficam de plantão na região da Floresta Nacional do Bom Futuro 24 horas por dia na época das queimadas, de julho a outubro. Eles fazem rondas diárias para evitar crimes e, quando identificam fogo, usam bombas costais e abafador para apagar as chamas.
Foto: Flávio Forner
Solo mais pobre
O primeiro efeito da queimada é a perda de nutrientes e da biota do solo, alerta o biólogo Marcelo Ferronato, da ONG Ecoporé. Com o passar dos anos, os nutrientes que estavam ali sendo depositados pelas florestas desaparecem, como folhas e galhos. "O solo vai se enfraquecendo, a área começa a ser degradada, a produtividade cai, e novas áreas são abertas, alimentando o ciclo do desmatamento."
Foto: Flávio Forner
Lote ilegal
O capim cresce na área já desmatada dentro da Floresta Nacional do Bom Futuro. A estaca fixada no chão serve para demarcar o lote que, mais para frente, será vendido de forma ilegal. A área onde o crime ocorreu fica a menos de um quilômetro da estrada de terra que corta a unidade de conservação.
Foto: DW/N. Pontes
Desmatamento antes do fogo
Esta clareira na Floresta Nacional do Bom Futuro foi aberta cinco dias antes de a equipe da DW Brasil visitar o local. Algumas árvores mais antigas ainda estão de pé, como uma da espécie tauari de 200 anos, de cerca de 40 metros de altura, que também é um porta-sementes. Segundo brigadistas, os criminosos esperam a mata derrubada secar por alguns dias antes de colocar fogo.
Foto: Flávio Forner
Reflorestamento em risco
Alguns projetos de compensação ambiental de outros empreendimentos são revertidos para a Floresta Nacional do Bom Futuro. Na foto, árvores nativas da Amazônia crescem numa área do tamanho de 70 campos de futebol que foi desmatada. Se elas sobreviverem aos crimes cometidos na região, precisarão de 50 anos para voltar a ganhar o aspecto de uma floresta densa.
Foto: Flávio Forner
Pressão em terras indígenas
No estado de Rondônia, 21 reservas são destinadas a povos indígenas. A Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, a cerca de 300 quilômetros de Porto Velho, tem sete aldeias e comunidades que escolheram viver isoladas na Floresta Amazônica. Criado em 1985, o território de uso exclusivo dos indígenas sofre ameaças constantes de madeireiros e grileiros.
Foto: Flávio Forner
Preocupação com a floresta
Segundo os indígenas, a destruição da floresta é muito rápida. Eles acreditam que a "empreitada" para desmatar e queimar a mata, que conta com entre 10 e 15 pessoas, seja custeada por quem tem muito dinheiro. Depois de tirar a madeira, os criminosos queimam a área e jogam sementes de capim, conta Taroba Uru-Eu-Wau-Wau (foto).
Foto: Flávio Forner
Desmatamento e pastagem
Segundo estudos de pesquisadores da Universidade Federal de Rondônia (Unir), o desmatamento ilegal serve para ampliar áreas de pastagem. Dados oficiais estimam que o rebanho no estado ultrapasse 14 milhões de cabeças. Aos poucos, as pastagens têm se convertido em plantações, como de soja, afirma a pesquisadora Maria Madalena Cavalcante, da Unir.