Bolsonaro promete governo constitucional e democrático
29 de outubro de 2018
Em discurso após a vitória, presidente eleito adota tom mais ameno, lista promessas de governo e compromete-se em defender a Constituição, a democracia e a liberdade. Haddad pede coragem a brasileiros e promete oposição.
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Em seu primeiro pronunciamento como presidente eleito neste domingo (28/10), Jair Bolsonaro (PSL) optou por amenizar o tom rígido e o discurso muitas vezes tachado de antidemocrático que marcou boa parte de sua campanha, e prometeu promover, a partir de 2019, um governo constitucional e defensor da democracia.
"Faço de vocês minhas testemunhas de que este governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade. Isso é uma promessa não de um partido, não é a palavra vã de um homem. É um juramento a Deus", declarou o capitão da reserva.
Em discurso de vitória lido diante das câmeras e ao lado de familiares e aliados na porta de sua casa, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, o presidente eleito insistiu que a liberdade é um "princípio fundamental" que vai transformar o Brasil em "uma grande nação".
"Liberdade de ir e vir, andar nas ruas em todos os lugares deste país. Liberdade de empreender. Liberdade política e religiosa. Liberdade de informar e ter opinião. Liberdade de fazer escolhas e ser respeitado por elas", listou o presidente eleito.
Em um aceno à inclusão social – em contradição com posicionamentos polêmicos colecionados ao longo de sua vida política –, Bolsonaro frisou que este é um "país de todos": "Brasileiros natos ou de coração, um Brasil de diversas opiniões, cores ou orientações."
"Como defensor da liberdade, vou guiar um governo que defenda e proteja os direitos do cidadão que cumpre seus deveres e respeita as leis. Elas são para todos, porque assim será nosso governo: constitucional e democrático", garantiu.
O presidente eleito ainda reiterou que o resultado das eleições deste domingo não representou a vitória de um partido, "mas a celebração de um país pela liberdade", e prometeu cumprir o compromisso que assumiu com os brasileiros de "fazer um governo decente, comprometido exclusivamente com o país e com o nosso povo".
"Nosso governo será formado por pessoas que tenham o mesmo propósito de cada um que me ouve neste momento. O propósito de transformar o nosso Brasil em uma grande, livre e próspera nação. Podem ter certeza que nós trabalharemos dia e noite para isso."
Em relação ao futuro governo, prometeu "quebrar paradigmas". "Vamos confiar nas pessoas. Vamos desburocratizar, simplificar e permitir que o cidadão, o empreendedor, tenha mais liberdade para criar e construir o seu futuro. Vamos desamarrar o Brasil", afirmou.
Bolsonaro ainda falou em "criar condições para que todos cresçam. "Isso significa que o governo federal dará um passo atrás, reduzindo a sua estrutura e a burocracia, cortando desperdícios e privilégios, para que as pessoas possam dar muitos passos à frente."
"Este não será um governo de resposta apenas às necessidades imediatas. As reformas a que nos propomos são para criar um novo futuro para os brasileiros", afirmou. "Não existem brasileiros do Sul ou do Norte. Somos todos um só país, somos todos uma só nação. Uma nação democrática."
Entre as propostas de governo, o capitão reformado mencionou que pretende gerar mais empregos, promover o equilíbrio fiscal, quebrar o crescimento da dívida, reduzir os juros e converter o déficit público primário em superávit.
Também falou em buscar laços bilaterais com nações mais desenvolvidas, a fim de "libertar o Brasil das relações internacionais com viés ideológico". "Recuperaremos o respeito internacional pelo nosso amado Brasil."
Antes desse discurso, Bolsonaro fez um primeiro pronunciamento após a vitória em transmissão ao vivo nas redes sociais, no qual já havia prometido um governo "ao lado da Constituição", que contará com "uma boa assessoria técnica e profissional, isenta de indicações políticas de praxe". Ele ainda disse que se inspiraria em "grandes líderes mundiais".
O vídeo de quase oito minutos foi gravado em sua casa, ao lado de sua mulher, Michelle Bolsonaro, e de uma tradutora de libras. Sobre a mesa, havia exemplares da Bíblia, da Constituição, de um livro sobre o ex-primeiro-ministro britânico Winston Churchill, que liderou o Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial, e de outro do escritor conservador Olavo de Carvalho.
Haddad pede coragem
O candidato derrotado neste segundo turno, Fernando Haddad (PT), também fez um pronunciamento neste domingo ao lado de correligionários e lideranças do PT, Pros, PCdoB, Psol e de movimentos sociais.
Em tom firme, o petista discursou por cerca de dez minutos, agradeceu os 47 milhões de votos no segundo turno e garantiu que se manterá na oposição. "Verás que um professor não foge à luta. Nem teme, quem adora a liberdade, a própria morte", disse, parafraseando o hino nacional.
Haddad ressaltou que há tempos as "instituições são colocadas à prova a todo instante", e que a soberania nacional e a democracia são valores que estão "acima de todos nós."
"Temos uma tarefa enorme no país, que é em nome da democracia, defender o pensamento, as liberdades desses 45 milhões de brasileiros", argumentou. "Parte expressiva do povo brasileiro precisa ser respeitada nesse momento."
Ele pediu ainda para que seus eleitores não aceitem provocações ou ameaças. "Não vamos deixar esse país para trás. Vamos colocar o nosso ponto de vista", declarou. "Coloco a minha vida à disposição desse país. Não tenham medo, nós estaremos aqui. A vida é feita de coragem."
Bolsonaro foi eleito neste domingo com pouco mais de 55% dos votos válidos, que somaram até agora, com 99,99% das urnas apuradas, quase 58 milhões de eleitores. Haddad chegou a quase 45%, o que representa mais de 47 milhões de votos.
Treze candidatos se apresentaram para disputar o Planalto. O líder das pesquisas acabou fora da corrida, e vários nomes tentam contornar isolamento partidário. Veja os principais episódios da disputa.
Foto: Reuters/A. Machado
Bolsonaro é eleito presidente
Em segundo turno, os brasileiros elegeram Jair Bolsonaro (PSL) como presidente. Após uma campanha eleitoral polarizada, o militar reformado de extrema direita recebeu 55,13% dos votos, contra 44,87% de Fernando Haddad (PT). Com bandeiras do Brasil e vestidos nas cores verde e amarelo, eleitores comemoram pelo país. No discurso da vitória, Bolsonaro prometeu um governo constitucional e democrático.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S.Izquierdo
TSE abre investigação contra Bolsonaro
A pouco mais de uma semana do segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral abriu uma ação para investigar suspeitas de compra de disparos de mensagens antipetistas no WhatsApp por parte de empresários aliados a Bolsonaro. O pedido de investigação foi feito pelo PT, após uma reportagem do jornal "Folha de S. Paulo". A PF também abriu inquérito para investigar a disseminação em massa de "fake news".
Foto: Reuters/R. Moraes
Bolsonaro e Haddad vão ao segundo turno
Numa das eleições mais polarizadas da história, em 7 de outubro os brasileiros levaram ao segundo turno os dois candidatos que, segundo sondagens, são também os mais rejeitados: Bolsonaro (PSL) e Haddad (PT). Favorito no Sul e Sudeste, o ex-militar teve 46% dos votos válidos contra 29% do petista, que foi o mais votado em oito estados do Nordeste e no Pará. Em terceiro, Ciro Gomes (PDT) teve 12%.
Foto: Reuters/P. Whitaker/N. Doce
Bolsonaro cresce nas pesquisas
Já líder nas pesquisas, o candidato do PSL ampliou sua vantagem no início de outubro, ultrapassando pela primeira vez a marca de 30% em sondagens do Ibope e do Datafolha. Ao longo da semana que antecedeu as eleições, o ex-capitão foi subindo e, na véspera do pleito, cruzou a barreira de 40% dos votos válidos. Após ser esfaqueado, a campanha do candidato se concentrou nas redes sociais.
Foto: Reuters/P. Whitaker
A troca de Lula por Haddad
Após meses de suspense e com aval de Lula, Fernando Haddad foi oficializado candidato à Presidência pelo PT em 11 de setembro, a menos de um mês do primeiro turno, após se esgotarem as chances de o ex-presidente concorrer. Preso e virtualmente inelegível pela Ficha Limpa, Lula era líder nas pesquisas de intenção de voto. O desafio agora será transferir votos para o ex-prefeito.
Foto: Agencia Brasil/R. Rosa
Ataque a Bolsonaro
O candidato do PSL foi esfaqueado durante um ato de campanha em Juiz de Fora, um ataque que prometia mudar os rumos da corrida presidencial. Seus adversários condenaram a agressão, e alguns chegaram a mudar o tom da campanha. Não houve, contudo, um impacto decisivo sobre o eleitorado. Ele segue líder das intenções, mas com percentual praticamente igual. A rejeição a ele, por outro lado, aumentou.
Foto: picture-alliance/dpa/Agencia O Globo/A. Scorza
O "plano B" do PT
Com Lula virtualmente inelegível, a escolha do seu vice passou a ser encarada como um trampolim para um candidato substituto. No início de agosto, o PT acabou indicando Fernando Haddad, que desde o início do ano era cotado como "plano B". Manuela D'Ávila (PCdoB) ficou com a curiosa posição não oficial de "vice do vice", assumindo a posição com Lula candidato ou não.
Foto: Agência Brasil/F.Rodrigues Pozzebom
A novela dos vices
A fase de convenções começou no fim de julho sem que a maioria dos pré-candidatos tivesse um vice. Bolsonaro teve três convites recusados até fechar com o general Mourão (PRTB). Henrique Meirelles (MDB) e Ciro Gomes (PDT) se contentaram com nomes do próprio partido. Alckmin teve convite recusado pelo empresário Josué Alencar, cuja família é ligada a Lula, antes de optar por Ana Amélia (PR).
Foto: Agência Brasil/F.Frazão
Os candidatos isolados
A jogada de Alckmin com o "centrão" acabou isolando outros candidatos. Jair Bolsonaro (PSL) tentou negociar com o PR, mas teve que se contentar com o nanico PRTB. Ciro Gomes (PDT) também viu suas investidas no grupo naufragarem. Marina Silva (Rede) e Ciro também não conseguiram apoio do PSB, que ficou neutro numa manobra do PT. Os três terminaram a fase de convenções com pouco apoio e tempo de TV.
Alckmin fecha com o "centrão"
Em julho, o tucano Geraldo Alckmin ainda patinava nas pesquisas, mas criou um fato novo na campanha ao conseguir o apoio do "centrão", as siglas que costumam emprestar seu apoio a governos em troca de cargos e verbas. Ao se aliar com PR, PP, PSD, DEM e SD, Alckmin passou a dominar 44% da propaganda eleitoral na TV. Sua coligação também recebe 48% do novo fundo de campanhas.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Candidaturas descartadas
A eleição de 2018 parecia destinada a superar o número de candidatos de 1989, quando 22 disputaram. Em abril, 23 manifestavam interesse em concorrer, entre eles o presidente Michel Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ex-presidente Fernando Collor. Mas eles logo desistiram ou foram abandonados por seus partidos. Outros aceitaram ser vices. Em agosto, só 13 permaneciam na corrida.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Os "outsiders" saem de cena
A possibilidade de Lula ficar de fora e o sentimento antipolítico entre a população sinalizavam que esta seria a eleição dos "outsiders". O ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa e o apresentador Luciano Huck chegaram a ser incluídos em pesquisas. O empresário Flávio Rocha anunciou candidatura. Em julho, todos já haviam desistido, e a disputa ficou restrita a velhos nomes da política.
Foto: Imago/ZUMA Press/M. Chello
Lula é condenado e preso
Quando anunciou, em 2016, a intenção de disputar a eleição, Lula se tornou o líder nas pesquisas. Em janeiro, porém, sua situação se complicou após uma condenação em segunda instância que o deixou virtualmente inelegível. Em abril, foi preso. Com a possibilidade de a candidatura ser barrada, o PT passou a ter dificuldades em formar alianças, e o desfecho do pleito ficou ainda mais imprevisível.
Foto: Reuters/L. Benassatto
Entra em cena o fundo de campanhas
Diante da proibição das doações por empresas, o Congresso criou em outubro de 2017 um novo fundo de R$ 1,7 bilhão para financiar candidaturas, já definindo a capacidade financeira de várias campanhas. Quase 60% do valor ficou concentrado em seis legendas: MDB, PT, PSDB, PP, PSB e PR, deixando candidatos à Presidência de pequenas e médias siglas com menos recursos na largada.