Brasil escolhe "Babenco" para disputar vaga no Oscar
18 de novembro de 2020
Documentário dirigido por Bárbara Paz narra os últimos dias do cineasta argentino-brasileiro Héctor Babenco. Pela primeira vez, indicação é feita sem participação do governo federal.
O diretor argentino naturalizado brasileiro Héctor Babenco. Morto em 2016, ele é tema de documentário dirigido por sua última companheiraFoto: Imago/Fotoarena
Anúncio
A Academia Brasileira de Cinema (ABC) anunciou nesta quarta-feira (18/11) que o documentário Babenco: alguém tem que ouvir o coração e dizer: parou, dirigido por Bárbara Paz, foi escolhido como candidato oficial do Brasil para tentar uma vaga entre os indicados ao próximo Oscar de melhor filme internacional – a nova designação de melhor filme estrangeiro.
No filme, Paz, atriz e última companheira de Héctor Babenco (1946-2016), documenta os últimos dias do cineasta, explorando memórias e reflexões do diretor argentino naturalizado brasileiro. Babenco dirigiu O beijo da mulher aranha, que foi indicado em 1986 ao Oscar de melhor filme. Ele também foi indicado a melhor diretor.
Em reunião virtual realizada nesta manhã, o filme foi selecionado pelo Comitê de Seleção da ABC, composto por profissionais do audiovisual indicados pela academia. A entidade foi reconhecida oficialmente neste ano pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA como única responsável pela seleção. Até agosto, a ABC ainda atuava sob a supervisão da Secretaria do Audiovisual, vinculada ao governo federal. É a primeira vez que o governo federal não tem nenhuma participação no processo de escolha do indicado para concorrer a uma vaga no Oscar.
A atriz e diretora Bárbara PazFoto: picture alliance/dpa/Invision/J. C. Ryan
As relações entre o governo federal e a comunidade cinematográfica ficaram bastante desgastadas em 2016, após o filme O pequeno segredo ter sido selecionado para a disputa em detrimento do premiado Aquarius, de Kleber Mendonça Filho. À época, o cineasta acusou o governo Michel Temer de retaliação política por causa de críticas públicas ao presidente durante o Festival de Cannes.
Depois disso, a Secretaria do Audiovisual aumentou a participação da ABC no processo de escolha, até que a academia assumisse toda a tarefa em 2020.
Presidido por Viviane Ferreira (diretora e roteirista), o comitê da ABC que selecionou o documentário Babenco foi composto por André Ristum (diretor e roteirista), Clélia Bessa (produtora), Leonardo Monteiro de Barros (produtor de cinema e TV), Lula Carvalho (diretor de fotografia), Renata Maria de Almeida Magalhães (produtora) e Toni Venturi (diretor).
Na disputa, estavam outros 18 longas: A divisão, A febre, Alice Júnior, Aos olhos de Ernesto, Casa de antiguidades, Cidade pássaro, Jovens polacas, M8, Macabro, Marighella, Minha mãe é uma peça 3, Narciso em férias, Pacarrete, Pureza, Sertânia, Todos os mortos, Três verões e Valentina.
Em 2019, o documentário dirigido por Bárbara Paz foi premiado no 76º Festival Internacional de Cinema de Veneza, vencendo o Bisato D'Oro, prêmio da crítica independente, e também o prêmio de melhor documentário sobre cinema na mostra Venice Classics.
Em decorrência da pandemia, a 93ª edição do Oscar será realizada em 25 de abril de 2021, e não em fevereiro como ocorre normalmente.
A indicação para disputar uma das cinco vagas no Oscar não significa que o filme vá conseguir chegar à próxima cerimônia da premiação. Após cada país indicar um representante para a categoria, dois comitês ligados à Academia vão analisar os filmes e escolher os finalistas.
Há 20 anos o Brasil não consegue chegar a uma final do Oscar de melhor filme estrangeiro, categoria que foi rebatizada como prêmio de filme internacional a partir de 2020. O último longa brasileiro a disputar a estatueta nessa categoria foi Central do Brasil, em 1999.
Em 2019, Democracia em vertigem, da cineasta brasileira Petra Costa, foi um dos indicados ao prêmio de melhor documentário, sendo derrotado pelo americano American factory. Antes disso, Lixo extraordinário e O sal da terra, dois documentários com coprodução brasileira, haviam sido indicados ao Oscar em 2011 e 2015.
No ano passado, o candidato brasileiro a uma vaga na disputa pelo Oscar de melhor filme estrangeiro foi o longa A vida invisível, dirigido pelo cearense Karim Aïnouz, que acabou não sendo selecionado pela academia americana.
JPS/ots
A história do Brasil no Oscar
O Brasil levou a primeira estatueta por Melhor Filme Internacional. O país já teve diversas obras indicadas ao prêmio. Veja a trajetória de brasileiros na premiação.
Foto: Capital Pictures/IMAGO
"Orfeu negro"
Em 1960, "Orfeu negro", uma coprodução entre Brasil, França e Itália, ganhou a estatueta de melhor filme estrangeiro. Por representar a França, os louros ficaram com os europeus. Mas durante 65 anos foi o único filme de língua portuguesa a ganhar um Oscar.
Candidatos a melhor filme estrangeiro
Vencedor da Palma de Ouro em Cannes, "O pagador de promessas", de Anselmo Duarte, garantiu a primeira indicação para o Brasil, em 1962. Em 1995, a história de dois casais de imigrantes italianos vivendo sob o mesmo teto rendeu uma indicação a "O quatrilho", de Fabio Barreto. Dois anos depois, seu irmão, Bruno Barreto (foto), foi indicado na mesma categoria, por "O que é isso companheiro?".
Foto: picture-alliance/dpa
Melhor filme
Esnobado na categoria de filme estrangeiro, "O beijo da mulher aranha" (1985), coprodução com os EUA, foi o primeiro longa latino-americano indicado como melhor filme. A amizade entre um preso político (Raul Julia) e um homem homossexual (Will Hurt) em um presídio brasileiro também rendeu indicações de melhor roteiro adaptado e diretor (Hector Babenco). Hurt venceu como melhor ator.
Foto: 2015 ICRA LLC
"Central do Brasil"
Depois de levar o Urso de Ouro na Berlinale, "Central do Brasil", de Walter Salles, partiu para uma triunfante carreira internacional. Indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 1999, o drama sobre a amizade de um menino abandonado e uma mulher desiludida de meia-idade levou também a indicação inédita de melhor atriz para Fernanda Montenegro. Mas nenhum dos dois prêmios foi para o Brasil.
Foto: picture-alliance/dpa/Buena_vista
Melhor curta-metragem
Brasileiros ainda emplacaram duas indicações em melhor curta-metragem. Diretor de sucessos como "A era do gelo 2", o carioca Carlos Saldanha (foto) foi indicado, em 2002, pela animação americana "Gone nutty". "Uma história de futebol" também levou Paulo Machline aos finalistas do prêmio, em 2001. O curta recria passagens da infância de Pelé e de Zuza, seu companheiro de pelada na cidade de Bauru.
Foto: Charley Gallay/Getty Images
Melhor direção
Apesar do sucesso comercial no exterior, "Cidade de Deus" foi esnobado ao prêmio de filme estrangeiro em 2004. Mas o frenético retrato do crescimento do crime organizado na favela carioca teve indicações a melhor roteiro adaptado, melhor edição e melhor fotografia. Fernando Meirelles também foi indicado como melhor diretor, mas quem levou a estatueta foi Peter Jackson, por "O Senhor dos Anéis".
Foto: imago/United Archives
Melhor canção original
O primeiro brasileiro indicado ao Oscar foi o compositor Ary Barroso (foto), autor de "Aquarela do Brasil". Ele foi um dos finalistas ao prêmio pela canção "Rio de Janeiro", do filme "Brasil", em 1945 — uma produção americana. Mais de meio século depois, em 2012, Carlinhos Brown e Sergio Mendes voltaram a representar o país na categoria com "Real in Rio", parte da trilha sonora da animação "Rio".
Foto: Brasilianisches Nationalarchiv - Arquivo Nacional
Os pré-selecionados
Por anos, a seleção de inscritos na disputa pelo Oscar coube a uma comissão do Ministério da Cultura. Desde 1954, com "O cangaceiro", de Lima Barreto, foram mais de 45 títulos, mas só quatro ficaram entre os finalistas. Em 2014, "Hoje eu quero voltar sozinho" (foto), de Daniel Ribeiro, não conseguiu uma indicação. Desde 2021, a seleção passou a ser feita pela Academia Brasileira de Cinema.
Foto: D. Ribeiro
Melhor documentário
"O Sal da Terra", de Wim Wenders e Juliano Salgado, disputou o Oscar de melhor documentário em 2015. O filme retrata a história do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, pai de Juliano. O Brasil havia concorrido antes na categoria, em 2011, por "Lixo Extraordinário", que conta a história de um projeto social no aterro do Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro. Os filmes não foram premiados.
Foto: Wim Wenders/NFP*
Candidato em 2020
"Democracia em vertigem", da diretora Petra Costa, concorreu à estatueta de melhor documentário em 2020, mas perdeu o prêmio para "Indústria americana". O filme brasileiro, incluído na lista dos melhores do ano do "New York Times", aborda a ascensão e queda do PT e a polarização entre esquerda e direita no país. Foi a última produção brasileira a ser finalista do Oscar antes de 2025.
Foto: Netlix/Divulgação
"Ainda Estou Aqui" conquista Oscar de melhor filme internacional
"Ainda Estou Aqui" já tinha feito história ao ser indicado para três categorias do Oscar. Em 2025, conquistou a estatueta de melhor filme internacional. O filme de Walter Salles, sobre a ditadura, foi é a primeira produção totalmente brasileira a disputar o prêmio de melhor filme. Anora, de Sean Baker, venceu nas categorias de Melhor Filme e Melhor Atriz, pelas quais o Brasil também concorria.