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Brasil está deixando rios morrerem, diz estudo

Nádia Pontes de São Paulo
22 de março de 2019

Pesquisadores constatam que mais de 50 rios da Mata Atlântica estão impossibilitados de uso pela população. Situação piora anualmente, e muitos podem virar impróprios definitivamente.

O rio Paraopeba: praticamente morto após a tragédia de Brumadinho
O rio Paraopeba: praticamente morto após a tragédia de BrumadinhoFoto: DW/Marina Costa

Dono de 12% da água doce disponível no planeta, o Brasil sabe pouco sobre a qualidade de seus rios. Um dos raros projetos a fazer esse monitoramento - voluntário - mostra que a situação se agrava a ano a ano.

"A situação piorou. Embora a gente tenha um ponto ou outro com qualidade boa, em geral a gente está deixando os nossos rios morrerem”, afirma Romilda Roncatti, coordenadora do Projeto Observando Rios.

Capitaneada pela Fundação SOS Mata Atlântica, a iniciativa atua nos 17 estados brasileiros com áreas desse bioma. A nova análise divulgada nesta sexta-feira (22/03), Dia Mundial da Água, inclui dados de 220 rios brasileiros.

Segundo o relatório, feito a partir de 278 pontos de coleta, a maioria tem qualidade regular (74,5%). Foram classificados como ruins 17,6% dos pontos avaliados, e 1,4% está em péssimo estado.

"Isso se deve a fatores como falta de saneamento, descaso, falta de políticas públicas”, aponta Roncatti. "A quantidade de agrotóxicos que escorrem para os rios também é um agravante”, complementa.

O projeto, feito com 3500 voluntários, conclui que muitos rios estão "por um triz” e pode virar impróprios definitivamente. Dos 220, 53 foram considerados indisponíveis, ou seja, impossibilitado de uso pela população, entre eles o Iguaçu, Tietê, Paraopeba, São Francisco, Doce, Parnaíba, Paraíba do Sul, Jaguaribe, Sinos, Carioca e Mamanguape.

O Tietê, por exemplo, que corta a capital paulista, teve cinco dos nove pontos analisados classificados como regular. Os demais têm nível péssimo.

Apenas 6,5% dos rios observados apresentaram qualidade boa na média - nenhum tem qualidade ótima. "A floresta faz falta também. O desaparecimento da mata ciliar, que protege as margens dos rios, provoca assoreamento, leva toda a carga de agrotóxicos e lixo para suas águas”, aponta o relatório.

No país, o monitoramento das águas pelo governo nasceu, há quase 100 anos, com um objetivo: investigar o potencial para gerar energia elétrica. Foi só a partir da década de 1970, com a instalação de indústrias pelo território, que a qualidade das águas começou a ser considerada.

Atualmente, a ANA (Agência Nacional de Águas) opera uma rede com 1850 estações que fazem a medições em rios brasileiros. Dessas, 1634 medem vazão e 1625 têm sondas que avaliam parâmetros ligados à qualidade.

"A poluição por esgoto é o maior problema”, comenta sobre os resultados Marcelo Medeiros, superintendente da gestão da Rede Hidrometeorológica Nacional da ANA. "Existe também uma poluição difusa, provocada pela indústria, ou pelo manejo inadequado da agricultura”, comenta.

São raros os casos de rios monitorados de forma sistemática. O exemplo mais emblemático é o do rio Doce que, depois da tragédia em Mariana provocada pela barragem de rejeitos da Samarco, Vale e BHP, em 2015, se transformou na bacia mais vigiada do país.

Mais recentemente, devido a um novo rompimento da barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho, o rio Paraopeba, também em Minas Gerais, passou a ser acompanhado mais de perto pelas autoridades.

Os rejeitos da mineração que escorreram pelo Paraopeba a partir da barragem Córrego do Feijão, da Vale, já chegaram ao São Francisco. O alerta sobre a contaminação consta no relatório Observando Rios, da SOS Mata Atlântica.

Uma equipe do projeto percorreu a região em meados de março e analisou 12 pontos, de Brumadinho ao reservatório de Três Marias. A conclusão é que o trecho a partir do reservatório Retiro Baixo, entre Felixlândia e Pompéu, até o reservatório de Três Marias, no Alto São Francisco, está com água imprópria para a população.

Além da turbidez, os níveis de ferro, manganês, cromo e cobre estavam acima dos limites máximos estabelecidos na legislação, o que, segundo a ONG, significa que os rejeitos se misturaram ao São Francisco.

Para o Comitê de Bacias Hidrográficas do Rio São Francisco, as barreiras de contenção colocadas no rio Paraopeba pela Vale não foram eficientes. Numa reunião recente, Anivaldo Miranda, presidente do comitê, cobrou que a mineradora seja obrigada a contratar uma tecnologia mais moderna e apropriada.

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