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Brasil liderou desmatamento de florestas tropicais em 2022

27 de junho de 2023

Promessa do presidente Lula de combater o desmatamento ilegal até 2030 chamou a atenção da comunidade internacional. Mas meta pode trazer uma transformação real?

Incêndio em Novo Progresso, no Pará, na Floresta Amazônica
O desmatamento de florestas tropicais primárias aumentou no mundoFoto: Carl de Souza/AFP

Enquanto em 2015 o desmatamento no Brasil respondeu por pouco mais de um quarto da devastação de florestas tropicais primárias no mundo, essa parcela saltou para 43% em 2022, segundo relatório da plataforma Global Forest Watch (GFW) divulgado nesta terça-feira (27/06).

Quase 2 milhões de hectares de Floresta Amazônica foram perdidos somente no ano passado, fazendo com que o Brasil fosse de longe o país com maior taxa de perda de florestas tropicais primárias, seguido pela República Democrática do Congo e a Bolívia.

Foi a maior perda de árvores não relacionada a incêndios no Brasil desde 2005, aponta o levantamento da GFW, uma iniciativa da ONG World Resources Institute (WRI).

Grandes áreas da Amazônia foram cortadas para dar espaço para mineração e pastagens de gadoFoto: Bruno Kelly/REUTERS

Após quatro anos de desmonte na proteção ambiental sob o ex-presidente Jair Bolsonaro, Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o poder com a promessa de zerar o desmatamento na Amazônia até 2030.  Uma meta ambiciosa, comenta o pesquisador brasileiro Paulo Massoca, pós-doutorando na Universidade de Indiana Bloomington, onde estuda interações entre o homem e a natureza. "As pessoas estão desmatando para especular e ganhar dinheiro e, infelizmente, ainda hoje não valorizamos os recursos da floresta", afirma à DW.

Problema global

O desmatamento de florestas tropicais primárias aumentou 10% no mundo em 2022 em relação ao ano anterior, totalizando 4,1 milhões de hectares. Isso equivale a 11 campos de futebol por minuto, segundo o relatório da GFW. E a destruição está tendo um impacto devastador sobre o clima.

Florestas absorvem cerca do dobro de dióxido de carbono (CO2) do que emitem a cada ano. O relatório da GFW dedica-se especialmente a florestas tropicais pelo fato de elas serem as mais ameaçadas mundo afora, além de essenciais para alcançar metas climáticas por absorverem mais CO2 da atmosfera do que outros tipos de matas.

Ao serem destruídas, as florestas primárias liberam muito do CO2 que capturaram de volta para a atmosfera. A perda florestal nos trópicos emitiu 2,7 gigatoneladas de dióxido de carbono somente em 2022, o equivalente às emissões provenientes de combustíveis fósseis geradas pelo país mais populoso do mundo, a Índia, diz o relatório da GFW.

"Desde a virada do século, estamos vendo uma hemorragia dos mais importantes ecossistemas florestais do mundo, apesar de anos de esforços para reverter essa tendência", afirma Mikaela Weisse, diretora da Global Forest Watch.

"Os dados deste ano mostram que estamos perdendo rapidamente uma das nossas ferramentas mais eficazes para combater as mudanças climáticas, proteger a biodiversidade, a saúde e os meios de subsistência de milhões de pessoas", acrescenta.

Legado do governo Bolsonaro

A situação é particularmente grave no Brasil. A perda de floresta tropical primária aumentou 15% no país entre 2021 e 2022, o que significa um armazenamento menor de CO2. Uma destruição continuada pode levar a um ponto de não retorno, a partir do qual a maioria do ecossistema amazônico se transformaria numa savana, alerta o relatório da GFW.

Mas essa é uma tendência que, segundo especialistas, pode ser revertida no mandato do presidente Lula.

Nos primeiros cinco meses de 2023, o desmatamento na Amazônia caiu 31% em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

O governo do presidente Lula tem tentado fortalecer as organizações ambientais Foto: Ueslei Marcelino/REUTERS

Não está claro se as taxas de desmatamento continuarão caindo. Mas a bióloga Catarina Jakovac, da Universidade Federal de Santa Catarina, disse que já houve um fortalecimento do Ibama, que faz cumprir as leis ambientais na Amazônia.

"Nos primeiros três meses, já vimos um aumento no número de multas por crimes ambientais expedidas pelo Ibama. Isso é um indício de que Ibama está de volta e agora realmente combatendo o desmatamento. Estamos vendo essas mudanças e espero ver os resultados em breve", disse ela à DW.

Uma corrida contra o tempo

O presidente Lula tem uma história de sucesso na redução da derrubada de árvores na Amazônia. Durante seu primeiro mandato como presidente, entre 2003 e 2010, as taxas de desmatamento na floresta tropical caíram 80% antes de subir novamente, em 2012, segundo o Inpe.

Entre as medidas implementadas durante o primeiro governo do presidente Lula estão a ampliação de áreas protegidas, a demarcação de terras indígenas e o monitoramento da floresta. Para o cientista ambiental Massoca, o novo governo está se nutrindo da experiência do passado.

"O governo Lula retomou o processo de designação e demarcação de áreas protegidas e terras indígenas, reconhecendo a importância dessas ações para também proteger o meio ambiente e reconhecer os direitos dos povos e a importância das pessoas que vivem na região", afirma.

Mas é provável que isso demore. Os autores do relatório da GFW alertam que pode não haver progresso visível até pelo menos 2024. Isso dá ao Brasil apenas seis anos para cumprir a promessa feita sob Bolsonaro, e junto com mais de 140 outros países na Cúpula do Clima da ONU em Glasgow, de acabar com o desmatamento global até 2030.

O Brasil enfrenta um enorme desafio. Para a bióloga Jakovac, é importante estabelecer metas ambiciosas. Ela diz que também cabe à comunidade internacional ajudar a atingir a meta de desmatamento zero na floresta tropical mais importante do mundo.

Apesar de 60% da floresta amazônica estar dentro das fronteiras do Brasil, ela é a maior esperança do mundo no combate às mudanças climáticas. E para salvá-la, será necessário um esforço conjunto de países e pessoas ao redor do mundo, com investimentos de toda a comunidade internacional.

"[O Brasil] precisa de mais gente no terreno, precisamos de recursos... E também no papel de consumidora dos produtos que exportamos, a comunidade internacional não pode comprar produtos que vêm de terras desmatadas", apela.