Em entrevista, professor do King's College alerta para risco de se perpetuar círculo vicioso ao manter foco na figura do "grande líder" como salvador da nação, sem debater quem serão os representantes no Legislativo.
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Os ânimos à flor da pele no Brasil dificultam análises ponderadas sobre o momento político. Em entrevista à DW Brasil, Vinícius Mariano de Carvalho, professor de Estudos Brasileiros do King's College de Londres e diretor interino do King's Brazil Institute, alerta que o país corre o risco de perpetuar um círculo vicioso histórico, a despeito do momento ímpar propiciado pela Operação Lava Jato.
O foco do debate, segundo ele, continua sendo a eleição presidencial de 2018, e a sociedade segue apostando "no grande líder" para a salvação da nação. Nesse sentido, ele vê com preocupação tanto a ascensão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto a do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) nas mais recentes pesquisas de intenção de votos.
"Neste momento especial do Brasil, em que os maiores líderes do Congresso – que sustentaram os governos de Collor, de Fernando Henrique, de Lula, de Dilma – estão na berlinda, é importante pensar quem vai substituí-los", diz. "Quem serão os políticos que vão substituir Sarney, Renan Calheiros e todos os outros grandes caciques do Congresso?"
O professor comenta, ainda, as decisões do Supremo sobre as nomeações de Moreira Franco como ministro de Michel Temer e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apontando semelhanças e diferenças.
Sobre as instituições e as partidarizações políticas existentes dentro delas, faz uma análise realista e pragmática: "É ilusão querer acreditar que existem instituições acima do bem e do mal, sem opinião [...] A maturidade de uma instituição é a maturidade do eleitor e dos políticos".
Deutsche Welle: Como um observador à distância, como o senhor vê as decisões recentes sobre os casos de nomeação de Moreira Franco, no governo Michel Temer, e de Luiz Inácio Lula da Silva, no governo Dilma Rousseff, para ministérios?
Vinícius Mariano de Carvalho: Do ponto de vista de uma leitura externa, é muito fácil ver uma semelhança entre as duas situações. Não é uma opinião pessoal, mas a visão de um analista que estuda e que olha para o Brasil com cuidado neste momento.
Algumas diferenças fundamentais têm que ser levadas em conta. Quando o Lula foi indicado para ministro da Dilma ele já era investigado e estava indiciado pela Lava Jato. Já respondia pelo caso do triplex no Guarujá e também por relações com o BNDES e suposto tráfico de influência.
Isso é uma situação jurídica diferente da do Moreira Franco, que foi citado em delações premiadas. Ainda não se instruiu nenhum processo, ainda não há indiciamento contra ele, ele não é réu em nenhuma instância. Portanto, há uma diferença.
O que a Dilma fez, ao nomear o Lula, significava a possibilidade de que, como réu julgado na primeira instância, o caso fosse puxado para o Supremo. O Moreira Franco não é réu, mas obviamente sendo indiciado, agora já ministro, isso levará qualquer investigação contra ele para o Supremo.
Sob um ponto de vista ético, talvez a gente possa questionar a atitude. Mas, olhando praticamente, são dois casos diferentes.
O produto final das nomeações é dar foro privilegiado (a ambos), transferir investigações existentes ou que potencialmente poderão ser abertas para o Supremo. Como avalia os fatos sob o ponto de vista ético?
O foro privilegiado sempre funcionou, historicamente, como uma proteção aos indivíduos mais poderosos da República. É muito claro que, nas duas situações, haveria, se não uma proteção, ao menos uma protelação nos julgamentos. Isso porque os processos, no Supremo, normalmente levam mais tempo que um processo em primeira instância. Isso, sem dúvida nenhuma, é uma protelação e, portanto, questionável eticamente.
Temos que analisar se o STF tem sido, especialmente na Lava Jato, um organismo jurídico de proteção de autoridades ou se tem atuado realmente de forma autônoma e conseguido dar continuidade ao que a primeira instância tem feito. O STF tem evitado, também por uma questão de visão pública, contradizer os andamentos da Lava Jato.
Se aceitarmos que isso [foro privilegiado] é uma proteção aos indivíduos, ao Moreira Franco e ao Lula, estamos dizendo que o Supremo, por sua vez, é contrário à Lava Jato, quase como uma consequência.
Considerando o início da Lava Jato, em 2014, até agora, o STF tem conseguido manter a autonomia sem contradizer o rumo das investigações? É isso?
Estamos vivenciando no Brasil, pela primeira vez, três organismos – a Justiça Federal, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal – atuando em sintonia numa investigação que tem consequências imensas para o país. E essa autonomia tem sido garantida. Isso é muito positivo.
Não estou dizendo que o que vivemos no Brasil hoje é positivo. Pelo contrário. Estamos vivendo uma situação dramática em que é muito difícil antever o que pode acontecer na arena política em poucos meses. Mas o que estou dizendo é que as instituições têm atuado de uma forma como nunca vimos antes. Atuam em conjunto e com instruções muito criteriosas em torno das investigações da Lava Jato.
Sobre as instituições, um membro da Polícia Federal recomendou ao STF que indicie Lula e Dilma por obstrução à Justiça. É a visão de um membro da PF. É sabido que há partidarização dentro da PF e do Ministério Público, simpatias partidárias, dos dois lados. Essa partidarização compromete a Lava Jato?
Em todas as instituições há pessoas de um lado e de outro lado. A mesma polaridade que a gente vê no Brasil hoje também está dentro das instituições. A luta social, a luta política, a disputa travada na arena pública está dentro das instituições. Isso é natural. As pessoas são pessoas políticas, e qualquer atitude é uma atitude política. Nesse sentido, não vejo isso como algo negativo.
É ilusão querer acreditar que existem instituições acima do bem e do mal, sem opinião. A pluralidade de vozes dentro de uma instituição é natural e muito saudável. É o que garante, também, que elas atuarão democraticamente. Totalitarismo é pensamento único, e é isso que precisamos tentar evitar.
Situações como essa demandam um nível de institucionalização muito grande para que as instituições sejam capazes de dizer: isso é opinião de um delegado, ou de um procurador, ou de um juiz, mas não é a opinião da Polícia Federal, ou da Procuradoria-Geral da República, ou do Judiciário. Uma declaração da Polícia Federal é a declaração da Polícia Federal. Uma declaração de um advogado da PF é de um advogado da PF. A pluralidade está ali, e é a garantia de que há o espaço do debate.
O Brasil tem maturidade institucional para garantir essa pluralidade saudável nas instituições sem desvios de princípios republicanos das mesmas?
A maturidade de uma instituição é a maturidade do eleitor e dos políticos. Às vezes falamos nas instituições como se fossem indivíduos, não formadas por cidadãos. A única garantia que teremos de que estamos num regime democrático é cidadãos e políticos agirem democraticamente. É isso que garante a democracia das instituições.
Apesar do fulgor do debate, temos conseguidos manter esse dilema em níveis democráticos. Não estamos num regime ditatorial. Estamos numa disputa renhida, que tem muitos elementos sob os quais não sabemos o desdobramento.
É importante lembrar que é a primeira vez que, nessa disputa, baluartes da política brasileira por décadas estão sendo questionados por suas atitudes políticas e atitudes relacionadas à corrupção. Os grandes nomes da história republicana no Brasil, desde o fim da ditadura militar até agora, estão sendo confrontados e questionados. Isso é uma coisa única para o país, saudável e traumática.
Uma pesquisa recente de intenção de votos mostra que o ex-presidente Lula lidera todos os cenários da disputa presidencial, a despeito das investigações em curso. E, na outra ponta, cresce a extrema direita na figura de Jair Bolsonaro, à frente de nomes do PSDB. O que essas sondagens revelam, na sua opinião?
Essa onda de conservadorismo político, de pensamento de direita xenófobo e muitas vezes totalitário tem sido global neste momento, mas isso não exime o que está acontecendo no Brasil. O mais importante é que estamos discutindo os presidenciáveis e repetindo uma constante na história do Brasil, um aprendizado democrático que ainda não fizemos: estamos sempre focados na figura do grande líder, do grande condutor da nação.
O Lula incorpora isso. Quando o Bolsonaro vem com as atitudes de limpar a casa, essa coisa do grande pai, é, de novo, a incorporação do modelo "eu posso consertar as coisas". É um personalismo individualista que distrai de toda a dinâmica que uma democracia presidencialista tem.
Capítulos do desgaste político do governo
Ações do governo e de parlamentares aprofundam desgaste da população com políticos. Rejeição a governo Temer cresce, e acusações de suposto "acordão" para barrar Lava Jato alimentam crise política.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Queda do ministro do Trabalho
05/07: uma decisão do Supremo afastou o ministro do Trabalho, Helton Yomura de suas funções. Ele foi alvo de uma operação da Polícia Federal que investiga fraudes na concessão de registros para sindicatos. Yomura entregou o cargo no mesmo dia. Caio Vieira de Mello assumiu a pasta.
Foto: José Cruz/Agência Brasil
Greve dos caminhoneiros
21/05: uma greve nacional de caminhoneiros paralisou o Brasil por dez dias. O governo inicialmente não abordou o problema, deixando que a greve ganhasse força. No final, Temer cedeu a todas as exigências dos grevistas e abandonou a política de preços da Petrobras para segurar o preço do diesel. A medida derrubou as ações da Petrobras e levou à saída do presidente da empresa, Pedro Parente.
Foto: DW/N. Pontes
Prisão de amigos de Temer
29/03: uma operação da Polícia Federal prendeu dez pessoas, entre eles dois amigos do presidente Temer: o ex-assessor da Presidência José Yunes e o ex-coronel da PM João Baptista Lima Filho. Ambos foram apontados como operadores de propinas pagas a Temer. Na mesma operação foi preso o ex-ministro da Agricultura Wagner Rossi (MDB).
Foto: Reuters/U. Marcelino
Governo desiste da reforma da Previdência
16/02: uma das principais pautas de Temer, a PEC da reforma da Previdência foi definitivamente abandonada pelo Planalto após o decreto de intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro. A previsão é que a intervenção dure até o final do ano. Até lá, pelas regras constitucionais, nenhuma PEC pode ser aprovada. Antes mesmo do anúncio, o governo já enfrentava dificuldades para aprovar a reforma.
Foto: Agência Brasil/Antonio Cruz
Nomeação de ministra é suspensa
08/01: Após a saída de Ronaldo Nogueira do Ministério do Trabalho, o governo indicou para o seu lugar a deputada Cristiane Brasil. A posse, no entanto, foi suspensa por um juiz, que entendeu que a nomeação ofendia a “moralidade administrativa”. Brasil era acusada de empregar funcionários sem carteira assinada. Em fevereiro, diante do impasse, o partido de Brasil desistiu de insistir na indicação.
Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados
Câmara rejeita denúncia
25/10: Apesar da tentativa da oposição de esvaziar o plenário e adiar a votação, a Câmara dos Deputados rejeitou a segunda denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra o presidente da República, Michel Temer, pelo placar de 251 contra 233. A decisão livra novamente o presidente de uma investigação por parte do STF.
Foto: Reuters/A. Machado
Brasileiros veem aumento da corrupção
09/10: Para 78% dos brasileiros, o nível de corrupção aumentou no país nos últimos anos, segundo relatório da organização Transparência Internacional publicado em Berlim. Entre os 20 países analisados, o Brasil é o quarto da lista, atrás de Peru (79%), Chile (80%) e Venezuela (87%). Além disso, 56% dos brasileiros acham que o governo não combate a corrupção no setor público de forma satisfatória.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Popularidade despenca
28/09: Uma pesquisa do Ibope mostrou que a aprovação do governo Temer caiu para apenas 3%. Trata-se do menor índice obtido por um presidente desde o início da série histórica do instituto, em 1986. Antes de Temer, o pior havia sido José Sarney, que em junho/julho de 1989 ficou com 7%. A reprovação do governo Temer chegou a 77%.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Segunda denúncia contra Temer
14/09: O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou Temer por obstrução de Justiça e organização criminosa. A segunda denúncia envolvendo o presidente, enviada ao STF, se baseia na delação de executivos da JBS, bem como do operador Lúcio Funaro. Segundo Janot, Temer teria poder de decisão no chamado "quadrilhão do PMDB da Câmara", além de ter atuado para comprar o silêncio de Funaro.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
STF autoriza inquérito contra Temer
12/09: O ministro do STF Luís Roberto Barroso autorizou a abertura de inquérito para investigar Temer, o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures e dois empresários por acusações de corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro, em caso que envolve o chamado Decreto dos Portos. A defesa de Temer rechaçou as acusações e afirmou que as investigações têm o objetivo de enfraquecer o governo.
Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
PF vê indícios de crimes por Temer e ministros
11/09: Em inquérito que apura a suspeita de crimes praticados pelo PMDB da Câmara Federal, a Polícia Federal concluiu que "ficaram comprovados indícios da prática do crime de organização criminosa". Segundo a PF, integrantes da cúpula do partido "mantinham estrutura organizacional com o objetivo de obter vantagens indevidas em órgãos da administração pública direta e indireta".
Foto: Getty Images/AFP/E.Sa
Temer se salva, mas com Congresso dividido
02/08: Após uma ofensiva intensa para reagrupar forças junto aos parlamentares, Temer conseguiu se livrar do processo por corrupção passiva. A Câmara dos Deputados rejeitou a denúncia contra o presidente, com 263 votos contra o envio da matéria ao STF, e 227 a favor. Após a votação, Temer descreveu o resultado no plenário como "claro e incontestável".
Foto: picture-alliance/Photoshot
Líder do governo na Câmara condenado
01/08: A Justiça de Sergipe condenou o líder do governo Temer na Câmara, o deputado federal André Moura (PSC-SE), por improbidade administrativa, com a perda de seus direitos políticos por oito anos. A sentença menciona convênios fraudulentos e prejuízo de 1,4 milhão de reais ao patrimônio público.
Foto: Nilson Bastian/Câmara dos Deputados
Temer vence na CCJ, mas com manobras
13/07: A Comissão de Cidadania e Justiça (CCJ) da Câmara rejeitou o parecer que recomendava o avanço da acusação de corrupção passiva contra ele. Mas a vitória foi tática e impulsionada por uma série de manobras, com a distribuição de verbas e a substituição de membros da CCJ não considerados suficientemente leais ao Planalto.
Foto: Agência Brasil/Wilson Dias
Janot denuncia Temer
26/06: O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou o presidente Michel Temer ao STF pelo crime de corrupção passiva. É a primeira vez que um presidente da República é denunciado à Corte no exercício do mandato. A acusação tem como base uma investigação contra o peemedebista decorrente da delação de executivos da JBS. Ex-assessor Rodrigo Rocha Loures também foi denunciado.
Foto: Reuters/U. Marcelino
STF confirma delações
22/06: a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou a favor da manutenção da homologação do acordo de delação premiada dos executivos da empresa JBS. Os magistrados decidiram ainda que o relator Edson Fachin deve permanecer no caso. As delações causaram um terremoto político e colocaram Michel Temer no centro de um escândalo de corrupção.
Foto: Nelson Jr./SCO/STF
Primeira derrota
20/06: no mesmo dia em que Temer assistiu a uma apresentação de balé em Moscou, a bandeira reformista do governo sofreu uma derrota significativa. O projeto que prevê mudanças na legislação trabalhista foi rejeitado por uma comissão do Senado, graças a uma combinação de indiferença e abandono de alguns membros da base aliada.
Foto: picture-alliance/Estadao Conteudo/A. Dusek
Viagem à Rússia e Noruega
20/06: numa conturbada semana, para passar uma imagem de "normalidade", Temer viaja à Rússia e Noruega, onde destaca melhora na economia do Brasil. Em Moscou, o presidente se reuniu com Putin para estreitar os laços entre os países. Em Oslo, foi alvo de críticas. A premiê norueguesa expressou preocupação com a Lava Jato e o desmatamento no Brasil.
Foto: Picture alliance/dpa/A. Nikolsky/TASS
Presidente acusado por corrupção
19/06: em relatório preliminar entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a investigação envolvendo Michel Temer e seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, a Polícia Federal (PF) acusa o presidente pelo crime de corrupção passiva, mas pede um prazo maior para concluir o inquérito referente aos delitos de organização criminosa e obstrução de Justiça.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Processo no TSE
09/06: A decisão do Tribunal Superior Eleitoral de absolver a chapa Dilma-Temer deu sobrevida ao governo, mas não lhe ajudou muito a melhorar a imagem perante a opinião pública: a vitória por 4 votos a 3 só se deu porque os depoimentos da Odebrecht e dos marqueteiros do PT não foram levados em conta no processo.
03/06: o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-assessor especial do presidente Michel Temer, foi preso pela Polícia Federal em Brasília. A detenção
abriu mais uma frente para o governo: Loures foi apelidado de "homem da mala" pela imprensa após ter sido filmado carregando 500 mil reais entregues por um emissário da empresa JBS.
Foto: Wikipedia/R. Theodorovy
Presidente acusado de obstrução à Justiça
17/05: Revelação de conteúdo de diálogo entre o presidente Temer e o empresário Joesley Barbosa, da JBS, mergulha país no caos e ameaça governo. Presidente, segundo reportagem do jornal "O Globo", teria consentido com pagamento de mesada para comprar o silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, preso em outubro de 2016.
Foto: imago/Agencia EFE
O preço alto das reformas
05/05: Diante da obsessão do governo em aprovar com celeridade a aprovação das reformas da previdência e trabalhista, Palácio do Planalto teria dado aval à aprovação de medidas para negociar dividas fiscais de empresas com a Receita Federal e também cede a interesses da bancada ruralista.
Foto: Luis Macedo /ABr
Cúpula arrastada para o caos
11/04: O relator da Lava Jato no Supremo, ministro Luiz Edson Fachin, pede abertura de inquérito contra 76 políticos, entre os quais oito ministros do governo Temer, entre eles Eliseu Padilha (PMDB, Casa Civil, na foto com Temer), Moreira Franco (PMDB, Secretaria-Geral da Presidência); Helder Barbalho (PMDB, Integração Nacional); e Aloysio Nunes (PSDB, Relações Exteriores).
Foto: Getty Images/AFP/E.Sa
Machismo no Planalto?
08/03: Declarações do presidente na ocasião do Dia Internacional da Mulher provocam perplexidade na sociedade brasileira e no exterior, e indignação de movimentos feministas. Presidente citou a mulher, Marcela Temer, ao analisar a importância da figura feminina na educação dos filhos e no controle do orçamento familiar, nas compras de supermercado, relegando a mulher a atividades domésticas.
Foto: Getty Images/AFP/M. Sharma
A blindagem sob o comando de Romero Jucá
15/02: O senador Romero Jucá (PMDB-RR), braço-direito de Temer no Congresso, protocola emenda constitucional para blindar presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB). Pela regra, eles só poderiam ser responsabilizados por atos cometidos no exercício de seus mandatos. Ou seja, seriam blindados de investigações da Lava Jato. Diante do constrangimento, Jucá recuou.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
A aula de fisiologismo de Eliseu Padilha
14/02: O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, diz em palestra flagrada pelo jornal "Estado de S.Paulo" que os ministérios de Temer foram montados para garantir votos no Congresso. Ele diz que havia intenção de nomear "notáveis" e citou como exemplo a Saúde. O PP indicou o deputado Ricardo Barros. "Vocês garantem todos os nomes do partido em todas as votações? Então o Ricardo será o notável."
Foto: Wilson Dias/Agencia Brasil
Caso Marcela: a censura de Temer à imprensa
10/02: A pedido da Presidência, Justiça proíbe o jornal "Folha de S.Paulo" de divulgar dados sobre a chantagem de um hacker contra Marcela Temer, a primeira-dama. O hacker, condenado a 5 anos e 10 meses de prisão, clonou o celular de Marcela e disse ter acesso a um áudio que comprometeria o presidente. A investigação foi coordenada por Alexandre de Moraes, depois nomeado ministro da Justiça.
Foto: Imago
Nomeação de Moraes para o Supremo
06/02: O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes (PSDB), é indicado para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal. Havia a expectativa de que Temer indicaria um nome técnico, do meio jurídico, não ligado à política. A enorme proximidade de Moraes com Temer tornou a indicação bastante polêmica, já que ele será o revisor da Lava Jato no Supremo, e Temer foi citado 44 vezes em delações.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Foro privilegiado para Moreira Franco
03/02: Temer dá status de ministro a Moreira Franco, que era secretário-executivo do Programa de Parceria de Investimentos. Ele virou ministro da Secretaria-Geral da Presidência. Citado 34 vezes em delações da Lava Jato, com o codinome "Angorá", Franco passa a ter foro privilegiado, ou seja, só pode ser julgado pelo Supremo. Pela demora dos julgamentos, o foro é visto como benefício a políticos.
Foto: Reuters/A. Machado
Novos ministérios: a contradição
03/02: No dia em que nomeou Moreira Franco ministro, Temer anunciou a criação de outro ministério, o de Direitos Humanos, entrando em rota de colisão com o discurso antes da posse. Tanto o presidente quanto seu partido, o PMDB, defenderam o enxugamento da máquina e a redução das pastas e criticavam o número de ministérios sob Dilma Rousseff. O governo tem hoje 28 pastas. Sob Dilma, tinha 32.
Foto: Wilson Dias/ABr/CC BY 3.0 BR
Senado e Câmara X Lava Jato
01/02: O senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) é eleito sem dificuldades para a presidência do Senado, com os votos de 61 dos 81 senadores. Na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) derrota grupo ligado a Eduardo Cunha (PMDB), preso na Lava Jato, e permanece na presidência da Casa. Os dois foram eleitos em sintonia com o Palácio do Planalto. Ambos tiveram os nomes citados em delações da Lava Jato.
Foto: Reuters/A. Machado
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No Brasil precisamos começar a repensar a formação de líderes em níveis municipais e estaduais até chegar a líderes políticos que representem os estados no Congresso. Nosso espectro de democracia é focalizado na figura do presidente, como se fosse ele o resolvedor de todos os problemas da nação. Isso é primitivo do ponto de vista da compreensão do que é uma república presidencialista. Vejo com preocupação tanto a ascensão do Bolsonaro como a do Lula.
Neste momento especial do Brasil, em que os maiores líderes do Congresso, e que sustentaram os governos de Collor, de Fernando Henrique, de Lula, de Dilma, e que agora estão na berlinda, é importante pensar quem vai substituí-los. Quem serão os políticos que vão substituir Sarney, Renan Calheiros e todos os outros grandes caciques do Congresso? Essa é a minha preocupação fundamental.
Não estamos discutindo, nos estados, quem é que está ascendendo como candidato a deputado. Nós menosprezamos isso. E é neste núcleo exatamente que reside a sustentabilidade de um governo. Se Lula fosse eleito hoje, quem seria o Congresso que o apoiaria? Vamos repetir, de novo, a necessidade de um PMDB?
Não importa se foi Collor, se foi Itamar Franco, se foi Fernando Henrique, se foi Lula ou se foi Dilma. Há um núcleo político dentro do Congresso que permaneceu lá esse tempo todo. Nós não discutimos esse núcleo, e eles continuaram a ser eleitos. Estamos repetindo o modelo.
Uma mudança no sistema político eleitoral poderia ajudar? Esse debate ainda é tímido no Brasil, talvez passe a cláusula de desempenho.
Principalmente o voto distrital [ajudaria]. São essas as questões cruciais que temos que trazer à tona. A representatividade parlamentar no Brasil é manca, esquizofrênica e isso é muito problemático. O eleitor não se lembra em quem votou para deputado.
Aqui na Inglaterra, os eleitores ingleses falam "my MP (member of Parliament)", ou seja, o meu deputado. E quando há uma votação crucial no Parlamento eu escrevo para o "meu deputado".
No Brasil, nós elegemos o grande líder e está depositado nas mãos dele, ou dela, a salvação nacional. E se não ocorrer a salvação, temos que arrumar uma desculpa.Ou trocar o líder e tentar o próximo.
O senhor é otimista ou pessimista sobre o futuro do Brasil?
São duas palavras que tenho tentado evitar. Mas vejo com muita preocupação, principalmente porque é um momento de opiniões extremas e poucas reflexões. Não vou dizer nada sobre o futuro, porque, no Brasil, a gente sabe que até o passado pode mudar.
Não tenho nenhuma perspectiva do que poderá acontecer em alguns meses ou em algumas semanas. Vivemos uma grande instabilidade, e acho que é um momento muito importante para que lideranças sociais, políticas, intelectuais e institucionais tentem vislumbrar o que queremos enquanto país. Isso eu tenho visto muito pouco. Tenho visto um debate muito feroz, mas muito pouco propositivo.
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.