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Brasil vence com "golpe de gênio" e "cabeça fria"

Marcio Weichert26 de junho de 2002

Para imprensa alemã, gol de Ronaldo e calma da defesa garantiram vitória sobre Turquia e decisão com times dignos de mundial. Semifinal foi "um dos melhores jogos" da Copa. Na Alemanha, Polícia tem tarde tranqüila.

Ronaldo chuta na saída do goleiro Rustu e assegura recorde à Seleção BrasileiraFoto: AP

A Alemanha recebeu com satisfação a vitória brasileira de 1 a 0 sobre a Turquia, nesta quarta-feira, em Saitama (Japão), na segunda semifinal da Copa do Mundo. Tanto a imprensa, quanto as autoridades. "Nada contra a Turquia. Mas finalmente chegou a hora. Alemanha e Brasil. Adeus às miragens", escreveu aliviado Thomas Häberlein, redator da agência esportiva alemã SID, referindo-se ao fim da linha para as numerosas zebras deste mundial.

"Final dos sonhos! Agora vamos dançar samba", diz o dúbio título do jornal Bild em sua versão online. O diário de maior circulação na Alemanha destaca que a vitória "quase sem esforço" levou o Brasil a bater um recorde: chegar três vezes consecutivas à final de uma copa do mundo.

O Bild acrescenta que a decisão em Yokohama será por si só um encontro de recordes. "Pela sétima vez, a Alemanha está na final; o Brasil, pela sexta. A tricampeã Alemanha poderá igualar-se ao Brasil como tetra", lembra o jornal, ignorando que a seleção canarinho tentará o penta. O periódico sensacionalista ainda ressalta: "Tudo depende de como terminará o duelo entre o melhor goleiro do mundo, Oliver Kahn, e o melhor jogador do mundo de 1996 e 1997, Ronaldo".

Enfim, o grande duelo

Häberlein, da SID, bate na mesma tecla. As duas equipes que mais partidas já disputaram em copas irão finalmente se enfrentar num mundial. Depois de o destino impedir os duelos Pelé-Beckenbauer, Sócrates-Rummenigge e Romário-Völler, chegou enfim a hora da "batalha dos titãs", com "Klose contra Ronaldo, ou melhor, Oliver Kahn contra todos".

O comentarista da agência esportiva apresenta em sua análise um dado que quase toda a imprensa alemã prefere ignorar. Na verdade, Brasil e Alemanha já estiveram frente à frente num mundial. Em 1974, quando o país europeu vivia dividido em dois Estados e a seleção canarinho derrotou a da Alemanha Oriental por 1 a 0. Mas para os alemães ocidentais – que fazem a opinião no país – uma equipe da outrora parte comunista não conta.

Uma das melhores partidas

Os alemães são unânimes na avaliação do jogo desta quarta-feira. "Após uma boa fase inicial da Turquia, o Brasil assumiu o controle do jogo e ficou em vantagem logo após o intervalo. Depois, o Brasil manteve-se firme na defesa, contra-atacou com perigo e deixou de ampliar o placar por deficiência nas conclusões", escreveu a revista esportiva Kicker em seu site na internet.

"Que os brasileiros não são uma superequipe, eles mostraram contra os turcos. (...) Enquanto os turcos convenceram, com uma equipe determinada, e comprovaram a justiça de estar na semifinal, os brasileiros só se destacaram mais uma vez pelas atuações individuais. (...) Ambas as equipes começaram muito cuidadosas, mostrando muito respeito pelo adversário. Após 20 minutos, os turcos deram o sinal de partida para uma das melhores partidas desde as oitavas-de-final", comenta a agência de notícias DPA, referindo-se à cabeçada de Alpay que obrigou Marcos a uma grande defesa e que teve como resposta uma avalanche de ataques brasileiros.

Para a DPA, "um golpe de gênio de Ronaldo aplainou o caminho do Brasil para a final". Já a agência SID relata assim o que veio depois: "Diante dos consecutivos e furiosos ataques dos turcos, os brasileiros mantiveram a cabeça fria. Até aproveitaram com contra-ataques os espaços abertos, mas desperdiçaram chances excelentes de antecipar o desfecho do jogo".

Rivaldo, o "arrogante"

Curiosamente, o alemão que desde antes do mundial aposta no penta dos brasileiros numa final com a Alemanha, foi quem mais caprichou nas críticas ao desempenho do time de Felipão contra a Turquia. "Como antes, falta algo que seria de se esperar de uma Seleção Brasileira em plena forma. Eu gostaria de ver mais criatividade no meio de campo. (...)", cobrou o ex-jogador Paul Breitner.

O campeão mundial de 1974 alfinetou especialmente Rivaldo, por "sua arrogância". "Em 15 minutos, ele desperdiçou quatro, cinco chances claras de gol, simplesmente porque não quis ver jogadores melhores posicionados e preferiu aumentar sua própria conta de gols, em vez de definir logo o placar. A Seleção Alemã pode se beneficiar disto", acrescentou o hoje comentarista de futebol na tevê.

Mas Breitner também teve elogios. "A grande melhora na equipe brasileira hoje coube à defesa. Ela só deu uma chance e meia aos turcos. Para o padrão brasileiro, é extraordinariamente bom", concluiu.

Derrota turca, alívio para Polícia

Ao contrário dos últimos dias de jogos, as grandes cidades alemãs tiveram uma tarde tranqüila nesta quarta-feira. Com a vitória brasileira, os dois milhões de turcos que vivem no país entraram de luto. Muitos deixaram os bares e foram para casa antes do fim do jogo. Preparada para evitar tumultos no trânsito como no sábado passado e arruaças como as da véspera, a Polícia alemã praticamente não teve o que fazer. Tal como nas vezes anteriores, a festa brasileira concentrou-se em bares e restaurantes latino-americanos.

Na fábrica da Ford, em Colônia, na qual 4300 operários – 20% do total – são turcos, os funcionários puderam acompanhar o andamento do jogo através de informações quase em tempo real num quadro eletrônico, o qual normalmente apresenta dados sobre a produção. Muitos dos operários vestiam camisas da seleção turca sob os macacões da fábrica. Mas quem comemorou mesmo ao apito final foram os três únicos brasileiros empregados naquela unidade da montadora.

A vitória dos tetracampeões trouxe alívio às autoridades alemãs. "Em vista daquilo que ocorreria nas ruas alemãs no domingo, acho o Brasil um adversário até mais fácil", observou Walther Tröger, presidente do Comitê Olímpico Alemão (NOK). "Brasil era meu adversário predileto. Acho que a Turquia seria desconfortável", comentou o deputado social-democrata Friedhelm Julius Beucher, presidente da Comissão de Esportes do Parlamento federal.

Temia-se que uma final contra a Turquia transformasse as ruas do país em campos de batalha, diante do sangue quente e do patriotismo exacerbado dos turcos em contraponto à violência racista e xenófoba de alguns alemães.