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Câmara aprova urgência de projeto que criminaliza institutos

19 de outubro de 2022

Em meio à ofensiva do Planalto contra pesquisas eleitorais, Câmara dá caráter de urgência para projeto que prevê até dez anos de prisão para responsáveis por sondagens que divergirem do resultados das urnas.

Congresso brasileiro
Foto: Reuters/P. Whitaker

A menos de duas semanas para o segundo turno das eleições, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (18/10) a tramitação em regime de urgência de projetos de lei que tentam criminalizar pesquisas eleitorais, em meio a uma ofensiva do Planalto e de políticos aliados contra institutos de sondagens. Foram 295 votos a favor, 120 contra e uma abstenção.

A classificação de urgência permite a votação de um projeto diretamente em plenário, sem precisar passar por comissões e outras formalidades, ganhando prioridade na fila de propostas que aguardam apreciação.

No entanto, por causa de divergências entre as bancadas sobre a linha que deve ser adotada contra os institutos de pesquisa, não há expectativa que qualquer proposta seja aprovada antes do fim do segundo turno.

Um dos projetos em tramitação na Casa sobre o tema, foi elaborado em 2011 pelo deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), e estabelece multa de até R$ 1 milhão para o crime de divulgação de pesquisas fraudulentas, dando uma nova interpretação sobre o que pode ser considerado fraude. Pelo texto, uma pesquisa pode ser caracterizada como "fraudulenta" quando mostrar resultados acima da margem de erro quando confrontada com a apuração oficial e quando a sondagem foi divulgada até cinco dias antes da eleição.

O outro projeto foi elaborado pelo líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Pela redação de Barros, responsáveis por pesquisas divulgadas nos 15 dias que precederam um pleito e cujos resultados divergirem mais do que a margem de erro em comparação com os resultados das urnas podem ser punidos com 4 a 10 anos de prisão.

Pelo texto, ficariam sujeitos à penalização o estatístico responsável pela pesquisa, o responsável legal do instituto de pesquisa e o representante legal da empresa contratante.

Tramitação em regime de urgência

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, além de ignorar a natureza das pesquisas eleitorais, que não é a de antecipar a contagem das urnas, o projeto de Barros parte do falso pressuposto de que a intenção de votos não passa por mudanças nos 15 dias anteriores a um pleito. Segundo o Datafolha, em 2018, 18% escolheram o candidato para presidente no final de semana da eleição.

Pela votação desta terça-feira, os dois projetos foram juntados ao lado de outras iniciativas que também miram institutos de pesquisa. Agora, todos passam a tramitar em regime de urgência.

A urgência foi aprovada com  votos de deputados do PP, PL, União Brasil, PSD, Republicanos, PSDB, Podemos, PSC, Novo, Solidariedade, Cidadania, Avante, Patriota, PROS, PV e PTB. Já deputados do PSOL, Rede e PT foram orientados a votar contra.

Apesar da aprovação do regime de urgência, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), um dos críticos aos institutos de pesquisa, não conseguiu fechar um acordo com partidos da base do governo para votar uma das propostas, já que ainda há divergências sobre o teor.

Segundo a Folha de S.Paulo, há uma ala que defende que o texto foque na proibição de divulgação de pesquisas nos 15 dias que antecederem eleições. Outra ala, por sua vez, prefere punições na esfera civil — e não na penal — a institutos que divulguem pesquisas que divirjam duas ou três vezes acima da margem de erro em relação ao resultado das urnas.

Os projetos ainda devem enfrentar dificuldades no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já disse que o projeto de penalizar institutos é "absolutamente inadequado", apontando que as penas previstas seriam maiores do que em crimes de peculato e corrupção.

Mesmo o autor de uma das propostas, o deputado Rubens Bueno, afirmou ser contra o projeto de Barros.

A iniciativa de aliados do governo na Câmara se soma a outras medidas que vêm sendo tomadas pelo Planalto e por membros da base.  Na semana passada, o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Alexandre Cordeiro, e o ministro da Justiça, Anderson Torres, chegaram a iniciar investigações contra institutos, mas a medida foibarrada pelo ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que apontou "incompetência absoluta" dos órgãos para uma apuração do gênero durante o período eleitoral.

O senador bolsonarista Marcos do Val (Podemos-ES), por sua vez, conseguiu reunir assinaturas para a instalação de uma CPI das Pesquisas. Mas um acordo anterior entre as bancadas do Senado já estabeleceu que novas comissões só poderão ser abertas após o período eleitoral.

Pesquisas x resultados

O resultado do primeiro turno surpreendeu e gerou críticas a institutos de pesquisa, já que os últimos levantamentos do Datafolha e do Ipec antes do pleito, divulgados na véspera da votação, apontavam Lula 14 pontos percentuais à frente de Bolsonaro. Pesquisas anteriores também vinham indicando ampla vantagem do petista.

No entanto, após a contagem de votos, a vantagem de Lula foi de cerca de cinco pontos percentuais. Com 100% das urnas apuradas, Lula recebeu 48,43% dos votos, Bolsonaro, 43,2%.

Em entrevista à DW, o diretor de amostragem do Survey Research Center da Universidade de Michigan (EUA) e membro da American Association for Public Opinion Research (Aapor), Raphael Nishimura, disse que tratar as pesquisas eleitorais como oráculo não faz sentido.

"Não tem como a gente dizer que pesquisas pré-eleitorais erram ou acertam o resultado das eleições. Elas são um retrato do momento", explica o estatístico.

Como possíveis explicações para a diferença dos resultados da pesquisa e do que foi visto nas urnas, Nishimura cita que uma parte do eleitorado pode ter mudado o voto em cima da hora, depois das últimas sondagens. O não comparecimento de 20% é outro ponto difícil de considerar nos levantamentos. A terceira hipótese é de um viés de não resposta por parte de eleitores pró-Bolsonaro que desconfiam dos institutos.

jps (ots)

 

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