Câmara aprova urgência para projeto de lei da anistia
18 de setembro de 2025
Votação acelera tramitação da proposta, que vai agora direito para o plenário. Deputados devem definir ainda texto que será votado, com anistia total ou apenas redução de penas para envolvidos nos atos golpistas.
Requerimento de urgência do PL da anistia foi aprovado na Câmara por 311 votos a favor, 163 contrários e 7 abstençõesFoto: Gustavo Basso/DW
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A Câmara dos Deputados aprovou em plenário na noite desta quarta-feira (17/09), um requerimento de urgência em favor de um projeto que concede anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
O requerimento de urgência – aprovado por 311 votos a favor, 163 contrários e 7 abstenções – acelera a tramitação do projeto de lei e prevê a eliminação ou redução de prazos e formalidades regimentais, permitindo que o texto seja votado diretamente em plenário em qualquer momento sem precisar passar pelas comissões. Ainda não há uma data prevista para a votação.
A partir de agora, a Câmara decidirá entre uma anistia ampla e irrestrita que incluiria o ex-presidente Jair Bolsonaro ou uma redução das penas aos condenados pelos atos golpistas.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidiu colocar o projeto em pauta após uma reunião com líderes da oposição. Após a votação, ele afirmou que o avanço da pauta na Câmara era uma tentativa de apaziguar as tensões em Brasília. "O Brasil precisa de pacificação. Não se trata de apagar o passado, mas de permitir que o presente seja reconciliado e o futuro construído em bases de diálogo e respeito. Há temas urgentes a frente e o país precisa andar."
Motta designará nesta quinta-feira um relator para o projeto, visando a elaboração de um texto substitutivo buscando o "apoio da maioria ampla da Casa".
Anistia ampla ou redução das penas
O projeto de lei, de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), concede anistia a "todos os que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas, entre o dia 30 de outubro de 2022 e o dia de entrada em vigor desta lei".
Ainda não está claro se o projeto de lei anistiará ou não Bolsonaro. Uma eventual redução das penas aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 também incluiria o ex-presidente e os demais condenados pela trama golpista no STF.
O texto que serviu como base para a aprovação da urgência prevê o perdão aos que cometeram crimes políticos, eleitorais e conexos, além dos previstos no Código Penal, e atinge medidas que restringem direitos, como bloqueios em redes sociais. O projeto de lei visa também estender a anistia às multas aplicadas pela Justiça Eleitoral ou pela Justiça Comum contra pessoas físicas ou jurídicas associadas aos atos golpistas.
Porém, ainda não está definido o texto sobre a anistia que será votado. A proposta original deve sofrer alterações antes de ir para o plenário.
Troca na relatoria
Motta indicará um novo relator para o PL, em substituição ao deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o que deve acarretar mudanças significativas no texto proposto.
O nome mais cotado é o de Paulinho da Força (SD-SP), por sua proximidade com alguns juízes do STF, incluindo o Alexandre de Moraes, e por ter interlocução com o grupo parlamentar do chamado Centrão.
Ao anunciar a troca na relatoria, Motta disse que o responsável por negociar o texto vai propor uma solução que pacifique o país, com "respeito às instituições, o compromisso com a legalidade e levando em conta também as condições humanitárias das pessoas que estão envolvidas nesse assunto".
PL da anistia poderá reduzir pena de prisão de Jair BolsonaroFoto: Sergio Lima/AFP
"Rendição ao golpismo"
Enquanto parlamentares bolsonaristas celebravam o que chamaram de "dia histórico" na Câmara, os governistas criticaram a votação como uma "rendição ao golpismo".
"É um dia triste para a democracia brasileira. Em um momento em que as instituições deveriam ser fortes, vimos o contrário ali dentro, uma rendição a esses golpistas", afirmou o líder do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara, Lindbergh Farias.
Lindbergh disse que quem votasse a favor do requerimento estaria comprometendo a sua biografia. Se dirigindo diretamente a Motta, ele afirmou que que "a turma que te desrespeitou, que não foi punida, está aí comemorando", se referindo ao grupo de parlamentares que ocupou a mesa da Câmara durante dois dias após a decretação da prisão domiciliar de Bolsonaro, impedindo os trabalhos da Casa.
"Os senhores ao votarem na anistia estão sendo cúmplices de um golpe de Estado continuado", criticou o petista. "Não estão pacificando nada. Vocês estão abrindo caminho para a extrema direita atacar as instituições."
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"Anistia não é para pessoas e sim para atos"
O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante, criticou o que chamou de julgamento "injusto, político e que persegue opositores" por parte dos governistas e defendeu a extensão da anistia a Jair Bolsonaro.
"Anistia não é para pessoas e sim para os atos. Vamos discutir pelos acontecimentos e nunca por pessoas, acho desnecessária essa discussão, se está com Bolsonaro ou não, até porque não vai ter nome de nenhuma pessoa na anistia, vamos anistiar os atos", afirmou.
"Vamos lutar porque o presidente Bolsonaro não é melhor nem pior que todos os injustiçados de uma trama que nunca existiu e com penas absurdas", disse Sóstenes. "O placar elástico acima do quórum de PEC mostra a sensação da Casa de que houve exageros enormes, injustiças e constitucionalmente cabe ao Congresso votar ou aprovar anistia."
Após a aprovação da urgência, já é esperada uma reação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo apurou o jornal Folha de S. Paulo, parlamentares teriam sido alertados de que o Executivo poderia rever indicações de cargos na estrutura federal a quem apoiasse o projeto de lei. Lula, inclusive, já sinalizou que vetaria uma eventual anistia a Bolsonaro.
Uma pesquisa do Datafolha realizada nos dia 8 e 9 de setembro afirma que 54% dos brasileiros é contra a anistia para Jair Bolsonaro, com 39% a favor.
rc/cn (EBC, ots)
Ex-presidentes latino-americanos que já foram presos
A prisão domiciliar de Bolsonaro não é um caso isolado na América Latina. Mais de uma dúzia de líderes de outros países da região, como Argentina, Honduras, Peru e Panamá também enfrentaram problemas com a Justiça.
Foto: Alan Santos/Brazilian Presidency/REUTERS
Jair Bolsonaro (Brasil)
Acusado de liderar uma trama golpista após a eleição de 2022 e réu em diferentes ações na Justiça, o ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022) teve decretada prisão domiciliar em agosto de 2025 após ser acusado de violar medidas cautelares impostas pelo Supremo, como a proibição de usar redes sociais.
Foto: Evaristo Sa/AFP
Michel Temer (Brasil)
Presidente entre maio de 2016 até o fim de 2018, Michel Temer foi preso em março de 2019, poucos meses depois de deixar o cargo, no âmbito de um desdobramento da Lava Jato. Foi solto quatro dias depois, mas voltou a ser preso por mais seis dias em maio de 2019. O caso foi posteriormente anulado pela Justiça.
Foto: Imago Images/Agencia EFE/F. Bizerra Jr
Fernando Collor (Brasil)
Presidente entre 1990 e 1992, Collor foi condenado por corrupção pelo Supremo em maio de 2023, em um processo que teve origem na Operação Lava Jato. Em abril de 2025, foi levado a um presídio em Maceió, no estado de Alagoas, para cumprir pena de 8 anos e 10 meses de prisão. Seis dias depois, passou a cumprir pena em casa.
Foto: EVARISTO SA/AFP
Lula (Brasil)
Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, passou 580 dias na prisão entre abril de 2018 e novembro de 2019, após ser condenado por corrupção. Em março de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as duas sentenças por irregularidades processuais cometidas pelo Ministério Público e pelo juiz do caso. Assim, conseguiu disputar a eleição de 2022, na qual derrotou Jair Bolsonaro.
Foto: Reuters/R. Buhrer
Cristina Kirchner (Argentina)
Ex-presidente da Argentina (2007-2015) e ex-vice (2019-2023), Cristina Kirchner teve em junho de 2025 uma pena de seis anos de prisão por corrupção confirmada pela Suprema Corte. No mesmo mês, começou a cumprir prisão domiciliar - a a lei argentina que prevê essa possibilidade para pessoas com mais de 70 anos.
O presidente argentino Carlos Menem (1989-1999) enfrentou diversos processos. Em seu primeiro julgamento, em 2008, foi acusado de tráfico de armas para o Equador e a Croácia entre 1991 e 1995. Passou seis meses em prisão domiciliar preventiva em 2001, e foi solto depois que a Justiça anulou as acusações. A partir de 2005, teve imunidade como senador, cargo que ocupou até sua morte em 2021
Foto: Ricardo Ceppi/Getty Images
Jeanine Áñez (Bolívia)
Jeanine Áñez assumiu a presidência interina da Bolívia em 12 de novembro de 2019 como segunda vice-presidente do Senado, dois dias após a renúncia de Evo Morales. Ela foi detida em 13 de março de 2021, e numa decisão polêmica, um tribunal a condenou a 10 anos de prisão pelos crimes de violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição. Em agosto de 2025, ele continuava presa
Foto: Juan Karita/AP Photo/picture alliance
Ricardo Martinelli (Panamá)
Ricardo Martinelli, que governou o Panamá de 2009 a 2014, foi preso em junho de 2017 na Flórida. No ano seguinte, foi extraditado para ser julgado em seu país num caso sobre escutas ilegais, do qual foi posteriormente absolvido. Em 2019, foi solto. Em 2024, no entanto, voltou a ser condenado em outro caso e no mesmo ano se abrigou numa embaixada. Em agosto de 2025, vivia como asilado na Colômbia.
Foto: picture-alliance/AP Images/A. Franco
Juan Orlando Hernández (Honduras)
O ex-presidente hondurenho Juan Orlando Hernández (2014-2022) foi extraditado para os Estados Unidos em abril de 2022, onde foi acusado de conspiração para importar cocaína, posse de metralhadoras e armas pesadas e conspiração para possuir tais armas. Em 2024, foi condenado a 45 anos de prisão. Em agosto de 2025, ele seguia detido em uma penitenciária dos EUA
Foto: Andy Buchanan/AFP
Antonio Saca (El Salvador)
Presidente de El Salvador entre 200e e 2009, Antonio "Tony" Saca foi condenado a 10 anos de prisão em 2018 após se declarar culpado por desviar mais de US$ 300 milhões em fundos públicos durante seu mandato. Em agosto de 2025, ele estava cumprindo pena na prisão La Esperanza, em El Salvador.
Foto: Rodrigo Sura/Agencia EFE/IMAGO
Otto Pérez Molina (Guatemala)
General aposentado que governou a Guatemala de 2012 a 2015, Otto Pérez Molina foi preso um dia depois de renunciar ao cargo. Ele foi condenado a 16 anos de prisão por liderar uma rede milionária de fraudes alfandegárias. Ele deixou a prisão em 2024 após pagar fiança.
Foto: Luis Vargas/AA/picture alliance
Álvaro Uribe (Colômbia)
Acusado de fraude processual e suborno, o ex-líder colombiano Álvaro Uribe (2002-2010) ficou 67 dias na prisão em 2020 "devido a possíveis riscos de obstrução da Justiça". Em julho de 2025, foi condenado a 12 anos de detenção, a serem cumpridos em prisão domiciliar.
Foto: Long Visual Press/LongVisual/ZUMA Press/picture alliance
Alberto Fujimori (Peru)
Alberto Fuijimori, que governou o Peru entre 1990 e 2000, deu um autogolpe em 1992. Seu governo foi marcado por vários casos de corrupção. Em 2005, foi preso no Chile e depois extraditadi. Posteriormente, foi condenado a 25 anos de prisão por homicídio qualificado, usurpação de funções, corrupção e espionagem, além de desvio de fundos. Em 2023, foi solto. Fujimori morreu no ano seguinte.
Foto: Martin Mejia/AP/picture alliance
Pedro Castillo (Peru)
Pedro Castillo, destituído da presidência do Peru após ter ordenado a dissolução do Parlamento em dezembro de 2022, foi detido e levado ao presídio de Barbadillo. Às acusações de corrupção que já enfrentava, o Ministério Público acrescentou a do alegado crime de rebelião "por violação da ordem constitucional". Em agosto de 2025, o ex-presidente seguia detido.
Foto: Renato Pajuelo/AP/picture alliance
Pedro Pablo Kuczynski (Peru)
Presidente do Peru de 2016 até sua renúncia em 2018 na esteira de um processo de impeachment, Pedro Pablo Kuczynski foi alvo de prisão preventiva em 2019 no âmbito do escândalo Odebrecht. Alegando problemas de saúde, passou a cumprir a medida em casa. Em agosto de 2025, ainda cumpria várias medidas cautelares, como proibição de deixar o país.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Mejia
Ollanta Humala (Peru)
Ollanta Humala (2011-2016) completou seu mandato presidencial no Peru, mas, um ano depois, foi colocado em prisão preventiva. Ele e a esposa foram investigados pelo suposto recebimento ilegal de dinheiro da Odebrecht. Em abril de 2018, o Tribunal Constitucional do Peru revogou a prisão. Em 2021, se candidatou novamente à Presidência, mas recebeu apenas 1,5% dos votos. Em 2025, voltou a ser preso.
Foto: El Comercio/GDA/ZUMA Press/picture alliance
Alejandro Toledo (Peru)
Presidente do Peru entre 2001 e 2006, Alejandro Toledo foi condenado em outubro de 2024 a 20 anos e seis meses de prisão por corrupção. Detido nos EUA em 2023 e extraditado no mesmo ano, ele cumpria pena no Peru em agosto de 2025.
Foto: Guadalupe Pardo/AP/picture alliance
Martín Vizcarra (Peru)
Martín Vizcarra foi o sexto ex-presidente do Peru a se somar à lista de presos. Ele governou o Peru entre 2018 até 2020, quando foi afastado em meio a um processo de impeachment. Sua prisão preventiva em agosto de 2025 envolveu suspeita de risco de fuga em meio a um processo de crime de suborno.