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Candidato da Irmandade Muçulmana é incógnita para política egípcia

5 de abril de 2012

O lançamento do candidato da Irmandade Muçulmana, Khairat al-Shater, para as próximas eleições presidenciais causou surpresa no Egito. Especialistas questionam objetivos da candidatura e planos da organização islâmica.

Foto: picture-alliance/dpa

O anúncio de que a Irmandade Muçulmana lançaria um candidato próprio às eleições presidenciais a serem realizadas em maio foi uma surpresa para os egípcios. A organização islâmica havia afirmado diversas vezes não ter a intenção de entrar na disputa. Menos surpresa, porém, causou o nome do escolhido: Khairat al-Shater, visto como conservador e amigo do povo e conhecido como "Al Muhandis" ("o engenheiro").

É assim que o egípcio de 61 anos, apontado como candidato no último sábado (31/03), gosta de ser chamado desde seus estudos em engenharia e o doutorado subsequente na Universidade de Al-Mansoura, no norte do país. Segundo especialistas, Al Shater pertence à geração "jovem" da Irmandade Muçulmana – caracterizada menos pelo extremismo religioso no estilo do fundador da organização, Hassan al-Banna, e mais por uma grande dose de pragmatismo. Além disso, "o engenheiro" é apontado como um dos homens mais ricos do Egito.

"O objetivo primeiro e último" é a introdução da sharia, a lei islâmica, anunciou o candidato Al Shater sobre sua candidatura. Ele disse também querer fundar "um grupo de intelectuais" e, após sua eleição para a presidência, pretender apoiar o Parlamento na implementação do direito islâmico.

Empresário de sucesso

Al Shater começou a construir sua fortuna no início dos anos 1990, com o estabelecimento de uma firma de sistemas de computação. Na sequência, ele expandiu o negócio próspero e se engajou também em outros setores. Ele trabalha com móveis, tratores, automóveis, produtos químicos e também atuou no setor de consultoria.

O ativismo político rendeu 11 anos de prisão a Al ShaterFoto: rtr

O empresário também usa o lucro obtido com seus negócios para manter sua posição na Irmandade Muçulmana através de uma rede de relações pessoais em constante expansão.

Al Shater emprega muitos membros da Irmandade Muçulmana em sua empresa. Suas filhas também se casaram com membros da organização.

Atrás das grades

Além de empresário, Al Shater tem outra faceta: a de ativista político – que lhe rendeu mais de 11 anos na prisão. "O engenheiro" foi preso pela primeira vez em 1967, durante o regime de Gamal Abdel Nasser. Naquela época, ele também passou de socialista engajado a islamista.

Outras períodos de detenção se seguiram durante o governo de Hosni Mubarak. O último deles começou em 2006, sob acusação de lavagem de dinheiro, pela qual foi condenado a sete anos de prisão. Em 2011, porém, Al Shater recebeu o perdão dos militares. Após tais experiências com o despotismo, questiona-se em que medida elas poderiam determinar suas ideias políticas.

Dina Fakoussa, diretora do Fórum União Europeia-Oriente Médio da Sociedade Alemã de Política Externa (DGAP, na sigla em alemão), mostra-se cética diante da possibilidade de Al Shater ter aprendido a apreciar os valores de democracia e liberalismo durante as detenções.

É concebível que uma pessoa que passe tanto tempo na prisão se engaje para acabar com violações dos direitos humanos ali ocorridas. "Isso não significa que a Irmandade Muçulmana procederia de forma semelhante em outras áreas. O que diz respeito aos direitos das mulheres ou aos direitos das minorias é questionável em sua agenda", considera Fakoussa. "Pelo menos por enquanto ainda não se pode dizer que tipo de política eles adotarão nesse sentido."

Minorias

Al Shater tenta dissipar esse tipo de medo em sua página na internet. Sob o título "Não é preciso temer-nos", ele declara que o sucesso da Irmandade Muçulmana não é motivo para preocupação, pois a organização respeita "os direitos de todos os grupos políticos e religiosos".

Segundo "o engenheiro", a Irmandade tem consciência de que "muitos dos problemas com os quais este país [Egito] sofreu durante o último século se devem à ditadura e à corrupção". Por isso, seria impossível "colocar em prática reformas políticas e econômicas abrangentes sem sanar os problemas das principais instituições políticas" do país.

Entretanto, Fakoussa questiona a posição da organização em relação às minorias. "A Irmandade Muçulmana tem cristãos coptas no partido. Mas isso não significa que ela realmente garantirá seus direitos." Por outro lado, Stephan Roll – especialista em Oriente Médio do Instituto Alemão para Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP, na sigla em alemão) – acredita que a história recente da Irmandade Muçulmana tenha mostrado que ela está passando por uma mudança gradual.

Amigo do povo: Al Shater diante de seguidores na Praça TahrirFoto: picture-alliance/dpa

"Não se trata de revolucionários que exigem uma mudança radical, eles apenas se transformaram em políticos mais moderados", explicou Roll.

Tal trajetória é questionada por jovens ativistas, mas, para Roll, é preciso lembrar que a Irmandade Muçulmana reflete a maioria do país. "O Egito é um país muito conservador, um país islâmico, e essa abordagem da Irmandade reflete o desejo da maioria da população", afirma.

Motivos da candidatura

Sobre o porquê de a Irmandade Muçulmana apresentar um candidato próprio para as eleições presidenciais, Fakoussa supõe que a intenção seja pressionar o Conselho Militar. Segundo a especialista, a organização tentou repetidamente substituir o gabinete nos últimos tempos. Na verdade, admite, o governo de transição atual não reflete as relações de maioria do Parlamento egípcio.

Contudo, a recente decisão de apresentar um candidato próprio à presidência expressa principalmente o aumento da autoconfiança da Irmandade. "Eles se sentem tão fortalecidos, dominam o Parlamento, dominam a Assembleia Constituinte", diz. A organização sempre negou ter pretensões de poder político, mas Fakoussa duvida da afirmação. "Seu comportamento demonstra o contrário", considera.

Já Roll supõe que Al Shater seja um candidato apoiado pela Irmandade e pelos militares para ofuscar outros candidatos. "Tanto para a Irmandade Muçulmana quanto para os militares seria muito difícil se houvesse um presidente popular, autoconfiante e talvez até completamente independente, como Abdel Mouneim Abul-Fatou, da Irmandade, ou Hazim Abu Ismail, dos salafistas."

Autor: Kersten Knipp (lpf)
Revisão: Carlos Albuquerque

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