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Caso de corrupção expõe queda de braço entre Erdogan e movimento islâmico

Thomas Seibert (sv)9 de janeiro de 2014

Primeiro-ministro responsabiliza adeptos do líder muçulmano Fethullah Gülen por último grande escândalo na Turquia e tenta capitalizar crise politicamente. Para isso, se aproxima até de ex-adversários militares.

Fethullah Gülen e Recep Tayyip Erdogan: antigos aliados, hoje adversáriosFoto: picture-alliance/dpa/AP

Desde que, em meados de dezembro, o Ministério Público de Istambul ordenou a detenção em massa de autoridades por corrupção, mais de 1.700 funcionários públicos – entre policiais, políticos e juristas – foram afastados, presos ou substituídos. O caso reflete uma queda de braço entre o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan e os seguidores do pregador muçulmano Fethullah Gülen, hoje exilado nos Estados Unidos e que passou, em poucos meses, de aliado a principal inimigo do governo.

Não há mais nenhum funcionário público que tenha estado envolvido com os escândalos de corrupção, desbaratados no dia 17 de dezembro, ocupando seu posto de origem. "Uma torre está se desmoronando", afirma Hüseyin Gülerce, jornalista do diário Zaman.

O Gülen é um dos movimentos islâmicos mais influentes da Turquia – e leva o nome de seu líder. Embora atraia muita gente, é também alvo constante de críticas, sobretudo com relação a suas ações nas escolas particulares em 140 países do mundo, apontadas como pretexto usado pelos adeptos do movimento para disseminar princípios islamistas.

Fato é que o governo Erdogan reagiu às suposições de que haveria tanto entre a polícia do país quanto no Judiciário adeptos do movimento. O premiê e seus assessores apontaram "estruturas paralelas" no aparelho estatal, que supostamente visavam a queda do governo. Por isso, disse o premiê, essas estruturas deveriam ser destruídas.

As acusações pesam também sobre o Judiciário: dois importantes promotores que investigavam o escândalo envolvendo corrupção foram afastados do caso. E um deles, Zekeriya Öz, foi penalizado: Öz, por sua vez também admirador do Movimento Gülen, é acusado de ter esperado meio ano para agir e mandar prender os suspeitos de corrupção, mesmo estando munido de provas para isso.

"Conduta não democrática"

A ala ligada a Erdogan suspeita que Öz adiou as detenções para dar uma lição no governo, que se digladia há meses na luta contra o Movimento Gülen. O líder do movimento apoiou durante anos o governo islâmico-conservador, especialmente em seus esforços de cerceamento da influência política dos militares. Mas já há algum tempo as desavenças entre Gülen e Erdogan não podem mais ser ignoradas.

Um membro do alto escalão do Movimento Gülen afirmou em entrevista à Deutsche Welle que a reação do governo aos protestos em meados do ano passado já havia desencadeado um certo mal-estar entre os "gülencis", como são chamados os adeptos do movimento. A severidade da polícia contra os manifestantes já seria, segundo ele, sinal de uma "conduta não democrática" frente a críticas da sociedade civil. Erdogan, afirma a fonte, torna-se cada vez mais autoritário.

Protestos populares contra escândalos de corrupção no paísFoto: Reuters

O premiê turco, por sua vez, parece não se deixar incomodar com tais críticas. Ele tem intenções de vencer as eleições municipais em 30 de março próximo e as presidenciais em meados do ano – lançando mão, para tal, de uma coesão cada vez maior de forças conservadoras a seu redor. Isso é exatamente o contrário do que propõe Gülen. Ou seja, para Erdogan, Gülen se transformou num inimigo a ser combatido. Ao que tudo indica, a "tempestade" que se anuncia está só começando.

Os adeptos do movimento são, hoje em dia, considerados pelo governo Erdogan inimigos do Estado, acusados de terem sido responsáveis pelos graves tropeços do país nos últimos anos. Por mais estranho que pareça, sob a ótica do governo Erdogan, um destes tropeços foi a série de veredictos contra centenas de ex-generais, acusados de querer derrubar Erdogan do poder através de um golpe.

Novos processos contra generais

Um assessor de Erdogan deu recentemente a entender que promotores ligados ao Movimento Gülen podem ter proferido sentenças contra generais de maneira ilícita. Um destes promotores era Zekeriya Öz, hoje afastado do cargo. No momento, o governo procura formas de dar prosseguimento aos processos contra os militares.

Segundo Riza Türmen, ex-juiz da Corte Europeia e hoje deputado do Partido Popular Republicano (CHP), a lógica que se esconde por trás disso é o propósito do governo de fazer com que os processos contra os militares pareçam tramoias do Movimento Gülen. E mostrar que os atuais escândalos de corrupção são manipulação dos "gülencis".

Ao mesmo tempo, Erdogan pretende fiscalizar mais severamente o Judiciário, diz a oposição: nesta semana, um novo projeto de lei deverá chegar ao Parlamento, por exemplo. Isso deixa claro que Erdogan está longe de assumir a responsabilidade política pela currupção à sua volta, aponta Ugur Bayraktutan, político do CHP, em entrevista à DW. "Num país ocidental, o primeiro-ministro já teria renunciado imediatamente, sem hesitar", conclui o deputado.

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