"Castelo da Cinderela" alemão foi esconderijo nazista
Louisa Schaefer
23 de abril de 2023
Encravado nos Alpes bávaros, Neuschwanstein foi modelo para filmes da Disney e é candidato a Patrimônio Mundial da Unesco. Na Segunda Guerra, regime de Hitler usou palácio para ocultar tesouro artístico roubado.
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Situado no alto de um penhasco nos Alpes da Baviera perto de Füssen, Alemanha, o Castelo de Neuschwanstein é o epítome do idílico. As suas torres elevam-se aos céus, enquanto as paisagens envolventes convidam ao devaneio. É o material dos contos de fadas. Tanto assim, que o homem que o construiu é apelidado de "rei dos contos de fadas": Ludwig 2° da Baviera, nascido em 1845. "Neuschwanstein está situado nesta paisagem alpina. Reminiscente de um cenário teatral, Ludwig 2° pretendia unir arquitetura, arte e paisagens em uma obra de arte completa", diz Alexander Wiesneth, da administração dos palácios da Baviera.
Concebido como lugar de refúgio
Neuschwanstein foi aberto ao público apenas algumas semanas após a misteriosa morte de Ludwig 2° em 1886. Foi uma reviravolta irônica do destino, pois o rei o construiu como um refúgio particular para si mesmo, buscando desesperadamente a solidão.
Ares medievais
Ludwig 2° colheu a inspiração para Neuschwanstein, construído no estilo de um castelo medieval, durante as viagens que fez em 1867 ao Castelo de Wartburg perto de Eisenach, Alemanha, e ao Chateau de Pierrefonds, na França.
Em maio de 1868, o excêntrico Ludwig 2° escrevia a seu tão admirado amigo, o compositor de ópera Richard Wagner: "É minha intenção reconstruir a ruína do velho castelo em Hohenschwangau, próximo do desfiladeiro de Pollat, no verdadeiro espírito dos velhos castelos alemães de cavaleiros, e devo confessar a você que estou ansioso para lá um dia (em três anos) morar".
Homenagem Wagner
A construção do novo palácio, que deveria ter 200 quartos, começou em setembro de 1869. A primeira coisa a ser concluída em 1873 foi o edifício onde fica o portal de entrada, para o qual Ludwig 2° se mudou. Mas ele não conseguiu concluir seu projeto. Quando morreu, a maior parte dos trabalhos de construção foi paralisada.
Apesar de todo o seu ar romântico e esplendoroso de conto de fadas, Neuschwanstein já ostentava avanços modernos, como aquecimento central, vasos sanitários com descarga e um sistema de campainha para chamar os criados.
Castelo de Neuschwanstein: o cartão postal da Baviera
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A grande admiração de Ludwig 2° por Wagner e suas obras se refletiu no projeto do palácio. As óperas de Wagner Tannhäuser, Lohengrin e Parsifal tiveram uma forte influência em Ludwig 2°. Numerosas pinturas e murais nos salões do castelo mostram motivos do mundo das lendas e contos de fadas da Idade Média.
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Depósito para obras de arte roubadas pelos nazistas
Mas não apenas o desenho arquitetônico elaborado e de conto de fadas de Neuschwanstein tornou o castelo famoso. Ele também ficou conhecido por ter sido usado pelos nazistas como um depósito para obras de arte roubadas durante a Segunda Guerra Mundial – como mostra o filme de George Clooney de 2014, Caçadores de obras-primas.
Depois que as tropas alemãs invadiram a vizinha França em 1940, Adolf Hitler autorizou a força-tarefa liderada por Alfred Rosenberg a registrar e confiscar bens culturais valiosos pertencentes a "propriedade judaica não reclamada".
Entre 1940 e 1945, os nazistas transferiram esses bens saqueados, principalmente de judeus, a lugares por toda a Europa e, mais tarde, também à Alemanha, incluindo minas de sal, mosteiros e castelos.
O Castelo de Neuschwanstein serviu como depósito ideal e quartel-general da força-tarefa de Rosenberg. Localizado perto da fronteira austríaca, longe da capital Berlim e de outros possíveis alvos aliados, ele oferecia amplo espaço.
Descoberta dos tesouros saqueados
Quando os Aliados invadiram Neuschwanstein em 1945, encontraram catálogos, slides e listas de mais de 20 mil obras de arte e outros itens saqueados pelos nazistas, incluindo joias e móveis da família Rothschild e a obra-prima dos irmãos Van Eyck, o Retábulo de Gante.
Muitos dos itens vieram da França. Foi graças aos esforços corajosos da curadora francesa Rose Valland que as forças aliadas descobriram o esconderijo em Neuschwanstein, de acordo com o historiador de arte S. Lane Faison Jr. – um dos "caçadores de obras-primas". "Ela fingiu ser uma colaboradora [nazista]", disse Faison sobre Valland, que trabalhava na Galerie Nationale du Jeu de Paume em Paris, um museu usado pelos nazistas como ponto de coleta de arte saqueada antes do envio à Alemanha.
Valland rastreou secretamente durante anos para onde as obras de arte foram transportadas. Felizmente, suas meticulosas anotações acabaram nas mãos dos Aliados. No final da guerra, o Munich Central Collecting Point (MCCP) foi fundado com o objetivo de devolver as obras de arte roubadas pelos nazistas aos seus legítimos proprietários.
Olhar para o futuro
Neuschwanstein foi apenas um dos luxuosos projetos de construção de Ludwig 2°. Outros incluem o palácio rococó de Linderhof, o barroco Palácio de Herrenchiemsee e o Königshaus am Schachen.
Juntamente com o Castelo de Neuschwanstein, eles estão atualmente se candidatando para serem incluídos na lista do Patrimônio Mundial da Unesco. Espera-se que a decisão sobre a admissão seja tomada em meados de 2025.
Seja como o sonho de um rei, como um antigo depósito de arte saqueada pelos nazistas ou como inspiração para os castelos da Cinderela e da Bela Adormecida de Walt Disney – Neuschwanstein tem uma história para contar. E o popular destino turístico voltou a ser iluminado à noite: no auge da crise energética, os holofotes haviam sido desligados para economizar eletricidade. Mas, neste mês de abril, o Castelo de Neuschwanstein voltou a brilhar.
A história do famoso Castelo de Neuschwanstein
Sabe de onde vem o nome do castelo de conto de fadas? Que ele foi usado só por 172 dias e que tinha avançadas inovações técnicas para aquela época? Conheça números e fatos sobre a grande atração turística alemã.
Foto: picture-alliance/dpa
Origem do nome
Ele foi construído sobre as ruínas de dois burgos medievais documentados pela primeira vez em 1090, com o nome "Castrum Swangowe". Já "Schwanstein" era um castelo próximo dali, mas que foi demolido em meados do século 19, para construir o castelo de Hohenschwangau. Os castelos ficam perto do lago Schwansee, na região de Schwangau. Schwan significa cisne em alemão, Stein, pedra, e neu, novo.
Foto: picture-alliance/dpa
Castelo medieval e mitos alemães
O rei Ludwig 2º da Baviera mandou construir o castelo para transpassar, pela arquitetura, as óperas de Richard Wagner e os mitos alemães. O projeto foi feito pelo cenógrafo de teatro Christian Jank e executado pelos arquitetos Eduard Riedel e Georg von Dollmann. A obra, iniciada em 1869, tinha o ideal de castelo medieval.
Foto: Shahriar Sedighi
O projeto em 1869
O castelo de Wartburg, na Turíngia, serviu de modelo para o Neuschwanstein, que acabou recebendo muitos detalhes românticos. Alguns elementos, como uma das torres à esquerda no projeto, não foram realizados. Se concluído, o castelo teria 200 cômodos, incluindo as dependências para hóspedes e serviçais, mas apenas 15 dependências foram terminadas e decoradas.
Foto: picture alliance/akg-images
Arquitetura de superlativos
A área total de todos os pisos juntos soma 6 mil m2 e o comprimento do castelo, cerca de 150 metros. Trata-se de uma construção assimétrica, formada por vários prédios individuais. A torre mais alta mede 80 metros. As obras foram iniciadas em 1869 e até 1886 a maior parte das construções externas estava pronta.
Foto: Imago/Westend61
Trabalho noite e dia
Durante quase 20 anos, as obras do castelo mobilizaram não só pedreiros e outros profissionais de obra, mas também fornecedores, transportadores e agricultores. Trabalhava-se dia e noite no maior empregador da região. Em 1880, 209 pessoas trabalharam no castelo. Uma associação de trabalhadores da construção do castelo pagava até 15 dias de salário a quem sofresse acidente ou ficasse doente.
Foto: picture-alliance/dpa
Inovações técnicas
O castelo dispõe de inovações bastante avançadas para o final do século 19. Ele tinha um sistema de campainha a bateria para chamar serviçais e um tipo de linha telefônica. O forno da cozinha tinha um gril que gira com o calor produzido. O ar quente podia ser canalizado para a calefação. Havia também um sistema de água quente para as torneiras e banheiros com descarga automática.
Foto: Bayerische Schlösserverwaltung
Um mundo de extravagância
As luxuosas pinturas nas paredes celebram o mundo de Tannhäuser e Lohengrinn, das óperas de Wagner, com muitos cisnes e hunos, em cores vivas e muito ouro. Ludwig 2º amava a exuberância. Todos os salões são em estilos diferentes: um era românico; outro, bizantino; um terceiro, gótico, e o quarto, renascentista.
Foto: picture-alliance/dpa/K. J. Hildenbrand/Bayerische Schlösserverwaltung
O endividamento e a destituição
Dados de 1879/1880 documentam o material gasto naquele ano: 465 t de mármore, 1.550 t de arenito, 400 mil tijolos, 2.050 m3 de madeira, 3.600 m3 de areia e 600 t de cimento. Mas a megalomania do rei Ludwig 2º quase o levou à falência. Até 1886, havia sido gasto o dobro do dinheiro previsto. O governo da Baviera o acabou destituindo do trono e o declarou incapaz de continuar sendo rei.
Foto: picture-alliance/dpa
Ludwig só morou ali 172 dias
O rei morreu afogado, sob circunstâncias não esclarecidas, em 13/06/1886, poucos dias após a destituição. O castelo ainda não estava pronto. O rei morou ali um total de 172 dias, mas não intermitentemente. Inicialmente, o castelo foi chamado "Neue Burg Hohenschwangau" (Novo Burgo Hohenschwangau). O nome atual é de 1886. O castelo pertence hoje à Baviera. O nome "Neuschwanstein" é marca registrada.
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Gruta da ópera de Wagner
Entre a sala e o escritório, e junto a um jardim de inverno, Ludwig mandou construir uma pequena gruta, originalmente com uma cascata artificial. A iluminação era feita com a projeção de luzes coloridas com a chamada "máquina de arco-íris". A ideia de Ludwig era representar a gruta do Monte de Vênus, da ópera Tannhäuser, de Richard Wagner.
Foto: Bayerische Schlösserverwaltung
Atração turística
O rei não queria visitas no Neuschwanstein, mas elas foram permitidas já seis semanas após sua morte, ao preço de 2 marcos por pessoa. Em oito semanas, vieram 18 mil visitantes. Hoje, são 1,5 milhão por ano. Neuschwanstein é o mais famoso dos vários castelos de Ludwig 2º e um dos principais pontos turísticos da Alemanha. Há guias de áudio em 18 idiomas, incluindo coreano e tailandês.
Foto: picture-alliance/dpa/K.-J.Hildenbrand
Inspiração para o castelo da Disney
O castelo foi modelo para vários prédios em todo o mundo, especialmente o da Bela Adormecida no parque da Disney na Califórnia (foto).Também o castelo da Bela Adormecida na Disneyland Paris foi inspirado no "castelo de conto de fadas" da Baviera. O mesmo vale para o Excalibur Hotel & Casino em Las Vegas. Inaugurado em 1990, o complexo de 290 milhões de dólares tem semelhanças com Neuschwanstein.