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EsporteCatar

Catar 2022: direitos humanos continuam em segundo plano

Olaf Jansen
30 de março de 2022

Palco da próxima Copa do Mundo, o Catar é regularmente alvo de acusações de violações de direitos humanos. Sob pressão internacional, regime do país implementou alguns avanços, mas quadro continua preocupante.

Foto panorâmica mostra o estádio ao anoitecer
Estádio 974 em Doha incorpora 974 contêineres recicladosFoto: Qatar's Supreme Committee for Delivery and Legacy/AFP

"Este foi um passo importante", disse o jogador da seleção alemã de futebol Matthias Ginter, após participar de uma reunião de 90 minutos com representantes das ONGs Human Rights Watch e Anistia Internacional na semana passada.

A Federação Alemã de Futebol (DFB, na sigla em alemão) convidou especialistas das duas organizações para informar os membros da seleção sobre a situação atual dos direitos humanos no Catar, país anfitrião da Copa do Mundo 2022. O zagueiro da seleção disse que ele e seus companheiros querem "obter mais informações" para que possam "avaliar tudo corretamente no local".

A reunião da seleção alemã foi a oportunidade para fazer algumas perguntas que passam pela cabeça de muita gente: O que aconteceu com as tão criticadas condições de trabalho dos migrantes, muitos de outros países da Ásia, empregados em projetos de construção da Copa do Mundo? Houve alguma melhora notável depois que um salário-mínimo e o direito de escolher o local de trabalho foram aprovados por lei, em 2020?

Pequenas melhorias

Um bom panorama da situação pode ser dado por Dietmar Schäfers, que em 2013, como vice-presidente da Federação Internacional de Trabalhadores da Construção e Madeira, ajudou a lançar a campanha "Cartão Vermelho para a FIFA - Não há Copa do Mundo sem Direitos Humanos".

Nos últimos anos, Schäfers esteve envolvido em várias negociações com o comitê organizador da Copa do Mundo e o Ministério do Trabalho do Catar, além de ter feito várias visitas a canteiros de obras para ver as reais condições com seus próprios olhos.

"Desde 2016, temos a oportunidade, como federação internacional, de realizar inspeções regulares em todos os canteiros de obras da Copa do Mundo do Catar. E fazemos isso com nossos especialistas. Até agora, realizamos 24 dessas inspeções", conta Schäfers à DW.

"Desde então, as condições para os trabalhadores melhoraram significativamente", disse Schäfers. "Por exemplo, as chamadas salas de resfriamento foram montadas, para os trabalhadores poderem fugir do calor. Coletes de resfriamento foram introduzidos e intervalos regulares foram implementados".

A federação deu especial atenção ao sistema kafala, que agora está oficialmente proibido. No passado, entre outras coisas, os trabalhadores estrangeiros podiam ser obrigados a entregar seus passaportes aos empregadores do Catar.

"A lei kafala foi efetivamente abolida", disse Schäfers. "Os trabalhadores podem circular livremente e mudar de empregador quando quiserem. Além disso, foi introduzido um salário-mínimo".

Ele explicou que, agora, os trabalhadores podem eleger seus próprios porta-vozes nos canteiros de obras e que um conselho de mediação foi estabelecido, ao qual os empregados podem recorrer em caso de qualquer problema.

Pouco controle

Embora esses passos sejam positivos, disse Schäfers, não foram implementados tão bem quanto deveriam. 

"No Catar, existem 200 inspetores para a força de trabalho atual de cerca de 900 mil pessoas", explicou. "Isso é muito pouco".

Ele também acredita que o governo do Catar não fez um bom trabalho ao sancionar as empresas que violam os regulamentos.

"Deveria haver penalidades mais consistentes para as construtoras que não cumprem as leis: não apenas multas, mas prisão e fechamento de empresas", disse. "Isso ainda não está acontecendo", reforçou.

Milhares de trabalhadores estrangeiros morreram em canteiros de obras da Copa no Catar Foto: picture-alliance/dpa/A. Gebert

Quadro sombrio

Katja Müller-Fahlbusch, especialista em Oriente Médio da Anistia Internacional, vê um quadro bastante sombrio das condições nos canteiros de obras no Catar.

"Houve melhorias reais para os cerca de 2% dos trabalhadores nos canteiros de obras da Copa do Mundo", disse ela à DW. "Para os 98% restantes, a situação parece muito pior, porque não está sendo analisada com tanta atenção".

Müller-Fahlbusch concorda com as críticas de Schäfers ao governo por não ser duro o suficiente com os infratores.

"A cada dia que isso acontece, trabalhadores em todo o país estão à mercê de pessoas sem escrúpulos. Empregadores que roubam salários, condições de trabalho inseguras e, às vezes, barreiras intransponíveis para mudar de emprego", disse ela. "Os empregadores podem explorar seus trabalhadores com impunidade".

Reformas levam tempo

Tanto Müller-Fahlbusch quanto Schäfers acreditam que o Catar está se tornando uma sociedade mais moderna. No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer, principalmente no que diz respeito aos direitos das mulheres e das minorias.

"Você simplesmente tem que aceitar que essas reformas levam tempo. Você não pode ver tudo pelos olhos europeus", disse Schäfers. "Os passos que o Qatar está dando em termos de modernização são enormes para seus padrões. Do nosso ponto de vista, eles são pequenos".

Fatma Al Nuaimi, diretora de comunicações do comitê organizador da Copa do Catar, pede paciência.

"Sempre acreditamos que a Copa do Mundo pode deixar um legado social significativo", disse Al Nuami, "especialmente no que se refere a respeito aos direitos dos trabalhadores". Segundo ela, a Copa do Mundo é "também uma oportunidade para construir pontes, esclarecer mal-entendidos e transmitir nossa hospitalidade".

Monitoramento duradouro

No entanto, Müller-Fahlbusch não está tão confiante quanto ao futuro do Catar. "Ainda há grandes forças conservadoras que criticam o processo de modernização. Está se formando uma resistência que prefere reverter as mudanças sociais", disse ela. Segundo ela, um monitoramento duradouro da situação dos direitos humanos no Catar será necessário depois da Copa do Mundo.

"Se isso não acontecer, mais milhares de trabalhadores correm o risco de se tornarem vítimas de abusos trabalhistas", disse. "A situação para aqueles que querem ficar no Catar após o torneio pode se tornar ainda mais difícil".

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