Arte & religião
3 de janeiro de 2008Anúncio
A pequena cidade de Naumburg, no estado de Saxônia-Anhalt, se tornou o centro das atenções dos alemães na passagem de ano, por causa de uma intervenção artística em um monumento histórico secular. Neo Rauch, um dos artistas plásticos alemães mais requisitados do momento, projetou três vitrais para a Catedral de Naumburg. A obra foi concebida para uma pequena capela dedicada a Santa Elisabeth (mais conhecida no Brasil e em Portugal como Santa Isabel), até então fechada ao público. Legenda medieval em tons socialistas Pelo menos desde o início do século 14, Naumburg é destino de procissões anuais no dia 2 de maio, data da chegada das relíquias de Santa Elisabeth à capela instalada na torre noroeste da catedral. Elisabeth da Turíngia, nascida em 1207 como filha do rei húngaro, morreu aos 24 anos, sendo canonizada poucos anos depois (leia mais no link abaixo sobre os 800 anos da santa). Desde cedo ela provocava a nobreza com severas críticas aos hábitos dispendiosos de sua classe, engajando-se em atividades humanitárias. Após o falecimento de seu marido, ela foi privada de seu poder por familiares, morrendo jovem, após ter se contagiado entre os doentes de que cuidava. A vida de Elisabeth foi o ponto de partida das representações figurativas de Neo Rauch, conhecido por resgatar a iconografia propagandística socialista como referência de suas telas. O espaço silencioso e sóbrio da capela, que se estende sob cadeias sustentadas por mainéis com capitéis ornamentados, foi transformado por vitrais vermelho-sangue com os traços fortes típicos da gravura. Espírito humanitário e engajamento social A primeira janela narra a despedida de Elisabeth de seu marido, antes de ele partir para uma cruzada da qual jamais voltaria. No vitral intermediário, a santa aparece doando um manto a um pobre de joelhos. O terceiro episódio mostra Elisabeth cuidando de um doente no hospital de Marburg, na companhia de seu confessor. As imagens em tons avermelhados transluzem através dos vidros soprados artesanalmente e enquadrados em molduras de chumbo. As tonalidades variam de acordo com a incidência do sol. Na avaliação de especialistas, as figuras de Rauch dialogam com a expressividade das esculturas e relevos do chamado Mestre de Naumburg, o artista anônimo que esculpiu em pedra as cenas da Paixão no século 13. A catedral de Naumburg é considerada uma das mais representativas construções românicas tardias, já com traços do início do período gótico. Nova luz sobre espaço religioso Com a encomenda dessa intervenção a um artista contemporâneo, a cidade de Naumburg pretende chamar atenção para o valor histórico de sua catedral, algo que poderia colaborar para incluí-la na lista de patrimônios culturais da Unesco. Mas isso não é tudo. O projeto acompanha uma moda momentânea de tornar as igrejas mais convidativas e conquistar maior projeção pública para os espaços religiosos através de uma colaboração com a arte contemporânea.
Em meados de 2007, a inauguração de um vitral abstrato de Gerhard Richter na catedral de Colônia gerou polêmica e conquistou grande espaço na mídia. Na mesma cidade, uma outra igreja já havia sido alvo de enorme afluxo público em 2005, por causa dos vitrais concebidos pelo artista Markus Lüperz sobre a legenda dos macabeus. A próxima grande sensação nesse sentido deverá ser a série de vitrais que o artista Sigmar Polke está preparando para a catedral de Zurique. (sm)
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