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Celulares fazem mal à saúde?

Charli Shield ip
15 de agosto de 2018

Desde que surgiram, telefones celulares vêm provocando receios quanto a seus possíveis efeitos nocivos. Especialistas analisam impactos da radiação emitida pelos aparelhos e mudanças de comportamento.

Smartphone
Para evitar riscos, cientistas recomendam usar fones de ouvido ou a função "alto-falante" do smartphoneFoto: Imago/Science Photo Library

Estudos sobre possíveis riscos de smartphones à saúde estão longe de um consenso. Câncer cerebral, nervos danificados e tumores têm sido apontados como potenciais consequências negativas do uso regular de telefones celulares. Embora ainda não tenham sido encontradas evidências concretas de que eles sejam perigosos, isso não significa que não haja motivos para preocupação.

Grande parte dos receios em torno dos riscos à saúde e à segurança impostos pelo uso de telefones celulares decorre da radiação emitida por eles. Os aparelhos liberam energia de radiofrequência, ou ondas de rádio, as quais podem ser absorvidas pelos tecidos do corpo.

Antigamente, estudos associavam o uso frequente de celulares a certos tumores cerebrais. No entanto, de acordo com Martin Röösli, chefe da Unidade de Exposições Ambientais e Saúde do Instituto Suíço de Saúde Pública e Tropical, o tipo de radiação emitida por um telefone celular não deve ser motivo de alarme.

É uma radiação de radiofrequência de energia muito baixa, como a encontrada em sinais de TV e rádio, diz. "É uma radiação não ionizante, portanto, não é radioativa ou de raios-x", diz Röösli. "Não pode ocorrer nenhum dano direto ao DNA com esse tipo de radiação. É impossível."

Quanto à ligação entre esse tipo de radiação e câncer, Röösli diz que "não vê tais indícios". Muitas vezes, tais estudos são "retrospectivos" e se atêm no que as pessoas lembram a respeito de seu uso de celulares, aponta.

"Não temos visto um aumento nas taxas de câncer nas últimas duas décadas, algo que seria certamente esperado caso houvesse um grande risco atrelado ao uso de telefones celulares", acrescenta.

Da mesma forma, Frank de Vocht, docente em Epidemiologia e Saúde Pública na Universidade de Bristol, afirma que é improvável que os riscos de tais aparelhos tenham simplesmente escapado dos radares.

"Se o uso de telefones celulares aumentasse o risco de algo de forma significativa, tal como de câncer, por exemplo, isso teria sido detectado muito mais claramente com os métodos científicos que temos hoje em dia. Assim como os riscos de câncer de pulmão provocados pelo fumo são fáceis de constatar", diz.

Efeitos sobre a memória?

Isso não significa, porém, que a radiação dos celulares não tenha efeito algum sobre o cérebro. Estudos anteriores encontraram evidências de que o uso dos aparelhos pode alterar nossas ondas cerebrais. E agora, um novo estudo de coautoria de Röösli encontrou uma ligação entre o uso de telefones celulares e os efeitos adversos na retenção de memória dos jovens.

Pesquisadores suíços analisaram 700 adolescentes com idade entre 12 e 17 anos, rastreando seus comportamentos em relação a celulares e os submetendo a testes de memória. Ao longo de um ano, os participantes tiveram que preencher um questionário sobre seus hábitos de telefonia móvel, além de responder a perguntas sobre sua saúde física e psicológica.

Em seguida, eles passaram por uma série de testes cognitivos computadorizados. Röösli apontou como uma característica singular do estudo o uso de dados de usuários a partir de operadoras de telefonia móvel. Isso significa que, para todas as chamadas feitas pelos participantes, os pesquisadores "sabiam em qual rede ocorreu a ligação e quanto tempo ela durou".

O estudo, publicado no Environmental Health Perspectives, descobriu que um ano de exposição à radiação telefônica pode ter um efeito negativo no desenvolvimento do desempenho da memória em regiões específicas do cérebro em adolescentes. Aqui, "exposição" refere-se quase que exclusivamente a ligações telefônicas.

"Oitenta por cento da radiação absorvida vêm de segurar o telefone na cabeça", observou Röösli. Curiosamente, eles descobriram que a função de memória do cérebro era mais vulnerável ao impacto negativo da radiação quando o telefone era mantido no lado direito da cabeça. É aí que estão situadas as áreas do cérebro relacionadas à memória.

"Basicamente, o que observamos foi que quanto maior a absorção de radiação [pelo cérebro], maior é a probabilidade de que, em um ano, o desenvolvimento da memória não seja tão bom quanto quem absorveu menos", disse Röösli à DW. Os pesquisadores também enfatizaram que mais pesquisas precisam ser feitas para descartar outros fatores, incluindo a puberdade, que podem afetar tanto o uso do celular quanto a cognição.

Quanto a outros usos de smartphones – enviar mensagens de texto, tirar fotos, usar aplicativos –, os cientistas afirmam que isso não envolve "quase nenhuma exposição [de radiação] ao cérebro".

Mudanças de comportamento

Apesar dos efeitos negativos observados, Röösli os considera "muito sutis". Mas, para aqueles que estão preocupados, o cientista ressalta que o efeito da radiação "pode ser facilmente minimizado" ao receber chamadas no lado esquerdo de sua cabeça, ou simplesmente utilizando os alto-falantes ou fones de ouvido – "especialmente quando a qualidade da rede é baixa".

"O estudo mostra que, embora haja provavelmente um efeito na memória, ele é relativamente pequeno", disse De Vocht. "Na minha opinião, a lição mais importante de todos esses estudos é que o uso de telefones celulares não é extremamente perigoso, apesar do que algumas pessoas possam dizer."

O que preocupa Röösli e De Vocht, no entanto, não são os efeitos biológicos potenciais do uso de telefones celulares, mas as mudanças comportamentais vistas naqueles que usam tais tecnologias com muita frequência. Segundo eles, qualquer impacto significativo da radiação do telefone celular é muito menos relevante do que aqueles que mudam a forma como as pessoas se comportam.

"Há fortes evidências de que algo semelhantes a um 'vício em telefones celulares' afeta negativamente a interação social, a saúde mental e o bem-estar", disse De Vocht.

Em 2015, Röösli foi coautor de um estudo que descobriu que adolescentes que usam muito seus telefones – particularmente depois de "apagarem as luzes" – alteraram seus padrões de sono e se mostraram "muito mais cansados". Esse é o tipo de pesquisa que ele considera "muito mais relevante do ponto de vista de saúde pública" ao considerar os riscos do uso de telefones celulares.

"Isso não tem nada a ver com radiação. É sobre comportamento", diz. Em última análise, Röösli disse que, se a radiação está afetando os usuários de telefones celulares, "não é grande coisa, pelo menos não neste momento".

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