Grafite em bairro berlinense causa revolta de moradores, que se organizam para substituí-lo. Artista alega que mensagem não foi entendida. Ao conferir obra, Clarissa Neher compreende a razão da polêmica.
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Recentemente, ao abrir o jornal, me deparei com uma notícia curiosa: moradores do bairro Tegel estavam protestando contra um mural pintando na fachada de um prédio. O grafite em si não era problema, mas sim seu conteúdo: uma menina com um vestido manchado de vermelho olhando para um bosque onde há um homem cheio de flechas no corpo amarrado em uma árvore.
A indignação com a obra de 42 metros de altura foi tanta que moradores começaram a recolher assinaturas, exigindo que o desenho da fachada fosse refeito, sob a condição de que eles fossem consultados para ver se aprovariam ou não o novo mural. A peça foi considerada deprimente e de mau gosto.
Mães da região afirmaram que seus filhos ficavam apavorados ao olhar o grafite. Crianças de um jardim de infância próximo ao mural da discórdia faziam perguntas que ninguém sabia como responder, como: por que a menina está sangrando? Os pais inventam respostas e dizem que não é sangue, é geleia de morango. A reportagem no jornal local tentava mostrar o grande drama dos moradores.
No meio da confusão, o artista Borondo, relativamente conhecido em Berlim, tentava explicar seu conceito, argumentando que se inspirou no drama dos refugiados. O homem amarrado seria São Sebastião, a menina representa o mundo seguro que olha para uma realidade dramática, mas de uma perspectiva distante, e o vermelho foi apenas a cor escolhida para dar contraste e dimensão à obra. O artista lembrou ainda que não era decorador, e consultar moradores resultaria em desenhos de arco-íris e borboletas.
Borongo sugeriu que a população abra a mente e pare de olhar os dramas através de janelas seguras, sem fazer nada. Uma mensagem forte para uma obra impactante. Fiquei curiosa depois da polêmica e fui conhecer o mural da discórdia. Encontrá-lo demorou um pouco, pois ele fica escondido da rua principal, nos fundos de um condomínio e, como é verão, perdido também entre árvores. Não achei o grafite assustador como muitos alegavam. E, assim como boa parte das obras de arte, ele deixa espaço para reflexão.
Mas após alguns minutos em Tegel, entendi por que a peça causou tanta indignação: ela fica em uma área residencial de um bairro conservador. Natural que muitos não estivessem a fim de experimentos e de confrontação em seu ninho de tranquilidade. Se a obra estivesse em bairro mais alternativo, por exemplo, Kreuzberg, não teria causado polêmica, mas, provavelmente, uma discussão, talvez sobre exclusão e refugiados.
Para mim, o local escolhido para o mural da discórdia foi perfeito. Embora a comunidade continue organizada contra a obra, a polêmica a tornou conhecida e rendeu visibilidade e espaço na imprensa para a mensagem que o artista deseja transmitir. Tenho certeza de que toda a indignação contribuiu para que o desenho fosse visto por um número de pessoas bem maior do que seria se ficasse restrito a uma fachada de uma pequena rua nos fundos de Tegel.
Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às sextas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.
Museus alemães curiosos
Entre os 6.300 museus alemães, há alguns curiosos e outros até bizarros, como o Museu da Batata. Conheça alguns dos mais fora do comum.
Foto: Das Kartoffelmuseum
Muito mais do que higiene
O nome engana! O Museu da Higiene em Dresden enfoca o corpo humano e a saúde. Modelos que podem ser tocados explicam as funções dos órgãos. Nas áreas temáticas, são enfocados o ser humano através da ciência moderna, a sexualidade, a mobilidade, a beleza, a memória, a alimentação e vida e morte. Entre os objetos históricos, há uma estatueta de Vênus do ano 100 e um aparelho de radiografia de 1919.
Foto: Jörg Gläscher
Mundo em miniatura
O "Miniatur Wunderland" (Mundo das Maravilhas em Miniatura) em Hamburgo tem a maior ferrovia de brinquedo do mundo espalhada por oito cenários, desde Las Vegas a fiordes noruegueses, com paisagens da Itália, França, Suíça, Áustria e Alemanha, e ainda um aeroporto em miniatura em funcionamento com 40 modelos de aviões.
Foto: Miniatur Wunderland Hamburg
Museu do feitiço
O museu "Soul of Africa" em Essen é dedicado à cultura vodu, à magia e às artes de cura da África Ocidental. O altar retratado aqui mostra Mami Wata, uma deusa do mar, juntamente com outros 41 espíritos da água.
Foto: Jörg Gläscher
Legado de peso
O assunto guerra requer um tratamento particularmente delicado na Alemanha. Em uma análise crítica, o Museu dos Tanques de Combates em Munster lança luz sobre a história militar. Uma das atrações entre os mais de 150 veículos blindados do acervo é este tanque de 1921. Durante a República de Weimar, ele foi usado pela polícia em eventuais conflitos de rua.
Foto: Deutsches Panzermuseum
Ervas e pomadas
O Museu Alemão de Farmácia fica dentro do castelo de Heidelberg e seu acervo tem objetos relacionados à saúde e à medicina desde a Antiguidade até o século 21. Aqui estão documentados dois mil anos de história da farmacêutica, incluindo antigos kits de primeiros socorros e farmácias inteiras de outras épocas, como esta do mosteiro beneditino de Schwarzach de 1742.
Foto: Dt. Apotheken Museum-Stiftung Heidelberg
Museu subterrâneo
O Museu Alemão da Mineração, em Bochum, é uma antiga mina de carvão. Sua rede de túneis de 2,5 km compõe a maior mina de exposição no mundo. Do carvão ao sal, os visitantes podem aprender tudo sobre a história da mineração. Há inclusive uma sala subterrânea onde se realizam casamentos. A subsequente recepção com champanhe é no alto da torre de transporte, com vista para o Vale do Rio Ruhr.
Foto: Deutsches Bergbaumuseum
Museu do "leão"
Museu do fisco também pode ser divertido. No museu fiscal alemão o visitante pode conhecer cinco mil anos de história da cobrança de impostos, da antiga Mesopotâmia até hoje, passando pela Idade Média. Os documentos expostos narram, de forma informativa e divertida, como a legislação fiscal evoluiu, de poder anárquico a leis vinculativas.
Foto: Fotolia/46700946
A morte como tema
Carros funerários, caixões e túmulos da Idade Média podem ser vistos no Museu da Cultura Sepulcral de Kassel. Ali também são explicados rituais alemães de enterro e de luto. Como mostra o caixão em forma de galo, a morte também pode ter seus aspectos engraçados. A pedidos dos visitantes, o museu organiza eventos especiais, de trabalhos científicos sobre o assunto até espetáculos de comédia.
Foto: Museum für Sepulkralkultur Kasse
Pela diversidade sexual
O Museu Gay de Berlim documenta cultura e modos de vida de gays e lésbicas. Para homens que gostam de homens, mulheres que gostam de mulheres e também para aqueles que curtem os dois, o Museu Gay, no bairro Tiergarten, é uma experiência reveladora e especial. O lugar oferece visitas guiadas gratuitas.
Foto: DW/X. Maximova
Museu da Batata
Bem-vindo ao – segundo a diretora do museu, Barbara Kosler – único museu do mundo dedicado à arte com batatas. Oito salas temáticas ilustram o tema: há vasos dos incas em forma de batata, impressões a cores no estilo pop art de Andy Warhol, a importância do tubérculo como alimento dos pobres, e, finalmente, sua transformação em ícone de publicidade.
Foto: Das Kartoffelmuseum
Cerveja em fartura
O que oferece o Museu da Cerveja e da Oktoberfest? Claro, provas da bebida favorita dos alemães! Além de experimentar diferentes tipos de cerveja, o visitante pode se informar sobre sua fabricação: para se ver, há ferramentas e equipamentos históricos, e até manuscritos de uma cervejaria de Munique de 1487. O museu fica num prédio datado de 1340.