Projeto piloto para testar novas tecnologias de vigilância em estação ferroviária tem incomodado berlinenses. Críticos alegam que iniciativa fere o direito ao anonimato e pode ser primeiro passo para monitoramento total.
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Acostumada a deixar minhas digitais ao tirar qualquer tipo de documento no Brasil ou para entrar em determinados prédios, me surpreendi quando, há alguns anos, fui tirar minha carteira de identidade alemã aqui em Berlim. Preenchi os documentos necessários, levei a foto e pronto, nada de sujar os dedos ou escaneá-los.
O registro de digitais por aqui é moderado e, somente nos últimos anos, com as novas tecnologias, tem sido ampliado. Esse processo é aplicado, por exemplo, quando alguém solicita refúgio, mas nem sempre para quem pede visto. Para a carteira de identidade, ele é ainda é opcional.
Isso diz muito sobre como a privacidade é valorizada na Alemanha. No mesmo patamar está a proteção de dados. Tentativas para burlar essa lei, costumam ser rapidamente barradas, como foi o caso da proibição do compartilhamento de informações entre o Facebook e o Whatsapp.
Justamente devido a essa valorização da privacidade, um projeto do Ministério do Interior, da Polícia Federal e da companhia ferroviária, a Deutsche Bahn, está causando polêmica em Berlim.
A partir do terceiro trimestre deste ano, a estação Südkreuz, por onde passam cerca de 100 mil passageiros por dia, ou seja, três vezes menos do que a estação central, receberá um projeto piloto para testar novas tecnologias em vigilância. O local foi escolhido para receber câmeras de reconhecimento facial e experimentar métodos de análise para identificar pessoas com comportamento suspeito e monitorá-las dentro da estação.
Críticos do projeto, entre eles políticos locais e federais, afirmam que tecnologias de reconhecimento facial são problemáticas, pois interferem no direito do cidadão de se mover anonimamente em lugares públicos. Além disso, argumentam que esse pode ser o primeiro passo para o monitoramento total.
O governo alega, porém, que as tecnologias vão auxiliar a esclarecer crimes no futuro, além de ajudar na prevenção de delitos e na identificação de situações perigosas. A previsão é que os testes com as câmeras de reconhecimento facial durem seis meses. A duração dos testes dos métodos de análise não foi divulgada.
Antes de vir morar em Berlim, eu nunca tinha pensado sobre as consequências desse tipo de monitoramento de segurança. Talvez por conhecer a violência urbana de cidades brasileiras, não vejo problema na instalação de câmaras em espaços públicos e na perda de parte do anonimato.
No entanto, consigo muito bem entender os alemães que são contrários ao projeto e temem a vigilância estatal. Afinal, durante muitos anos, uma boa parte do país viveu sob a mira da Stasi, o serviço secreto da antiga Alemanha Oriental, e teve sua vida monitorada dia e noite. A rejeição à vigilância tem como objetivo evitar que isso volte a ocorrer.
Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às segundas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.
Trabant, o "carro do povo" do Leste Alemão
O Trabant nunca foi um objeto de desejo, a fila de espera era de anos e o conforto deixava muito a desejar. O carro símbolo da Alemanha Oriental parou de ser produzido em 30 de abril de 1991.
Foto: imago/Sven Simon
Símbolo de um país
O Trabant era "o" carro da Alemanha Oriental. Fora modelos de outros países comunistas, como os Ladas soviéticos, era o que um alemão-oriental comum podia ter. Entre 1957 e 1991, foram produzidos cerca de 3 milhões deles, todos em Zwickau, onde ficava a única fábrica. Para comprar um, era necessário entrar na fila – e esperar, talvez até uns 17 anos. Depois da Reunificação, o modelo virou cult.
Foto: picture-alliance/dpa/Pisacreta
Monotonia nas cores
As cores do Trabant eram sempre em tons pastéis. Críticos diziam que ele já saía de fábrica com uma cara de quem ficou muito tempo na chuva. Mas a cor não era o mais importante: para seus proprietários, o Trabant significava a possibilidade de um passeio de fim de semana, quando se podia aproveitar para tentar alcançar a velocidade máxima de 100 km/h.
Foto: picture alliance/dpa/J. Woitas
Simplicidade na mecânica
O Trabant P601 foi o segundo e último modelo, e também o mais popular. Era um carro pouco menor que o Twingo e um dos mais simples já produzidos. Com motor de dois tempos, refrigerado a ar, ele não precisava de bomba de óleo, comando de válvulas, radiador ou bomba d'água. O carro era muito poluidor. Não havia marcador de gasolina: o combustível chegava ao carburador pela força da gravidade.
Foto: DW
Acabamento interno
Por dentro, o Trabant, ou "Trabi", era espartano, dispensando qualquer luxo. As cores e os estofados davam um ar meio antiquado ao interior do veículo. O painel era simples, e a favor dele pode-se dizer que pelo menos o motorista não se distraía com um monte de luzes e sinais, e ao menos dedicava toda a atenção ao trânsito. Trabant, em alemão, significa "satélite".
Foto: picture alliance/dpa/D. Karmann
O outro modelo
Ao contrário do que muitos pensam, o Trabant não era o único carro fabricado na Alemanha Oriental: havia também o Wartburg. Mas ele não chegava a ser concorrente, pois era mais caro e luxuoso. O Wartburg era produzido em Eisenach, e boa parte da produção era exportada, principalmente para outros países do bloco comunista, como Hungria e Polônia.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Wolf
Pink power
Trabant pink não existia na Alemanha Oriental – pelo menos não de fábrica. Depois da queda do Muro de Berlim, porém, o modelo ganhou status de cool, principalmente entre jovens, estudantes e aficcionados por automóveis. Muitos dos novos proprietários pintaram seus carros nas cores mais variadas e berrantes.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Schmidt
Trabi do futuro?
Muitos proprietários gostam de mexer nos seus Trabants. Este alemão "envenenou" o seu modelo com um motor moderno e mais potente, para atender às normas de emissões de gases – o que, claro, não se pode esperar do motor original. Além disso, o escapamento do Trabi não tinha filtro.
Foto: picture alliance/dpa/S. Sauer
Favorito dos saudosistas
A simpatia pelo Trabi não tem fronteiras. Nesta foto, um grupo de admiradores se reúne para um encontro em Praga, na República Tcheca. Quando o Muro de Berlim caiu, muitas pessoas disseram que o Trabant desapareceria das ruas da Alemanha em poucos anos. Mais de 25 anos depois, ainda há 32 mil registrados.
Foto: Reuters/David W Cerny
Canteiro de flores
Mas também é verdade que muitos Trabants foram aposentados por seus donos e tiveram destinos pouco nobres. Este, por exemplo, virou canteiro de flores. Entre 2009 e 2010, quando o governo alemão ofereceu um bônus para quem trocasse seu carro antigo por um modelo mais atual (e menos poluente), 1.819 Trabants foram descartados por seus proprietários.
Foto: picture-alliance/ZB/R. Hirschberger
Parte da história
O Trabant está fortemente associado à história alemã recente. Este foi decorado com vários símbolos que remetem a isso: uma bandeira da Alemanha, pedaços do Muro de Berlim, placas da antiga Alemanha Oriental e uma pintura que homenageia a abertura da fronteira, em novembro de 1989.
Foto: picture alliance/dpa/J. Wolf
Imagem clássica
Quando o Muro de Berlim caiu, muitos alemães-orientais atravessaram a fronteira que separava Berlim Oriental da Ocidental dirigindo seus Trabants. Essas imagens correram o mundo, e o Trabant acabou para sempre associado à queda do Muro e à reunificação da Alemanha.