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Brasil sob pressão para reorganizar fluxo migratório

Marina Estarque, de São Paulo5 de junho de 2015

País registrou aumento de 2.131% no número de pedidos de refúgio, se tornando maior porta de entrada na América Latina. ONU e autoridades locais defendem redistribuição, para evitar sobrecarga em estados como SP.

Fila de imigrantes em São Paulo para solicitação de refúgio
Foto: DW/M. Estarque

O governo federal precisa organizar o fluxo migratório no país, ajudando a distribuir refugiados e imigrantes que chegam, em sua maioria, pela fronteira terrestre, no Acre, e pelo aeroporto internacional de Guarulhos, em São Paulo, afirmam a agência da ONU para refugiados (Acnur), além de autoridades municipais e estaduais.

“Faz sentido que eles possam ser distribuídos pelo país, porque os números são muito pequenos para o tamanho do Brasil, mas são grandes para a fronteira do Acre”, disse Andrés Ramirez, representante do Acnur no Brasil, em evento na quarta-feira (03/06), em São Paulo sobre o tema.

Entre 2010 e 2014, o Brasil registrou um aumento de 2.131% no número de pedidos de refúgio, passando de 1.165 para 25.996, segundo o diretor adjunto do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, Paulo Guerra, também presente no evento. Em 2014, o Brasil foi o país da América Latina com o maior número de solicitações de refúgio.

De acordo com o ministério, há hoje no Brasil 7.700 refugiados, de 81 nacionalidades distintas, sendo que 25% são mulheres. Os sírios representam 23% do total, seguidos dos colombianos e angolanos.

Haitianos não são considerados refugiados

Os haitianos não são considerados refugiados. Eles recebem um visto de permanência no Brasil por razões humanitárias.

“O país não estava preparado para esse enorme fluxo migratório. Se a gente pudesse dividir os imigrantes pelos estados da federação, a gente teria uma recepção mais organizada e possibilidades melhores de moradia e trabalho. Falta uma visão estratégica de política pública para migração por parte do Ministério da Justiça”, defendeu o secretário estadual de Desenvolvimento Social de São Paulo, Floriano Pesaro.

O secretário, do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), pediu que o ministério ajude a organizar o fluxo migratório. “Na semana passada chegaram quase 500 imigrantes haitianos do Acre sem nenhuma comunicação”, acrescentou.

Em maio, o governo do Acre enviou quase mil imigrantes a São Paulo, sem avisar a prefeitura ou o governo federal. O fluxo inesperado causou a superlotação da paróquia Nossa Senhora da Paz, no Glicério (centro), referência para os haitianos na cidade.

O Ministério da Justiça havia firmado um convênio com o governo do Acre para permitir o transporte dos imigrantes pelo país – mas o acordo foi suspenso após a nova leva.

SP: 36% dos pedidos de refúgio

Segundo o coordenador de políticas para migrantes do município de São Paulo, Paulo Illes, o último ônibus a chegar à cidade foi uma iniciativa dos próprios estrangeiros.

“Eles se reuniram e pagaram o transporte. Mas a gente pede [ao governo do Acre] que seja avisado mesmo assim”, diz Illes. Ele afirma que a prefeitura planeja instalar um posto de atendimento no terminal rodoviário da Barra Funda, um dos principais locais de chegada de imigrantes na cidade.

Illes também defende que o governo federal faça uma melhor organização do transporte, conforme a demanda dos imigrantes e refugiados, além da oferta de trabalho e moradia. “Tem gente que chega a São Paulo, vindo do Acre, mas quer ir para Fortaleza ou Porto Velho”, diz.

Guerra, do Ministério da Justiça, argumenta que a articulação com os estados e municípios está em andamento. “A redistribuição já está sendo feita, mas eu não posso obrigar um refugiado a ir onde ele não quer ir”, diz.

Illes ressalta que há um foco excessivo na imigração haitiana em São Paulo. “De 2010 para cá, chegaram cerca de 50 mil. Mas, no mesmo período, chegaram mais espanhóis, 60 mil”, aponta.

Em 2014, São Paulo ultrapassou Quito, no Equador, em número de solicitações de refúgio, se tornando a principal porta de entrada da América Latina. Foram 3.612 pedidos no total, mais do que o dobro da soma dos três anos anteriores.

O estado de São Paulo concentra 36% das solicitações de refúgio, seguido de Acre (16%), Rio Grande do Sul (11%) e Paraná (7,5%).

Sírios em São Paulo: Brasil abriga no momento refugiados de 81 nacionalidadesFoto: Marina Estarque

Rota perigosa

Para Illes, o governo federal precisa desencorajar a chegada de imigrantes pelo Acre, uma rota considerada perigosa e com atuação de coiotes.

“A ausência de uma política efetiva pode fazer com que a rota do Acre, que começou com os haitianos, vire uma rota de todas as imigrações. Hoje estão passando por lá dominicanos, senegaleses, malineses e burquinenses”, afirma.

Por isso, o secretário defende uma articulação maior não só entre os estados, municípios e governo federal, mas também entre essas autoridades e os serviços brasileiros prestados no exterior.

“Precisamos flexibilizar a entrega de vistos no Haiti para desmantelar essa ação dos coiotes e estimular uma rota mais segura para os imigrantes”, afirma.

Elogios ao país

Apesar das dificuldades, especialmente no excesso de burocracia e lentidão em fornecer documentos, o Brasil tem dado uma resposta positiva para o aumento da imigração no país, Segundo o Acnur.

“Os países que não têm uma política generosa, de portas abertas, podem aprender com o Brasil, que está oferecendo um bom exemplo”, diz Ramirez. O representante do Acnur lembra que ainda há “muito a melhorar”, mas que o país está tentando se adaptar a “mudanças drásticas” nos fluxos migratórios.

Segundo Illes, o Brasil tem um “discurso de fronteiras abertas”, mas falta contar com mecanismos de regularização do imigrante depois que ele está dentro do país, como ocorre na União Europeia.

“Qual é a porcentagem de imigrantes na Alemanha? Mais de 8%. Nos EUA? Mais de 12%. No Brasil não chega a 0,8%. A realidade não é para pânico”, lembra Illes.

Países em desenvolvimento

Segundo o Acnur, 86% dos refugiados estão nos países em desenvolvimento. “A lógica do refugiado é diferente da do imigrante. Ele não busca melhorar de vida, ele quer se salvar”, explica Ramirez.

Cerca de 53% dos refugiados do mundo são de três países: Síria (3,88 milhões), Afeganistão (2,59 milhões) e Somália (1,9 milhão).

Em 2014, a Turquia se tornou o primeiro país de asilo do mundo, com 1,59 milhão de refugiados – a maioria sírios. Em segundo lugar está o Paquistão, com 1,51 milhão de refugiados, sobretudo afegãos. O Líbano aparece em terceiro, com 1,15 milhão.

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