Após catástrofe de 1986, 115 mil moradores em torno da usina foram evacuados. Apesar de proibições e dificuldades, algumas pessoas voltaram a viver na área atingida. Entre pomar, pesca e religião, não lamentam a decisão.
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30 anos depois, reator de Chernobyl receberá outra cobertura
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No centro de Chernobyl está localizada a administração de toda a zona interditada. A cidade, que contava milhares de habitantes até o desastre de 1986, está hoje abandonada. Devido à contaminação radioativa, foram removidos mais de 115 mil moradores, num raio de 30 quilômetros em torno da usina nuclear.
Casas baixas de tijolos com os telhados tombados e janelas quebradas rangendo ao vento lembram cenas de filme de terror. Embora os seres humanos a tenham abandonado 30 anos atrás, a vida continua na localidade: a vegetação cobre as ruas, e os cães vira-latas que vagam parecem quase lobos.
Decisão por Chernobyl
"A casa é habitada pelo proprietário", diz o cartaz na janela de uma construção intacta. Porém o vizinho Yevhen Markevitch revela que, na verdade, ela está vazia. "Uma vez por mês, os netos do meu antigo vizinho vêm de Kiev para fiscalizar. Fora isso, ninguém mora lá."
O ucraniano de 78 anos, que era professor em Chernobyl, lembra-se bem da catástrofe de 26 de abril de 1986. Ele fazia com seus alunos uma excursão a um sovkhoz, uma fazenda estatal, para plantarem batatas. E nem se preocuparam ao ver fumaça sobre a usina nuclear, pois "lá costumava sempre pegar fogo". Poucos dias depois, começou a evacuação.
A resistente fauna de Chernobyl
Trinta anos de contaminação radioativa não expulsaram os animais que habitam ao redor do antigo reator nuclear que explodiu em 1986. Um fotógrafo bielorrusso documentou a vida na região desabitada por humanos.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Quando os humanos se foram
Trinta anos após o desastre de Chernobyl, na antiga União Soviética, grandes áreas ao longo da usina nuclear, nos territórios que hoje são da Ucrânia e Belarus, ainda estão desertas por medo das consequências de longo prazo de um vazamento nuclear. Em vez de casas e edifícios, reaparecem águias, lobos, veados e outros animais.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Inóspito para humanos
Diferentes tipos de animais foram vistos no local, como esta raposa na foto tirada pelo fotógrafo bielorrusso da agência de notícias Reuters, Vasily Fedosenko, responsável por esta série de imagens. Segundo a agência, a ministra ucraniana do Meio Ambiente, Hanna Vronska, informou que "as pessoas não podem viver lá, é impossível, nem mesmo nos próximos 24 mil anos."
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Evacuados e realocados
O acidente ocorreu em 26 de abril de 1986, quando um experimento fracassado na usina nuclear na localidade de Pripyat levou a uma explosão no reator número 4, que fora construído somente três anos antes do desastre. Uma imensa quantidade de material radioativo foi liberada na atmosfera, espalhando-se para o resto da Europa. Mais de 350 mil pessoas foram evacuadas e realocadas entre 1986 e 2000.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Consequências pouco claras
Os pesquisadores continuam divididos sobre as implicações do desastre na flora e fauna da região, especialmente considerando a contradição entre os efeitos negativos da radiação e as conseqüências positivas da ausência humana. No entanto, parece que não se pode conter a natureza, como demonstra esta manada de bisões perto do vilarejo de Dronki, em Belarus.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Vilarejos abandonados
Reportagem de 2014 transmitida pelo programa "60 minutes", principal noticiário da emissora americana CBS, mostrou as ruínas quase intocadas de Pripyat, cidade abandonada na fronteira entre a Ucrânia e Belarus e que antes abrigava 50 mil pessoas. Aqui se veem restos de edifícios agrícolas perto do vilarejo bielorrusso de Pogonnoe, na declarada faixa de exclusão de 30 quilômetros.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Implicações de longo prazo
Muitas pessoas temem os efeitos de longo prazo para a saúde, provocados por tal ambiente radioativo. Em março, a Prêmio Nobel bielorrussa Svetlana Alexievich disse à DW: "todos os amigos que perdi nos últimos dez anos morreram de câncer. E não passa um dia em que eu não escuto de alguém que adoeceu ou morreu."
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Ninguém é imune
Um lobo olha para a câmera no vilarejo abandonado de Orevichi, em Belarus. Ainda que muitas espécies de plantas, flores e animais continuem a povoar a área em torno do reator nuclear, sabe-se que a taxa de mortalidade entre eles é maior que a média, e que eles sofrem de tumores e outras complicações. O impacto da radiação parece variar por espécie.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Perigo por séculos
"Foi bastante óbvio que padrões de deformação tenham prevalecido muito mais em áreas de alta contaminação", explicou o biólogo Timothy Mousseau à DW, após passar anos coletando insetos, aves e ratos mutantes da região de Chernobyl e Fukushima, no Japão. "Muitas áreas vão permanecer perigosas por séculos, ou até milênios", acrescentou. Aqui, alces são vistos perto de Dronki.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Efeitos em Belarus
Uma águia pousa sobre o telhado de uma escola no vilarejo abandonado de Tulgovichi, a cerca de 370 quilômetros ao sudeste de Minsk. A antiga república soviética de Belarus recebeu por volta de 70% da precipitação radioativa do acidente. Mais de 20% das terras agrícolas do país foram contaminadas.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Números pouco concludentes
Trinta anos depois, números precisos sobre casos de câncer causados pelo desastre de Chernobyl e pela contaminação indireta ainda não são concludentes. A quantidade de mortes atribuídas diretamente à explosão é de 31, mas até agora não há um quadro compreensível ou mesmo um consenso sobre o método usado para contabilizar os impactos na saúde.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
De uma geração a outra
O exame de animais, como este pica-pau visto perto do vilarejo de Babkhin, levou cientistas a acreditar que os efeitos da radiação são passados tanto através da cadeia alimentar quanto de uma geração a outra. Testes em animais provenientes da região de Chernobyl apontaram para um aumento das taxas de tumores, catarata e defeitos neurológicos, como tamanhos menores de cérebro.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
Grande incerteza
Alguns pesquisadores acreditam que várias espécies encontradas hoje ao redor da área de Chernobyl não estavam lá antes do desastre. No entanto, essas suposições não foram confirmadas e, em sua maioria, os cientistas são cautelosos sobre tais declarações.
Foto: Reuters/V. Fedosenko
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Três meses mais tarde, Yevhen voltou pela primeira vez ao local. "Tive saudades", explica. Como a área foi interditada, ele precisaria de uma autorização especial. Mas o acaso o ajudou.
"Simplesmente vim de Kriev até Pripyat de barco. Na margem, dei com policiais, e um deles era um velho amigo. Eu disse que queria ver minha antiga casa. Ele me emprestou uma jaqueta e um chapéu de policial. E assim eu cheguei a Chernobyl, de joelhos tremendo."
Yevhen viu soldados espalhando um líquido nas cercas e telhados e registrando os níveis de radiação nas paredes das casas. Ele só passou uma noite na antiga moradia, antes de deixar a área.
Da segunda vez, contudo, retornou definitivamente. "Consegui emprego na monitoração da radioatividade. Estou disposto a aceitar qualquer trabalho, contanto que seja em Chernobyl", afirma o aposentado. Juntamente com a esposa, ele planta frutas e verduras na própria horta, e cultiva seu hobby, a pesca.
Pendurando peixe para secar numa corda, na varanda da casa, o ancião comenta: "É do nosso rio", apontando, orgulhoso para os dois barcos que ele mesmo construiu. E conclui: "Continuo feliz de ter me decidido assim, na época."
Um povoado, 16 moradores
Ao todo, 180 pessoas moram atualmente na zona interditada: 80 em Chernobyl e os restantes em quatro aldeias vizinhas. Kupovate, a 47 quilômetros da antiga usina, tem 16 habitantes. No pátio de uma casa torta de madeira, à entrada do povoado, o casal Viktor Tchausov e Maria Sapura amontoa lenha. Antes da catástrofe, ela trabalhava como ordenhadora, ele como operário de construções, tendo participado da construção da cidade de Pripyat, destinada aos funcionários da usina nuclear.
Também Maria e Viktor retornaram secretamente ao local após a evacuação. Ninguém mais vive na rua deles. Quase sempre tem eletricidade, mas água é preciso ir buscar no poço. Uma vez por mês, um carteiro traz o dinheiro da aposentadoria; duas ou três vezes vem o carro do quitandeiro, e eles compram pão e cevada perolada. "Não temos filhos, por isso ninguém nos visita. Vamos sobrevivendo como dá", conta Maria.
Viktor vai fazer 80 anos em breve. Acendendo um cigarro, ele relembra a evacuação. "Nós fomos todos reunidos como gado. Primeiro nos colocaram por três meses nos abrigos, depois em casas." "Mas nós só ganhamos um quarto, com cortinas em vez de portas" prossegue Maria. "Só tinha um sofá. E várias famílias ficavam alojadas em uma casa, as pessoas tinham que dormir no chão. Agora a estamos velhos e temos que trabalhar duro. Mas nós temos pepinos, tomates e batatas."
Mais uma Páscoa, 30 anos depois
Na rua do lado, Maria Prokopivna habita uma casinha rodeada por um pomar. Num canto da sala ela arruma o ícone, decorado com lenços. "Eu era jovem quando os bordei", revela, um pouco envergonhada. Ao recordar a evacuação, ela desata a chorar.
"Levaram a gente embora, disseram que era por três dias. Estávamos nos preparando para a Páscoa. Nem sei descrever o que passamos." Também para ela as autoridades designaram uma casa no município vizinho, onde várias famílias deviam morar juntas. Diante disso, ela fez as malas e retornou ao seu povoado. "Eu construí esta casa com as minhas próprias mãos", conta.
Os dois filhos e vários netos de Maria vêm visitá-la nos fins de semana. Os 30 anos passaram depressa, ela se acostumou a tudo e diz não estar mal. "Não dou conta de comer tudo o que eu tenho", brinca, apontando para um armário repleto de conservas de tomate, pepino, maçã, batata e cebola.
"É claro que eu escutei que era proibido cultivar qualquer coisa depois do acidente nuclear. Mas fizeram as medições da radioatividade, e me disseram que estava tudo dentro dos limites permitidos."
Maria Prokopivna está ansiosa pela Páscoa ortodoxa, que em 2016 cai no dia 1º de maio. Com a irmã, que vive na mesma aldeia, ela pretende ir à igreja em Chernobyl para a bênção dos alimentos pascais, como manda a tradição.
Biodiversidade em Chernobyl
Invisível, porém perigosa. A radiação liberada pelo acidente nuclear de Chernobyl destruiu a vida nos arredores da usina nuclear ucraniana. Passados 29 anos da catástrofe, como está o ecossistema do local?
Foto: Masaki Iwata and Joji Otaki, University of the Ryukyus
O ecossistema mais contaminado do mundo
As pessoas que moravam no entorno da usina nuclear de Chernobyl tiveram que abandonar suas casas após a catástrofe, em abril de 1986. Na época, uma zona de exclusão foi estabelecida num raio de 30 quilômetros. Ainda hoje são usados contadores Geiger para medir o nível de radiação nuclear. Mesmo sendo considerado o ecossistemas mais contaminado do mundo, ainda existe vida no local.
Foto: Viktor Drachev/AFP/Getty Images
Um vilarejo sem moradores
Antes da catástrofe, cerca de 2 mil pessoas viviam em Tulgovichi, uma vila localizada dentro da zona de exclusão. Hoje, o local tem menos de dez moradores.
Foto: Viktor Drachev/AFP/Getty Images
Existe vida na zona de exclusão?
Em 2011, bisões foram fotografados na antiga zona de exclusão, mas não se sabe se há apenas alguns animais ou uma vida realmente próspera no local. Opiniões de cientistas divergem. Alguns dizem que, nas áreas com alto nível de radiação nuclear, o número de aranhas e insetos é menor – principalmente num raio de dez quilômetros ao redor do reator central.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Zenkovich
Mais pesquisas são necessárias
Em excursões próprias à zona de exclusão, outros cientistas constataram que a quantidade de animais existentes é a mesma que a de habitats semelhantes fora dessa área, independentemente do nível de radiação. Até hoje não há nenhum estudo comparativo que esclareça essa questão.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Zenkovich
Os efeitos da radiação
Há muito tempo se sabe que a radioatividade muda o DNA do homem. Por isso, não é surpreendente que, depois do acidente com o reator, animais frequentemente apresentem tumores ou partes do corpo deformadas. No entanto, de acordo com estudos, algumas aves se adaptaram à radioatividade ao produzirem mais antioxidantes, que as protegem dos danos genéticos.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Pleul
Radiação afeta o comportamento?
Cientistas pesquisam também se a radiação afeta o comportamento dos animais. Sob a influência de cafeína ou outras drogas, as aranhas perdem a capacidade de tecer teias com perfeição geométrica. Timothy Mousseau, da Universidade da Carolina do Sul, fotografou teias de aranhas na zona de exclusão para analisar se a radioatividade teve um efeito semelhante.
Foto: picture-alliance/dpa/K.-J. Hildenbrand
Cavar a fundo
Nem todos os efeitos da radioatividade sobre os seres vivos que estão na zona de exclusão são facilmente visíveis. Para analisá-los, cientistas tiveram que cavar a fundo. Eles pesquisaram a distribuição dos organismos vivos no solo e descobriram que a presença de minhocas, centopeias e ácaros-escaravelhos é o primeiro sinal da recuperação de um ecossistema após um acidente nuclear.
Foto: Colourbox/I. Zhuravlov
Borboletas de Fukushima
Soa quase cínico, mas o desastre nuclear de Fukushima, no Japão, abriu um novo "laboratório" para os cientistas analisarem os efeitos da radioatividade sobre a biodiversidade. Pesquisadores japoneses descobriram que mutações no genoma de borboletas da espécie Pale Grass Blue (Pseudozizeeria maha) deformaram o corpo e as asas dos insetos.
Foto: Masaki Iwata and Joji Otaki, University of the Ryukyus