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Chernobyl: vida na zona interditada

Anastasia Magazova (av)26 de abril de 2016

Após catástrofe de 1986, 115 mil moradores em torno da usina foram evacuados. Apesar de proibições e dificuldades, algumas pessoas voltaram a viver na área atingida. Entre pomar, pesca e religião, não lamentam a decisão.

Chernobyl: casal Viktor Tchausov e Maria Sapura
Casal Viktor Tchausov e Maria Sapura são dois dos 16 habitantes do povoado de KupovateFoto: Anton Skyba

30 anos depois, reator de Chernobyl receberá outra cobertura

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No centro de Chernobyl está localizada a administração de toda a zona interditada. A cidade, que contava milhares de habitantes até o desastre de 1986, está hoje abandonada. Devido à contaminação radioativa, foram removidos mais de 115 mil moradores, num raio de 30 quilômetros em torno da usina nuclear.

Casas baixas de tijolos com os telhados tombados e janelas quebradas rangendo ao vento lembram cenas de filme de terror. Embora os seres humanos a tenham abandonado 30 anos atrás, a vida continua na localidade: a vegetação cobre as ruas, e os cães vira-latas que vagam parecem quase lobos.

Decisão por Chernobyl

"A casa é habitada pelo proprietário", diz o cartaz na janela de uma construção intacta. Porém o vizinho Yevhen Markevitch revela que, na verdade, ela está vazia. "Uma vez por mês, os netos do meu antigo vizinho vêm de Kiev para fiscalizar. Fora isso, ninguém mora lá."

O ucraniano de 78 anos, que era professor em Chernobyl, lembra-se bem da catástrofe de 26 de abril de 1986. Ele fazia com seus alunos uma excursão a um sovkhoz, uma fazenda estatal, para plantarem batatas. E nem se preocuparam ao ver fumaça sobre a usina nuclear, pois "lá costumava sempre pegar fogo". Poucos dias depois, começou a evacuação.

Três meses mais tarde, Yevhen voltou pela primeira vez ao local. "Tive saudades", explica. Como a área foi interditada, ele precisaria de uma autorização especial. Mas o acaso o ajudou.

"Simplesmente vim de Kriev até Pripyat de barco. Na margem, dei com policiais, e um deles era um velho amigo. Eu disse que queria ver minha antiga casa. Ele me emprestou uma jaqueta e um chapéu de policial. E assim eu cheguei a Chernobyl, de joelhos tremendo."

Yevhen viu soldados espalhando um líquido nas cercas e telhados e registrando os níveis de radiação nas paredes das casas. Ele só passou uma noite na antiga moradia, antes de deixar a área.

Da segunda vez, contudo, retornou definitivamente. "Consegui emprego na monitoração da radioatividade. Estou disposto a aceitar qualquer trabalho, contanto que seja em Chernobyl", afirma o aposentado. Juntamente com a esposa, ele planta frutas e verduras na própria horta, e cultiva seu hobby, a pesca.

Pendurando peixe para secar numa corda, na varanda da casa, o ancião comenta: "É do nosso rio", apontando, orgulhoso para os dois barcos que ele mesmo construiu. E conclui: "Continuo feliz de ter me decidido assim, na época."

Yevhen Markevitch não resistiu a voltar a seu povoado após catástrofeFoto: Anton Skyba

Um povoado, 16 moradores

Ao todo, 180 pessoas moram atualmente na zona interditada: 80 em Chernobyl e os restantes em quatro aldeias vizinhas. Kupovate, a 47 quilômetros da antiga usina, tem 16 habitantes. No pátio de uma casa torta de madeira, à entrada do povoado, o casal Viktor Tchausov e Maria Sapura amontoa lenha. Antes da catástrofe, ela trabalhava como ordenhadora, ele como operário de construções, tendo participado da construção da cidade de Pripyat, destinada aos funcionários da usina nuclear.

Também Maria e Viktor retornaram secretamente ao local após a evacuação. Ninguém mais vive na rua deles. Quase sempre tem eletricidade, mas água é preciso ir buscar no poço. Uma vez por mês, um carteiro traz o dinheiro da aposentadoria; duas ou três vezes vem o carro do quitandeiro, e eles compram pão e cevada perolada. "Não temos filhos, por isso ninguém nos visita. Vamos sobrevivendo como dá", conta Maria.

Viktor vai fazer 80 anos em breve. Acendendo um cigarro, ele relembra a evacuação. "Nós fomos todos reunidos como gado. Primeiro nos colocaram por três meses nos abrigos, depois em casas." "Mas nós só ganhamos um quarto, com cortinas em vez de portas" prossegue Maria. "Só tinha um sofá. E várias famílias ficavam alojadas em uma casa, as pessoas tinham que dormir no chão. Agora a estamos velhos e temos que trabalhar duro. Mas nós temos pepinos, tomates e batatas."

Maria Prokopivna se emociona ao lembrar a Páscoa de 1986Foto: Anton Skyba

Mais uma Páscoa, 30 anos depois

Na rua do lado, Maria Prokopivna habita uma casinha rodeada por um pomar. Num canto da sala ela arruma o ícone, decorado com lenços. "Eu era jovem quando os bordei", revela, um pouco envergonhada. Ao recordar a evacuação, ela desata a chorar.

"Levaram a gente embora, disseram que era por três dias. Estávamos nos preparando para a Páscoa. Nem sei descrever o que passamos." Também para ela as autoridades designaram uma casa no município vizinho, onde várias famílias deviam morar juntas. Diante disso, ela fez as malas e retornou ao seu povoado. "Eu construí esta casa com as minhas próprias mãos", conta.

Os dois filhos e vários netos de Maria vêm visitá-la nos fins de semana. Os 30 anos passaram depressa, ela se acostumou a tudo e diz não estar mal. "Não dou conta de comer tudo o que eu tenho", brinca, apontando para um armário repleto de conservas de tomate, pepino, maçã, batata e cebola.

"É claro que eu escutei que era proibido cultivar qualquer coisa depois do acidente nuclear. Mas fizeram as medições da radioatividade, e me disseram que estava tudo dentro dos limites permitidos."

Maria Prokopivna está ansiosa pela Páscoa ortodoxa, que em 2016 cai no dia 1º de maio. Com a irmã, que vive na mesma aldeia, ela pretende ir à igreja em Chernobyl para a bênção dos alimentos pascais, como manda a tradição.

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